São Paulo, sábado, 15 de outubro de 2005 |
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ÁFRICA Inimigos da guerra civil no país, hoje conciliados, discutem se imagem de arma deve permanecer em símbolo nacional Debate sobre bandeira inflama Moçambique
MICHAEL WINES
Mas Manuel Tomé, o presidente nacional da Frelimo, diz que a população gosta da bandeira e do emblema do jeito como estão e que a exigência de reformulações feita pela Renamo não passa de tentativa do partido de mostrar sua força. A Frelimo já concordou com a Renamo em trocar o hino nacional moçambicano, que começava com o brado de "Viva a Frelimo!" e prometia que "nosso país será o túmulo do capitalismo e da exploração", por um hino otimista que fala de montes, rios e "flores brotando do chão do teu suor". Para Tomé, mudar mais um símbolo nacional em nome da boa convivência política é algo que não se justifica. "Não quero esvaziar essa discussão de maneira antecipada, mas essa bandeira nacional representa nossa unidade nacional", disse o presidente da Frelimo em entrevista concedida em Maputo. "Foi com base nesta bandeira que unimos a população contra o colonialismo." Não há dúvida de que a bandeira representa a identidade da Frelimo. Ela data de 1962, justamente o ano em que a Frelimo foi criada por exilados moçambicanos que se opunham ao domínio dos portugueses. Os exilados adotaram uma bandeira em grande parte idêntica à atual, formada por faixas horizontais verde, negra, amarela e branca, com um triângulo vermelho que avança desde o lado esquerdo. Em 1983, quando Moçambique se tornou um Estado unipartidário sob a égide da Frelimo, o governo acrescentou à bandeira uma versão simplificada do emblema nacional, uma estrela única atrás de uma enxada, um Kalashnikov e um livro aberto. O emblema nacional também possui um sol, uma coroa feita de espigas de arroz e uma espiga de milho. Os críticos da bandeira e do emblema não têm queixas contra o livro, as faixas, o milho ou a enxada. Mas, para os partidários da Renamo -que, em seu passado contra-revolucionário, foram reacionários intransigentes-, o fuzil e a estrela constituem lembretes dolorosos da época em que a Frelimo era um partido de revolucionários marxistas. A AK-47 é um pomo de discórdia especialmente intragável. "Um país pacífico não deve ter uma bandeira que ostenta uma arma", disse Manteigas, o deputado da Renamo. "Para as crianças que estão crescendo hoje, em tempos de paz, não faz sentido uma bandeira com uma arma." Quanto à estrela, disse ele, qualquer pessoa que já viu a bandeira soviética saberá que a estrela é símbolo do comunismo. E é verdade que a estrela amarela da bandeira moçambicana parece saída de uma bandeira anterior da Frelimo com um martelo e uma enxada atravessados sob uma estrela amarela -uma imagem que é parenta consanguínea do velho martelo e foice soviéticos. Os defensores da Frelimo consideram as críticas exageradas. O Kalashnikov, dizem eles, simboliza a determinação do povo moçambicano de defender sua terra, e o fato de ser símbolo russo é mera coincidência. A estrela apenas significa solidariedade com os africanos. A faixa horizontal negra também seria símbolo da África. Para Joaquim Chissano, presidente de Moçambique por 19 anos, se a estrela única moçambicana fosse símbolo do comunismo, então a bandeira norte-americana, com suas múltiplas estrelas, situaria os EUA entre os países mais esquerdistas do mundo. Divisão É válido perguntar por que um povo que conseguiu encerrar uma guerra civil que matou 1 milhão de civis está encontrando tanta dificuldade em chegar a um acordo em torno de imagens costuradas num pedaço de pano. Uma resposta pode ser que a população moçambicana é evidentemente dividida em vários outros quesitos. A rádio estatal faz transmissões em 21 línguas; as fronteiras nacionais, desenhadas pelo ocupante colonial, ignoram as fronteiras étnicas. É possível que a maior força unificadora de Moçambique tenha sido o desejo de expulsar os senhores coloniais portugueses e a língua portuguesa que eles deixaram no país. Qual dos lados está com a razão? Talvez isso não importe. Qualquer mudança na bandeira e no emblema terá que ser aprovada por dois terços da Assembléia da República, composta de 250 membros. E a Renamo, que tem apenas 90 deputados, controla pouco mais de um terço dela. O escritor Tomas Mário, de Maputo, comentou: "Se a questão for a voto, é evidente que a Frelimo vai impor uma derrota avassaladora à Renamo e que os símbolos vão continuar como estão. Mas, em nome da democracia, a Frelimo está propondo a votação". Tradução de Clara Allain Texto Anterior: Frase Próximo Texto: Indústria cultural: EUA se isolam em discussão da Unesco sobre cultura Índice |
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