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São Paulo, sábado, 15 de novembro de 2003

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VENEZUELA

Às vésperas de ação da oposição por referendo sobre seu mandato, presidente lança missões consideradas demagógicas

Chávez lança Missão Cristo contra pobreza

Javier Galeano -7.nov.2003/Associated Press
O presidente Hugo Chávez durante um comício na semana passada em Caracas no qual denunciou suposto plano para derrubá-lo


FABIANO MAISONNAVE
DA REDAÇÃO

A duas semanas de enfrentar mais um embate com a oposição e em ritmo de campanha eleitoral, o presidente da Venezuela, Hugo Chávez, lançou anteontem a "Missão Cristo", com o ambicioso objetivo de combater a pobreza e retomar o crescimento econômico a partir do ano que vem.
"Ocorreu-me uma nova missão, uma missão para a qual vou convocar o país desde hoje mesmo e que se chama Missão Cristo", disse Chávez, durante um encontro com empresários em Lagunillas, no noroeste do país.
"Será a maior de todas as missões do governo e mobilizará todos os cristãos ou não para acabar com a fome e a pobreza na Venezuela", disse Chávez, que chamou o plano de "Cristo" porque "ele foi um menino pobre, que nasceu pobre e deu tudo para acabar com a pobreza no mundo".
"Hoje de manhã, estava olhando Cristo, porque a cada dia sou mais cristão, amo mais Cristo, leio mais Cristo e me dou conta do revolucionário que ele foi", disse.
A proposta foi uma das várias "missões" sociais anunciadas por Chávez nos últimos meses, período em que o tema principal do conturbado cenário político venezuelano é a tentativa da oposição de convocar um referendo para decidir se ele deve ou não deixar o poder antes do fim de seu mandato, em 2007.
Entre os dias 28 de novembro e 1º de dezembro, a oposição tentará recolher os 2,4 milhões de assinaturas (20% do eleitorado) necessários para realizar o referendo, de acordo com a Constituição. Pesquisas de opinião têm mostrado que a oposição deve conseguir o número exigido, mas Chávez diz que elas são manipuladas.
A campanha da oposição será precedida por uma ação semelhante por partidários do governo, que recolherão assinaturas entre os dias 21 e 24 deste mês para realizar referendos contra 40 deputados da oposição.
Numa tentativa de diminuir a tensão -crescente nos últimos dias- entre Chávez e a oposição, as coletas terão a OEA (Organização dos Estados Americanos) e o Centro Carter (dos EUA) como observadores internacionais.
Em abril do ano passado, a oposição promoveu um golpe de Estado, que afastou Chávez por dois dias. Entre dezembro de 2002 e fevereiro deste ano, a oposição organizou uma greve geral, que praticamente paralisou a economia do país. Os confrontos já deixaram dezenas de mortos.

Missões
Uma das iniciativas é a "Missão Robinson", projeto de alfabetização de adultos que conta com a ajuda de Cuba e promete ensinar 1 milhão de venezuelanos a ler e a escrever em três meses. O nome veio de Samuel Robinson, professor de Simón Bolívar (1783-1830), líder independentista sul-americano que divide com Cristo a admiração de Chávez.
Já a "Missão Sucre" promete dar 100 mil bolsas de estudo de US$ 100 por mês para estudantes indígenas e pobres.
No final de outubro, Chávez anunciou um aumento dos salários e benefícios de funcionários públicos, apesar da recessão econômica (leia texto nesta página).
Para o analista político Saúl Cabrera, do instituto de pesquisas Consultores 21, as "missões de Chávez" não são programas de governo, mas promessas de campanha. "Elas fazem parte de de sua estratégia política para as coletas de assinatura".
Cabrera afirma que o anúncio da Missão Cristo, assim como de outras missões ligadas à saúde e à educação, não veio acompanhada de um plano de trabalho.
"Os conceitos são interessantes, mas têm sido desenvolvidos de maneira demagógica", disse. "Em tese, são missões às quais não se pode opor. Quem é contra colocar mais alunos na faculdade?"
Cabrera acredita que, apesar dos esforços de Chávez, a oposição conseguirá reunir as assinaturas para o referendo, que seria realizado entre o final de março e o início de abril de 2004.
A Folha contatou ontem a assessoria de imprensa de Chávez, mas não obteve resposta. No site da agência de notícias do governo, não havia menção à chamada Missão Cristo.


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