São Paulo, sábado, 15 de dezembro de 2007

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Presidente do México encerra o ano em alta

Combate ao narcotráfico e fraqueza da esquerda dão popularidade a Calderón

Conservador aprovou reformas importantes no início de mandato, mas deve enfrentar desgaste político e economia descendente

ADAM THOMSON
DO "FINANCIAL TIMES"

Pouco mais de um ano atrás, o assunto de conversa mais popular entre os tagarelas do México não era o desempenho que Felipe Calderón, então recém-eleito presidente do país, poderia apresentar, mas quanto tempo ele duraria no cargo. A esquerda, liderada pelo carismático Andrés Manuel López Obrador, derrotado nas eleições por Calderón, insistia em que a vitória eleitoral conquistada por ele em julho era fruto de fraudes. Em uma grande manifestação no Zócalo, a praça principal da capital mexicana, López Obrador se proclamou "legítimo presidente" do México diante de centenas de milhares de partidários e prometeu que tornaria impossível a vida de seu adversário. Hoje, a maioria dessas ameaças se dissipou. López Obrador praticamente desapareceu do cenário político, os índices de popularidade de Calderón atingiram a mais que respeitável marca dos 60% e seu governo conseguiu aprovar três reformas significativas em 12 meses -consideravelmente mais do que o governo anterior, de Vicente Fox, havia conseguido em seis anos. "Calderón foi muito além das expectativas", admite Rogelio Ramirez de la O, economista cotado para o Ministério das Finanças caso López Obrador tivesse vencido.

Segredo do sucesso
Boa parte desse sucesso se baseia na decisão de Calderón de declarar guerra contra o crime organizado, ainda em sua primeira semana de mandato. Nos últimos anos, em parte como resultado do fechamento pelos EUA de rotas de tráfico via Caribe, o México se transformou em importante ponto de trânsito para a cocaína e outros narcóticos. Mas o comércio de drogas fez crescer a violência, devido às disputas entre os diversos cartéis pelo controle do negócio. Como declarou Calderón recentemente, "a maior ameaça ao futuro do país são a insegurança e o crime organizado". Diante desse cenário, sua decisão de enviar milhares de policiais e soldados para retomar territórios controlados pelos cartéis foi recebida positivamente pela população mexicana, que se sentia vulnerável e sob ataque. O outro elemento que ajudou Calderón a consolidar o poder em seu primeiro ano como presidente foi a incapacidade da esquerda para explorar o forte desempenho eleitoral que obteve no ano passado. Embora o Partido da Revolução Democrática (PRD), de López Obrador, seja hoje a segunda maior força no Congresso mexicano, terminou quase excluído das deliberações pelo Partido de Ação Nacional (PAN), de Calderón, e pelo Partido Revolucionário Institucional (PRI), a terceira maior força no Legislativo. Quanto a López Obrador, uma viagem exaustiva por diversas cidades do país mal atraiu cobertura da mídia e serviu apenas para isolar o candidato derrotado do cenário político, tornando-o "um exilado na selva", diz Alejandro Hope, analista da GEA, uma consultoria da Cidade do México. De fato, alguns analistas políticos consideram que os sucessos de Calderón foram tão grandes em seus 12 primeiros meses de mandato que até mesmo suas derrotas terminaram transformadas em vitórias. Nas eleições para o governo do Estado de Tabasco, no sul do país, a vitória do PRI sobre o PAN gerou boa vontade suficiente entre os líderes e a base do partido para que decidissem apoiar no Congresso a reforma tributária de Calderón. "Sem aquela vitória, é difícil imaginar que a reforma tributária pudesse ter sobrevivido na forma como sobreviveu", diz Jorge Zepeda, analista político na Cidade do México.

Dificuldades à frente
A despeito do inesperado sucesso de Calderón, Hope e outros acreditam que os próximos 12 meses possam apresentar resultado diferente. Um motivo, argumenta Hope, é o simples desgaste político. A dificuldade de obter resultados positivos claros na guerra contra as drogas, combinada à dificuldade de sustentar níveis elevados de popularidade que qualquer político no poder precisa enfrentar, já começa a se refletir nas pesquisas. De acordo com a GEA, a popularidade de Calderón caiu de 69% em junho para 60% hoje. "Os números continuam bons, mas a tendência de queda é clara", diz Hope. Dan Lund, analista político na Cidade do México, vai além. Ele argumenta que, além da guerra contra as drogas, falta a Calderón uma agenda política definida, para além de seu esforço de ampliar a base de poder de seu partido nas eleições legislativas de 2009. Enquanto isso, o crescimento econômico vem decepcionando e os impedimentos a medidas de estímulo a esse crescimento, exemplificados pela ação dos poderosos monopólios empresariais mexicanos, continuam firmes. "Calderón evitou tomar decisões difíceis sobre a transformação do México", diz Lund. O segundo motivo para que o próximo ano de mandato se prove mais difícil é que Calderón certamente terá de enfrentar a delicada questão da reforma energética, sobre a qual existe ainda menos consenso político do que sobre as reformas aprovadas neste ano. As receitas petroleiras ganharam importância nos últimos anos e hoje respondem por quase 40% da arrecadação total do governo. Mas a produção está caindo devido ao baixo investimento da estatal petroleira Pemex em prospecção e devido a uma proibição constitucional a contratos de associação entre a estatal e empresas privadas. Não é segredo que Calderón gostaria de dar mais flexibilidade à Pemex para envolver empresas privadas no processo de prospecção com riscos compartilhados, mas ele precisaria do apoio do PRI para fazê-lo. No entanto o PRI obteve uma série de vitórias eleitorais no ano, e isso tornou o partido mais confiante e elevou o preço que pede pela cooperação com as reformas estruturais. O resultado geral quase certamente será um ano difícil para Calderón e sua equipe. Como define Hope: "A lua-de-mel definitivamente acabou".


Tradução de PAULO MIGLIACCI


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