São Paulo, terça-feira, 16 de janeiro de 2007

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Correa assume e anuncia renegociação da dívida

Presidente convoca referendo sobre Constituinte para 18 de março e reduz seu salário

Decreto sobre a consulta popular é assinado em ato com presença de Chávez e Morales, diante de multidão que grita "fora, deputados"

FABIANO MAISONNAVE
ENVIADO ESPECIAL A QUITO

O economista de esquerda Rafael Correa, 43, assumiu ontem a Presidência do Equador enfatizando as suas duas principais promessas de campanha, a renegociação da dívida externa e a assinatura de um decreto convocando um referendo para decidir sobre a eleição de uma Assembléia Constituinte.
"O Equador é um dos cinco países latino-americanos com menos investimento social por habitante. É necessário reverter essa situação, e para isso é preciso liberar recursos de outras áreas e basicamente do peso insuportável da dívida externa", disse Correa, em discurso no Congresso. "Por isso, faremos uma renegociação soberana e firme da dívida externa equatoriana."
O novo presidente equatoriano propôs "uma ação coordenada dos países devedores para redefinir o critério de sustentabilidade do serviço da dívida, determinar a dívida externa ilegítima e promover a criação de um Tribunal Internacional de Arbitragem da Dívida", encarregado de determinar a proporção da dívida considerada ileg valor da suposta dívida ilegal.
Correa também classificou como "corrupta" a chamada Lei de Transparência Fiscal, que limita os gastos públicos, e a autonomia do Banco Central.
"Por acaso não é corrupção a existência de leis absurdas como a Lei de Transparência Fiscal, que limita todos os gastos menos o serviço da dívida? Por acaso não é corrupção a existência de bancos centrais completamente autônomos, que não respondem a controles democráticos, mas a burocracias internacionais?", discursou.
De acordo com o Banco Central equatoriano, a dívida externa pública do país chegava em novembro a US$ 10,3 bilhões, o equivalente a 25,3% do Produto Interno Bruto (PIB).

Constituinte
No final da tarde, Correa assinou um decreto convocando um referendo no dia 18 de março para decidir sobre a realização de uma Constituinte "com plenos poderes" para substituir a atual Carta, promulgada há apenas nove anos, em 1998.
O evento foi realizado diante de milhares de simpatizantes no monumento que marca a linha do Equador, a cerca de 20 km de Quito. Correa estava acompanhado de seu gabinete e dos presidentes da Bolívia, Evo Morales, e da Venezuela, Hugo Chávez.
Anteontem, Chávez e Morales foram os únicos presidentes a participar da "posse indígena", realizada numa comunidade quíchua. Chávez convocou um referendo para a Constituinte logo depois de eleito, em 1998, e na Bolívia de Morales uma Assembléia do mesmo tipo tenta "refundar" o país com uma nova Carta.
Refletindo as críticas ao Congresso que marcaram a campanha de Correa, o público vaiou um trecho do decreto que prevê que o texto será enviado ao Parlamento "para o seu conhecimento".
"Fora, deputados", "fora, deputados", gritou o público, forçando o mestre de cerimônias a interromper momentaneamente a leitura do decreto. O partido de Correa, Alianza Pais, não tem deputados porque decidiu não lançar candidatos em protesto contra a "partidocracia tradicional".
No mesmo evento, Correa também emitiu um decreto rebaixando o seu salário.
O mandato de Correa é de quatro anos, sem direito à reeleição. O Equador atravessa dez anos de instabilidade política: nenhum dos últimos três presidentes eleitos conseguiu terminar o mandato, afastados pelo Congresso após protestos.
Correa usou duras palavras contra o Congresso em plena sede recém-reformada do Parlamento equatoriano. "O Congresso Nacional, supostamente a máxima expressão da democracia representativa, não é percebido pela cidadania como seu representante. Pelo contrário, sua perda de credibilidade reflete o desencanto de milhões de homens e mulheres que anseiam por mudanças", disse o esquerdista.
O presidente disse que seu governo terá cinco eixos: "revolução constitucional", "luta contra a corrupção", "revolução econômica", "revolução em educação e saúde" e "resgate da dignidade, soberania e busca da integração latino-americana".
Praticamente todos os presidentes da região presenciaram a posse, com exceção de Néstor Kirchner (Argentina) e Tabaré Vázquez (Uruguai).


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