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Prestígio universal permite a Brasil ser mediador, diz premiê palestino
Em entrevista à Folha, Fayad afirma que "Estado palestino está pronto" e que esse fato em breve vai ficar óbvio para o mundo a despeito de paz com Israel
MARCELO NINIO
ENVIADO ESPECIAL A RAMALLAH
O premiê palestino, Salam
Fayad, está à frente de uma revolução silenciosa. Nos três
anos desde que assumiu o cargo, Fayad, 58, tem sido o motor
de uma lenta mas persistente
transformação da imagem da
Autoridade Nacional Palestina
(ANP). De entidade corrupta e
ineficiente para embrião institucional de um país.
Economista internacionalmente respeitado, com passagens pelo Banco Mundial e
FMI (Fundo Monetário Internacional), Fayad nunca portou
uma pistola. Suas armas são a
eficiência, a responsabilidade e
a transparência.
Em entrevista exclusiva à
Folha, Fayad, que hoje se reunirá com o presidente Luiz
Inácio Lula da Silva, em Belém,
explicou porque ainda crê em
seu plano de estabelecer um
Estado palestino até 2011.
FOLHA - Diante de tantos percalços, ainda é possível um Estado palestino em 2011?
SALAM FAYAD
- Sim, é possível.
Estamos construindo nossas
instituições e seguindo padrões
internacionais de gestão financeira que muitos países não
têm. Mas para isso precisamos
de um processo político capaz
de terminar a ocupação. Esse
processo não começou agora,
mas nos anos 90. Deveria terminar em maio de 1999. Os temas já foram extensamente negociados. O que é considerado
um desfecho aceitável para as
negociações é mais que conhecido a esta altura. Mas a comunidade internacional precisa se
esforçar muito mais para colocar fim à ocupação israelense.
FOLHA - Falta mais esforço dos Estados Unidos?
FAYAD
- Não há dúvida de que
para que esse processo seja
bem-sucedido, os EUA terão de
ter um papel dominante, por
todo o longo envolvimento do
país na região. Mas isso não significa que bastam os EUA. Nos
últimos anos houve uma ampliação da mediação, com o envolvimento do Quarteto (EUA,
União Europeia, Rússia e
ONU). Foi criada uma sensação
de parceria internacional, o que
é um avanço. Mas essas não são
as únicas potências mundiais
que têm interesse em paz no
Oriente Médio. O equilíbrio de
poder mundial mudou e continua mudando. O Japão, por
exemplo, é uma grande potência e não faz parte do Quarteto.
China, Índia e Brasil tampouco.
Quem discute o peso político e
econômico do Brasil no mundo
hoje?
FOLHA - Que tipo de papel o Brasil
pode ter nesse processo?
FAYAD
- O Brasil goza de prestígio universal e afeição imediata. É um atributo único, que pode ser extremamente importante numa negociação. Tenho
imenso respeito pelo que o presidente Lula fez em seu país. A
ampliação do processo de mediação é necessária para refletir
a nova ordem mundial, e o peso
do Brasil não pode ser ignorado. É claro que não falo de uma
mediação conduzida somente
pelo Brasil, porque aí estaríamos voltando às mesmas limitações de um processo só com
os EUA. Mas numa negociação
multilateral a participação do
Brasil seria de grande ajuda.
FOLHA - Digamos que houvesse
uma guinada dramática e o acordo
de paz com Israel fosse assinado
amanhã. O Estado palestino estaria
pronto?
FAYAD
- O Estado palestino está pronto. E esse fato vai ficar
tão óbvio para o mundo que em
breve será impossível negá-lo.
Nossa ideia é criar uma massa
crítica de mudanças positivas
que tornará fácil convencer a
comunidade de nações que os
palestinos têm, de fato, algo
que parece um Estado em funcionamento. Se a ocupação não
terminar até lá, nossa convicção é que haverá tanta pressão
para que o processo político
produza esse resultado que ele
acontecerá. Nossa independência será um dia que toda a
humanidade celebrará, e a comunidade de nações estará
com os palestinos.
FOLHA - Alegações de corrupção
sempre marcaram a administração
palestina. É um obstáculo?
FAYAD
- Pela primeira vez os
doadores começaram a transferir dinheiro diretamente para
nós, o que indica a confiança
que eles têm em nosso sistema.
Não é segredo que rumores de
corrupção e desvios acompanham a Autoridade Nacional
Palestina. A realidade é que
houve uma significativa evolução na forma de administração
da ANP e na construção de instituições. O Ministério das Finanças funciona muito bem,
seguindo os mais altos padrões
internacionais. O fato de sermos capazes de publicar com
absoluta regularidade todo dia
15 do mês um relatório financeiro sobre o mês anterior mostra não só nossa abertura, mas
também a capacidade administrativa de tornar possível essa
transparência. O problema é
que a percepção de corrupção
pode ser tão ruim como a própria corrupção. Estamos tentando mudar isso sendo agressivamente abertos.
FOLHA - O sr. acredita no premiê israelense quando ele diz apoiar o estabelecimento do Estado palestino?
FAYAD
- A questão é de que país
ele está falando. Se for país formado por restos, em que Israel
mantém o controle, não aceitaremos. Queremos um Estado
que emerja em todos os territórios ocupados por Israel em
1967. E sim, com Jerusalém
Oriental como capital.
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