UOL


São Paulo, quarta-feira, 16 de abril de 2003

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Teoria da conspiração "explica" derrota

Que Saddam Hussein está escondido na Embaixada da Rússia em Bagdá, ou na casa de parentes em Tikrit, ou fugiu para a Síria no porta-malas de um carro, ou continua andando incógnito a bordo de um táxi velho pelas ruas da capital iraquiana são boatos velhos, repetidos com pequenas diferenças diariamente pelas ruas daqui.
 
O que não tinha aparecido ainda era uma teoria para a (relativamente) rápida queda de Bagdá. Pois já apareceu, no formato de artigos e textos publicados por diversos jornais de língua árabe. Segundo a tese, o ex-ditador e equipe negociaram a entrega da capital sem muita resistência para a coalizão desde que pudessem deixar o país sem serem pegos.
 
É por isso que nenhum membro mais importante de seu ministério ou mesmo de sua família foi capturado -com a provável exceção de Ali Químico, que teria sido morto no sul, mas de quem ninguém viu o corpo até agora.
 
Enquanto isso, no Irã, dois jornais deram que teria se suicidado o ex-ministro da Informação Mohammed Said al Sahaf, que virou figura cult na internet e ganhou sites dedicados a suas frases desprovidas de realidade durante a guerra. Para quem foi a mais de dez entrevistas coletivas protagonizadas por ele, a impressão é de que Sahaf não se suicidaria.
 
Pela primeira vez desde que Saddam Hussein tomou o poder, em 1979, alguém pôde distribuir na capital panfletos com fotos do líder curdo Massoud Barzani sem que estes dissessem "Procura-se -Vivo ou morto". Era um solitário manifestante recém-chegado do Curdistão, que entregava folhetos exaltando o presidente do Partido Democrático do Curdistão.
 
Reabriu anteontem o restaurante Nabil, um dos mais caros de Bagdá -US$ 15 uma refeição completa. Por enquanto, funciona com um cardápio reduzido: espaguete italiano (na verdade, à bolonhesa) e espaguete mexicano (na verdade, com pepino -?- e filé fatiado). Mas as filas na porta têm outra explicação: é um dos únicos lugares de Bagdá que servem cerveja com álcool.
 
Os meninos voltaram a pescar às margens do Tigre, na rua Sadeh.
 
Os quarteirões à beira-rio do endereço que reunia nove entre dez figurões do regime de Saddam Hussein eram proibidos para os bagdalis "mortais". Não mais. Desde a queda do regime, primeiro as casas foram saqueadas (entre elas a do ex-vice-premiê Tariq Aziz). Agora, o povo começa a chegar aos poucos para aproveitar a liberdade de poder frequentar a margem esquerda do Tigre.
 
Ontem, vários meninos nadavam e pescavam no deck que antes era exclusividade de Tariq Aziz. No muro da casa que um dia foi dele, alguém pichou: "Propriedade devolvida aos donos originais".
 
A única sede de ministério, além da do Petróleo, que não foi bombardeada e que desde o começo conta com a proteção integral dos marines em Bagdá? A do Interior, a mesma que era responsável pelas dezenas de polícias secretas criadas por Saddam Hussein.
 
A gasolina barata, um dos maiores orgulhos do iraquiano, já é história. Pelo menos em Bagdá. Até mesmo durante a fase dos bombardeios desta guerra, cem litros de gasolina saíam por US$ 0,50 -barato mesmo para os padrões do país, onde o salário médio era de US$ 30.
 
Agora, com a escassez do produto, que parou de ser refinado por Doha, principal fornecedora da capital, dez litros não saem por menos de US$ 5. Ou seja, paga-se dez vezes mais para comprar dez vezes menos.


Texto Anterior: Diário de Bagdá: Marines invadem quartos de repórteres
Próximo Texto: Notas da guerra - Anistia: Petróleo é mais protegido do que civis
Índice


UOL
Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.