São Paulo, domingo, 16 de abril de 2006

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"EIXO DO MAL"

Patrick Clawson sugere ações preventivas contra o Irã que não sejam interpretadas como "guerra aberta"

Mentor da ofensiva prefere sabotagens

DE WASHINGTON

Ruivo, muito branco e de olhos azuis no exterior. Cheio de idéias belicosas no interior. De certa maneira, Patrick Clawson é o "american dream" personificado. É também, segundo o insuspeito jornalista Seymour Hersh, ganhador do prêmio Pulitzer e autor do principal livro sobre o escândalo da prisão de Abu Ghraib ("Cadeia de Comando", 2004), a cabeça por trás do plano de mudança de regime no Irã.
Diretor-assistente de pesquisa do Instituto para a estratégia do Oriente Médio, foi do Instituto Nacional de Estudos Estratégicos da Universidade de Defesa Nacional e economista do Instituto de Pesquisas de Política Externa, no Banco Mundial e no Fundo Monetário Internacional. É fluente em farsi, hebraico, alemão, espanhol e francês, e autor, entre outros livros, de "Getting Ready for a Nuclear Ready Iran" (2005), "Eternal Iran - Continuity and Chaos" (2005), "Checking Iran's Nuclear Ambitions" (2004), "U.S. Sanctions on Iran" (1997) e "Iran's Strategic Intentions and Capabilities" (1994).
Na última quarta-feira, ele falou à Folha em Washington. (SD)

Folha - Os Estados Unidos vão intervir militarmente no Irã, seja da maneira que for?
Patrick Clawson -
Sim. Na verdade, o subsecretário de Defesa Robert Joseph está na região do golfo Pérsico nesse exato momento, e um dos aspectos de sua viagem é o que ele já antecipou em seu depoimento ao Senado há um mês: pensar em medidas preventivas que os Estados Unidos terão de tomar. Em outras palavras, intervenção militar? Sim.

Folha - Quais medidas?
Clawson -
Há várias possíveis. Das mais simples, como interceptar carregamentos que podem contribuir para a construção ou o desenvolvimento de artefatos atômicos, às mais sofisticadas, como programar exercícios militares no golfo visando uma intervenção no Irã. Voltando à pergunta anterior, sim, há uma série de atividades militares acontecendo nesse momento e, sim, há uma série de medidas militares que podem vir a ser tomadas.
Não quero cair na "especulação selvagem" de que falou o presidente, mas também não podemos negar de maneira peremptória que uma ação militar ofensiva será tomada, porque o governo do Irã vem agindo de maneira errática e beligerante, e não é impossível que você ouça em breve o presidente daquele país vir a público e dizer: "Nós temos a bomba atômica e nós vamos usá-la".

Folha - O sr. é chamado de o cérebro por trás do plano para a mudança de regime no Irã. Isso é verdade?
Clawson -
Fico honrado com isso, mas o verdadeiro cérebro é o povo iraniano. E eu tenho de citar que o principal editorial desta semana do "New York Times" sobre o assunto também pede uma mudança de regime no Irã. Fiquei feliz ao ver um jornal (liberal) como este concordar com o ponto de vista do nosso instituto (conservador).

Folha - O sr. disse também que a guerra é necessária, embora prefira "sabotagem e outras atividades clandestinas, como incidentes industriais". O sr. pode elaborar mais sobre isso?
Clawson -
Bem... O que eu quero dizer é que seria muito bom se nós pudéssemos usar o caminho da sabotagem e ações semelhantes em vez de lançar mão de ataques aéreos contra as locais de produção nuclear. Eu não sei se poderemos, mas seria bom, porque seria encarado menos como uma "guerra" e a situação poderia ser mais controlada. Mas eu não sei mais se é possível. O pessoal técnico da área militar é que tomará essa decisão.

Folha - O Irã está a quanto tempo de construir uma arma atômica eficiente o suficiente para ameaçar outros países?
Clawson -
Nós não sabemos. E os problemas não são tecnicalidades, mas a questão política. Quais serão as intenções de Teerã? Em pouco tempo o país vai ter a tecnologia para construir um artefato nuclear, e a questão será: o que eles vão fazer com isso?
A maior parte dos analistas acredita que o país esperará até que tenha uma quantidade significativa de armas nucleares. Mas também é possível que, digamos, em fevereiro os líderes decidam que vão usar todas as centrífugas para construir apenas uma arma, em tempo recorde. Ou seja, esqueça as tecnicalidades, o que interessa é a intenção política. E isso é algo que ninguém sabe, a não ser que você entre na cabeça de Mahmoud Ahmadinejad.

Folha - O secretário de Defesa norte-americano, Donald Rumsfeld, vem sendo atacado por diversos generais da reserva. Na possibilidade de os EUA invadirem o Irã, o sr. acredita que ele ainda seria um nome forte para estar à frente das tropas?
Clawson -
Hmmm... (pausa) Não sei, eu não vou responder a esta pergunta.

Folha - O sr. disse que o Irã se sente "autoconfiante" nesse momento. Por quê?
Clawson -
Uma conjunção de fatores. O país está faturando como nunca por conta da alta do petróleo, não tem mais a ameaça constante do governo do Taleban no vizinho Afeganistão, seu inimigo histórico, Saddam Hussein, está na cadeia, os xiitas mostraram força nas eleições recentes no Iraque. Por fim, eles acreditam que os EUA estejam enfraquecidos militarmente por conta do Iraque, portanto sem possibilidade de ação.

Folha - Por falar em Saddam Hussein, qual a garantia de que as informações confidenciais que a Casa Branca detém hoje sobre a capacidade nuclear do Irã sejam melhores do que as que diziam que o Iraque tinha armas de destruição em massa?
Clawson -
As situações são muito diferentes. A principal diferença é a de que agora temos uma quantidade enorme de informações sobre o que o Irã está fazendo, conseguidas pelos inspetores da ONU. Temos também os anúncios que o próprio presidente iraniano vem fazendo sobre como pretende agir.
Ou seja, a melhor informação que temos sobre o programa iraniano é o que o próprio governo deles nos disse, que está planejando dominar todo o ciclo nuclear.

Folha - Não há dúvidas desta vez?
Clawson -
Não. Agora, se eles vão ou não construir uma arma, nós não sabemos. Mas, francamente, não importa.
Outra diferença importante é que agora nós temos uma coalizão internacional muito maior do que antes da Guerra do Iraque que afirma que o Irã tem de suspender suas atividades nucleares imediatamente. Resumindo: dessa vez, temos mais informação e mais gente do nosso lado.
(SD)


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