São Paulo, quarta-feira, 16 de abril de 2008

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Berlusconi anuncia cruzada contra os imigrantes ilegais

Premiê eleito promete fechar fronteiras da Itália e diz que estrangeiros sem emprego engrossam "exército do mal"

Atento ao peso da Liga Norte, partido xenófobo com votação expressiva, empresário diz que ela não comandará seu governo

Alessandra Tarantino/Associated Press
Em entrevista em Roma, Silvio Berlusconi tocou nos pontos que incomodam seus eleitores

CLÓVIS ROSSI
ENVIADO ESPECIAL A ROMA

Primeiro e nada surpreendente anúncio de Silvio Berlusconi, 24 horas depois de sua cômoda vitória nas eleições italianas: "Fecharemos as fronteiras [para a entrada de imigrantes ilegais]". Não é tudo, nessa área: "Devolveremos os imigrantes extracomunitários" [de fora da Europa], em colaboração com os governos dos países que ficam do outro lado do Mediterrâneo e do Adriático, os dois mares que servem de acesso à Itália para imigrantes africanos e do mundo árabe.
Os dois anúncios foram feitos na entrevista coletiva que Berlusconi concedeu na tarde de ontem, na sede de seu partido, o Povo da Liberdade.
Antes, em entrevista à Rai-1, um dos três canais estatais de TV da Itália, o primeiro-ministro eleito, além de também prometer o fechamento das fronteiras, dissera que seu governo construirá "mais acampamentos para recolher cidadãos estrangeiros que não têm trabalho e são forçados a entrar na vida do crime".
Disparou em seguida: "Precisamos de mais polícia de vizinhança, para constituir um exército do bem nas praças e nas ruas para se interpor entre o povo italiano e o exército do mal", que, ao menos em parte, é constituído precisamente pelos imigrantes que "não têm trabalho e são forçados a entrar na vida do crime".
Promessas que se tornam mais fáceis de levar a cabo na medida em que a coalizão que apoiou Berlusconi ficou com 340 das 630 cadeiras da Câmara dos Deputados (maioria absoluta, portanto) e com 171 dos 315 senadores, também maioria absoluta que pode até aumentar algo porque falta atribuir seis vagas, reservadas a italianos que vivem no exterior.
O Berlusconi que apareceu na entrevista coletiva foi, na essência, o mesmo pragmático de sempre, tocando preferencialmente nos pontos que de fato incomodam os italianos. A imigração em massa é um deles, assim como é a ligação usualmente feita entre ela e o aumento da criminalidade.
Fechar as fronteiras e devolver imigrantes ilegais é, pois, um tema popular. Como o é a promessa de aumentar as penas para os crimes mais graves, também anunciada na coletiva.
Segundo a Cáritas, grupo beneficente, há hoje na Itália pouco mais de 3 milhões de imigrantes legais -dados superiores aos do Censo de 2005 (veja tabela ao lado). Outros 800 mil estão em situação irregular, embora seja naturalmente difícil saber o número exato.
Na região do Lázio, que circunda Roma, "65% dos estrangeiros trabalham sem contrato", calcula Alessandra Caragiuli, investigadora social e membro da Dhumcatu, associação de ajuda aos imigrantes.
A mão dura que o premiê eleito anunciou ontem combina perfeitamente com o ideário de dois de seus aliados, a Liga Norte e a Aliança Nacional, o grupo pós-fascista que se dissolveu no Povo da Liberdade, partido que Berlusconi criou para a atual eleição.
A Liga Norte, xenófoba e pró-independência de uma boa fatia do rico norte italiano, dobrou a porcentagem de votos em relação ao pleito anterior, em 2006, a ponto de o jornal "La Repubblica" ter dado ontem como manchete "L"Italia a Berlusconi e Bossi", equiparando o líder da Liga, Umberto Bossi, ao próprio Berlusconi.
Ciente dessa especulação em torno do peso da Liga, Berlusconi tratou de rebatê-la na coletiva, ao dizer que o grupo é "leal" e "não comandará o governo; jamais comandou".
Mão dura contra a imigração e a criminalidade, numa ponta, mãos abertas na outra para "aliviar a situação das famílias", promete o futuro primeiro-ministro da Itália.

Promessas
Berlusconi confirmou o que dissera na campanha: eliminará o ICI (Imposto Comunal sobre Imóveis), "adequará pensões até 1.000 ao custo de vida" e dará benefícios, que não especificou, a jovens e empresas. Mas, antes de tudo isso, anunciou que enfrentará de imediato o que chamou de "duas emergências". Primeira: instalará seu governo em Nápoles durante alguns dias da semana, como símbolo da disposição de enfrentar o problema do lixo acumulado nas ruas, uma das recentes cenas explícitas do declínio italiano.
Segunda: evitar que a Alitália, a empresa aérea estatal, seja vendida para grupos estrangeiros (há uma oferta da Air France). "Seria o cúmulo se, na hora em que a exposição mundial de 2015 é atribuída a Milão, não houvesse uma empresa aérea com bandeira italiana", acha Berlusconi.
Para os que acusam o megaempresário de autoritário, seu primeiro encontro internacional só alimentará a suspeição: será na sexta-feira com Vladimir Putin, que está transitando da Presidência da Rússia para o cargo de premiê, mas sempre na cúpula do poder.


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