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ARTIGO
O G8 ampliado e a governança global
Participação do Brasil e de outros países em desenvolvimento é importante para debates sobre liberalização econômica, proteção ambiental e segurança
LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA
Nos dias 15 a 17 de julho, durante a Cúpula do Grupo dos
Oito, em São Petersburgo, participarei, juntamente com os líderes das principais economias
industriais e emergentes do
mundo de um diálogo ampliado, iniciado em Evian, em
2003, e aprofundado em Gleneagles, em 2005, sobre importantes temas da agenda global.
O convite do presidente Putin para que o Brasil e outros
países em desenvolvimento
participem das discussões do
G8 é extremamente louvável
pela contribuição que aporta
para a governança internacional. No momento em que se
avolumam desafios mundiais
em matéria de liberalização comercial, coordenação econômica, proteção ambiental e de
segurança, o encontro de São
Petersburgo traz otimismo e
esperança.
Nas Nações Unidas e nas instituições de Bretton Woods se
discute a necessidade de reformar as instâncias multilaterais,
para que elas reflitam melhor
as realidades do mundo contemporâneo. O mecanismo do
G8 ampliado, ainda que tenha
suas limitações, contribui para
um debate mais legítimo sobre
uma nova ordem internacional.
Afinal, os grandes desafios enfrentados pelo G8 são desafios
globais, que requerem soluções
em escala planetária.
Minha experiência de vida
-como dirigente sindical e político- foi forjada no diálogo,
na negociação. Aprendi que é
na conversa franca, olhando no
olho de meu interlocutor, sem
abrir mão de convicções, que
temos condições de reduzir diferenças e ampliar consensos.
É isto que espero da reunião de
São Petersburgo que os chefes
de governo e de Estado lá presentes dêem uma demonstração de liderança e de coragem
política.
Essas virtudes são especialmente necessárias no momento em que estão em causa a credibilidade e a viabilidade da
OMC -um dos pilares do multilateralismo. Teremos em São
Petersburgo talvez a última
chance para destravar a Rodada de Doha e provar que o comércio pode efetivamente ser
uma alavanca para o desenvolvimento, quebrando um ciclo
de desigualdades, em muitos
casos responsável pela miséria
e violência que golpeia sobretudo os países mais pobres.
A reunião ministerial de Genebra, de início de julho, deixou
patente o que todos sabemos:
as negociações em nível exclusivamente técnico não avançarão sem vontade política.
De minha parte, estarei levando a esse encontro a disposição brasileira de fazer as concessões a nosso alcance para
podermos chegar a um acordo.
Confio que meus pares terão
igual atitude, pois a História
não nos perdoará se frustrarmos por mais alguns anos, talvez décadas, as legítimas aspirações dos mais necessitados.
Segurança energética
Outro tema onde também
precisamos encontrar soluções
globais é o da segurança energética. Apesar das distintas necessidades nacionais em matéria de energia, compartilhamos
o desafio comum de assegurar
acesso a energia limpa, de fornecimento confiável e a preços
acessíveis.
É com esse intuito que levarei a São Petersburgo os resultados da grande aposta que o
Brasil está fazendo no desenvolvimento dos biocombustíveis. Quero compartilhar meu
entusiasmo com as excelentes
perspectivas para o etanol, o
biodiesel e o H-bio (que é uma
combinação inovadora de óleos
vegetais e fósseis).
Esses produtos constituem,
em primeiro lugar, alternativa
de energia renovável, permitindo diversificar a matriz energética mundial e reduzir uma indesejável dependência de número limitado de fontes e fornecedores. Em segundo lugar,
são fator de proteção ambiental, por emitir poucos gases,
responsáveis pelo efeito estufa,
e por aproveitar dejetos agrícolas e terras exauridas.
Em terceiro lugar, essas biomassas são ferramentas de desenvolvimento com forte impacto social. Dada a abundância e variedade das matérias
primas e a versatilidade da tecnologia empregada, permitem
a geração de empregos na pequena e média agricultura e na
indústria. E geram receitas de
exportação para países muitas
vezes dependentes de uma única commodity e com carência
de recursos energéticos.
O aproveitamento de todo o
potencial dos biocombustíveis
passa, entretanto, pela criação
de novos modelos de cooperação energética. Precisamos
unir esforços na geração e disseminação dessas tecnologias e
na abertura dos mercados
mundiais para os novos combustíveis. Para tanto, o Brasil
está propondo a constituição
de um Fórum Etanol para ajudar a fixar padrões internacionais para lidar com as questões
técnicas e logísticas associadas
à produção e suprimento desses combustíveis.
Não se tratará mais de dividir
o mundo entre produtores e
importadores, nem de gerar
novas relações de dependência,
já que todos poderão produzir e
consumir diferentes tipos de
biocombustíveis. A idéia é maximizar as vantagens que essas
novas fontes de energia podem
trazer em termos de diversificação agrícola, geração de empregos e preservação ambiental. Enfim, os benefícios potenciais dessa energia são assim
como sua fonte -inesgotáveis.
Educação e saúde
Os demais temas na agenda
de São Petersburgo requerem
iniciativas igualmente ambiciosas e inovadoras.
No campo da educação, por
exemplo, o Brasil oferece capacitação pedagógica em países
pobres, que poderia ser parcialmente financiada por membros do G8. Queremos também
ver ampliado para outros países o programa de conversão de
dívidas de países pobres por investimentos em programas
educativos locais.
Vamos divulgar proposta relevante para dois outros temas:
combate às pandemias e mecanismos inovadores de financiamento do desenvolvimento.
Trata-se da Central Internacional para a Compra de Medicamentos para combater a Aids, a
malária e a tuberculose nos países em desenvolvimento, a ser
custeada por uma contribuição
internacional sobre bilhetes
aéreos, em fase de implementação em vários países, inclusive
o Brasil.
Estamos levando para São
Petersburgo propostas e expectativas ambiciosas. Estou seguro de que voltaremos com esperanças redobradas e um compromisso renovado com a parceria e solidariedade globais.
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