São Paulo, domingo, 16 de setembro de 2007

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Estupro leva líder polígamo à Justiça

Julgamento de Warren Jeffs chama atenção para os fugitivos de seita no Estado de Utah, nos EUA

Jeffs é acusado de cumplicidade em violação por obrigar jovem de 14 anos a se casar; defesa diz que há perseguição religiosa

ANDREA MURTA
DA REDAÇÃO

Nos EUA a poligamia pode até fazer sucesso nas telas: o seriado "Big Love", da rede HBO, tem um protagonista com três mulheres e é assistido por cerca de 4 milhões de pessoas. Mas na vida real o tema não tem tanta graça. Prova disso é a polêmica causada pelo início do julgamento em Utah, no última dia 13, de Warren Jeffs, líder da seita poligâmica Igreja Fundamentalista de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias -FLDS, na sigla em inglês.
Jeffs, 51, foi acusado de cumplicidade no estupro de uma adolescente de 14 anos em 2001. Segundo promotores, ele ordenou que a menina se casasse com um primo cinco anos mais velho e a orientou a "procriar". "Senti-me como se estivesse me preparando para morrer. Warren ignorou completamente o fato de que eu não queria me casar", testemunhou a jovem no tribunal anteontem.
Para a defesa, o julgamento não passa de perseguição religiosa: na FLDS, os casamentos arranjados, assim como a poligamia, são dogmas de fé.
Pouco antes do julgamento de Jeffs, outra decisão legal sobre o tema foi foco de manchetes: Tom Green, 59, recebeu liberdade condicional em Utah em agosto depois de cumprir pena por poligamia. Ele foi também acusado de estupro, por manter relações com uma enteada de 13 anos -que depois se casou com ele.
A vitória de Green, porém, não foi comemorada por todos os defensores dos casamentos múltiplos. "As pessoas têm que saber que poligamia não significa se casar com meninas de 13 anos", afirmou então o defensor da causa Mark Henkel, no site pro-polygamy.com.
Apesar de Jeffs não ser acusado propriamente de poligamia, o tema perpassa todo o julgamento. A FLDS prega que, para chegar ao paraíso, um homem precisa ter pelo menos três mulheres.

Fugitivos
Os casamentos forçados e as rígidas regras da FLDS não criam problemas apenas na Justiça. Um número cada vez maior de meninos e meninas está deixando a seita, voluntariamente ou não, para "chegarem completamente despreparados a um mundo que aprenderam a temer". "Essas crianças não têm nenhuma supervisão, não entendem a cultura americana", afirmou à Folha Shannon Price, diretora da Diversity Foundation -que ajuda os "garotos perdidos" a se ajustarem fora da seita.
Segundo a organização, a partir 2002 -quando Jeffs assumiu a liderança da FLDS no lugar de seu pai- a igreja deu início à expulsão sistemática de garotos entre 14 e 23 anos, oficialmente por infrações como falar com garotas ou assistir a filmes. Críticos da comunidade afirmam que as expulsões são uma necessidade matemática: com os casamentos plurais, não há mulheres suficientes.
Isso ajuda a explicar por que apenas 10% dos que saem são meninas -e voluntariamente.
Do lado de fora, organizações de apoio ajudam os exilados a voltar a estudar. Dados da Diversity Foundation indicam que 99% deles não têm educação formal. Price destaca que os exilados são "meninos bons e inteligentes". "Mas, sozinhos, criam uma mentalidade de gangue e se envolvem com abuso de substâncias e crime", diz a diretora.
Segundo ela, a maioria sofre de estresse pós-traumático e vivenciou violência doméstica. Para os exilados, o julgamento de Jeffs é como uma redenção. "É como se dissessem: "estávamos certos. Ele é uma pessoa má. Não deveríamos ter sido expulsos'", diz Price. Já para a comunidade, "esta é mais uma perseguição". "E os seguidores da FLDS estão acostumados a serem perseguidos."


Com agências internacionais

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