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PÓS-APARTHEID
Cresce ressentimento com enriquecimento de figuras privilegiadas que têm boas relações com governantes
Elite negra sul-africana causa tensão social
JOHN REED
DO "FINANCIAL TIMES'
Dez anos depois do final do
apartheid, a minoria branca da
África do Sul continua a controlar
a economia do país. Mas a reação
contra o pequeno grupo de empresários recentemente enriquecidos, conhecidos como "magnatas do poder econômico negro",
começa a se intensificar.
O Congresso Nacional Africano
(CNA), partido governante, é o
arquiteto e um dos principais defensores da idéia de promover o
crescimento do poder econômico
negro para realinhar a economia
do país, distorcida em termos raciais. Mas vem crescendo o ressentimento, dentro e fora da elite
governante, com o que alguns críticos classificam de enriquecimento econômico negro de apenas algumas figuras dotadas de
boas conexões políticas.
O CNA colocou o reforço do poderio econômico negro no topo
de sua agenda, devido à preocupação causada, nas palavras do
secretário-geral do partido, Kgalema Motlanthe, pelo fato de "que
vemos alguns nomes mencionados em todas as transações".
As empresas que antigamente
cortejavam os magnatas enquanto corriam para cumprir as metas
estabelecidas pelo programa começaram a rejeitá-los, como a terceira maior produtora mundial
de platina, Lonmin. A imprensa
contribuiu, com reportagem sobre brancos que se aproveitam do
programa de ampliação do poder
econômico negro, adquirindo riqueza rapidamente com as transações. Smuts Ngonyama, porta-voz do CNA, diz que "muitas pessoas se beneficiaram, mas houve
uma concentração perceptível
dos esforços de ampliação do poder econômico em torno de algumas pessoas".
A reação pode ter implicações
políticas, à medida que o presidente Thabo Mbeki dá início ao
seu segundo e -último- mandato de cinco anos. Três magnatas que servem na executiva nacional do CNA -Cyril Ramaphosa, Tokyo Sexwale e Saki Macozoma- são vistos como possíveis candidatos a sucedê-lo.
Bode expiatório
As grandes empresas jamais foram muito populares junto a boa
parte do CNA, e seus aliados sindicalistas e comunistas. Agora,
eles têm um novo alvo e bode expiatório, na forma dos magnatas
negros. Reg Rumney, da BusinessMap Foundation, uma organização de pesquisa econômica,
diz que "não se pode criar empresas negras fortes a menos que haja
pessoas com dinheiro".
Poucas figuras públicas na África do Sul se opõem abertamente
ao princípio da ampliação do poder econômico negro, dadas as
desigualdades na distribuição de
riqueza, relacionadas à raça. Essa
política é vista como essencial para o relaxamento das tensões raciais, e para garantir a futura estabilidade do país. Mas o processo
criou novas causas de fricção.
Sob pressão do governo, as mineradoras, bancos e outros setores adotaram programas com o
objetivo de beneficiar grupos historicamente prejudicados. O banco Absa escolheu Sexwale, que
também tem interesses em mineração, energia e transportes, para
liderar um consórcio que controlará 10% de seu capital. O concorrente Standard Bank se aliou ao
consórcio liderado por Macozoma e Ramaphosa, um sindicalista
que se tornou empresário.
Mas a maioria dos negros não
avançou muito economicamente
com relação à situação em que viviam durante o apartheid. Empresas controladas por negros
continuam a responder por apenas 4% da capitalização na bolsa
de Johannesburgo, de acordo
com a BusinessMap.
A política de ampliação do poderio econômico negro também
teve algumas conseqüências inesperadas. Mbeki se queixou de que
empresas brancas estavam usando executivos negros que ocupam
cargos simbólicos como "fachada" para conquistar contratos públicos. Os brancos, incluindo executivos do grupo de telefonia móvel MTN e da Mvelaphanda Holdings, de Sexwale, se beneficiaram de algumas das maiores transações realizadas nos termos da
política. O fenômeno levou um
jornalista a criar o acrônimo
"Bhapas", que traduzido significa
"privilegiados tanto histórica
quanto atualmente".
Alguns analistas acreditam que
os magnatas venham sendo atacados injustamente. Os jovens negros precisam de modelos, dizem,
para que um dia possam se tornar
o equivalente dos "Randlords",
que construíram o moderno capitalismo sul-africano.
Com dívidas pesadas, nenhum
dos magnatas negros tem fortuna
nem próxima à dos sul-africanos
brancos mais ricos, ou à dos oligarcas russos que prosperaram
explorando suas conexões com o
Kremlin. Moeleti Mbeki, empresário e analista independente, diz
que "todos os chamados magnatas são peixes pequenos. Recebem
honorários das grandes empresas
para lhes proteger os interesses".
Mas, ao reconhecer a crescente
reação contra a política de ampliação do poder econômico negro, em sua forma atual, o governo e as empresas começaram a
enfatizar medidas mais amplas de
promoção da prosperidade para
os negros. A Lonmin, quando
vendeu 18% de suas operações de
platina a um consórcio, alega ter
rejeitado ofertas de magnatas conhecidos em favor de uma estrutura controlada por funcionários
e por pequenos grupos de investimento negros.
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