São Paulo, domingo, 16 de outubro de 2005 |
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HISTÓRIA Pesquisas revelam que soldados do Exército Vermelho estupraram 100 mil alemãs no final da Segunda Guerra Livros mostram barbárie russa em Berlim
JOÃO BATISTA NATALI DA REPORTAGEM LOCAL O Exército Vermelho capturou Berlim em 2 de maio de 1945. Mas os militares soviéticos não foram apenas libertadores. Também cometeram atrocidades. Cerca de 100 mil mulheres berlinenses foram estupradas, e 10 mil delas se suicidaram pelo temor ou pela humilhação do estupro. O assunto permaneceu por mais de 40 anos como uma espécie de tabu historiográfico. Começou a vir à tona por meio de estudos que tentaram demonstrar que os alemães também estão entre as vítimas da Segunda Guerra. Não se trata de repensar as motivações do nazismo ou do ódio que o alimentou. Nada rigorosamente a ver com o "revisionismo" da extrema direita, que minimiza a matança de judeus. O que esses historiadores indicam é que, 60 anos depois do fim da guerra, é possível indagar desapaixonadamente -como o faz W. G. Sebald, em "On The Natural History of Destruction" (a história natural da destruição, na tradução inglesa)- como a memória alemã digeriu as mortes e a destruição provocadas pelos bombardeios de 131 cidades, entre elas Dresden, já em 1945. Os estupros do Exército Vermelho foram relatados com patética elegância e sem autopiedade em "Eine Frau in Berlin" (uma mulher em Berlim), de autora anônima, publicado em 1954. Mas o livro mexia numa ferida delicada. Tornou-se um fracasso editorial. O diário intimo, recentemente republicado e traduzido em inglês, traz prefácio do historiador militar britânico Antony Beevor ("Berlim, 1945: a Queda", ed. Record). Está saindo por esses dias, também dele, "O Mistério de Olga Tchekova", atriz amiga de Hitler e talvez também espiã soviética. Beevor não crê que o estupro tenha sido uma política oficial soviética, como o foi a política alemã de extermínio de dissidentes ou não-arianos. Nem por isso seus efeitos deixam de ser trágicos. Folha - Qual a motivação dos soldados do Exército Vermelho para estuprar? Uma vingança à integridade das mulheres do inimigo? Antony Beevor - Há muitas respostas possíveis. Há o condimento de vingança, em razão das atrocidades que os alemães cometeram na União Soviética. Tal sentimento era encorajado pela propaganda militar russa. Bem antes de as tropas russas chegarem a Berlim, os comissários políticos reuniam soldados em "encontros de vingança", em que os participantes listavam familiares mortos e destruição de casas pela ofensiva do 3º Reich. Isso era feito para estimular os soldados ao combate. Folha - Mas os estupradores não
extravasavam também sentimentos menos politizados? Folha - Os alemães também estupraram na Rússia? Folha - O soldado russo em Berlim
não era também um indivíduo sexualmente reprimido?
Folha - Em seu livro o sr. menciona também o papel do consumo do álcool. Os alemães não destruíram suas adegas, conforme o Exército Vermelho avançava? Beevor - Mulheres alemãs com as quais conversei narram a necessidade de os soldados soviéticos se embriagarem para criar coragem para o estupro. Essa forma de violência sempre ocorria à noite, depois que os soldados já haviam consumido sua ração de vodca ou de outra bebida que arrumavam. Folha - Como explicar o silêncio
de tantos anos? Heirich Böll fez um
bom inventário das misérias humanas da Alemanha, mas não fez um
romance sobre o estupro. Folha - Há só uma ou várias formas de estupro? Folha - Não lhe parece estranho
que isso não tenha vindo à tona nos
anos 70, quando as feministas alemãs se mostraram tão agressivas
ao listar formas de opressão? Folha - Sobre o livro "Uma Mulher
em Berlim", o sr.
acredita que ele
desencadeou um
processo pelo qual
outras vítimas ainda vivas se sentirão livres para testemunhar? Folha - Há algumas semanas um
historiador anunciou ter descoberto que a autora de "Uma Mulher em
Berlim", que morreu em 2001, foi
Marta Hiller, jornalista que nos
anos 30 estudou na França. Isso é a
seu ver relevante? Folha - O sr. e outros autores afirmam que foram 100 mil as estupradas em Berlim, em 1945. Esse número não seria exagerado? O Estado havia ruído. Não havia uma burocracia capaz de fazer estatísticas. Folha - Por que a mulher procurava um hospital ao ser estuprada? Folha - E quanto às estimativas
de 2 milhões de estupradas na zona
alemã de ocupação soviética? Folha - Os arquivos militares russos trazem relatos
de punição contra
os estupradores? Folha - O sr. cita o fato de 10 mil
alemãs terem se suicidado depois
de estupradas. É também um número confiável? Folha - Como e quando a onda de
estupros cessou? |
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