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EUA e França são atores ocultos do conflito
Franceses têm antiga disputa com líder de Ruanda, Paul Kagame, que apóia rebeldes tutsis no Congo e é aliado de americanos
Região dos Grandes Lagos africanos, rica em minérios e barreira da "guerra ao terror", é alvo de cobiça de interesses estrangeiros
MARINA MESEGUER
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
Antigo Zaire, dominado por
32 anos pela ditadura de Mobuto Sese Seko (1965-1997), a República Democrática do Congo
é um Estado enfraquecido pela
guerra civil que já deixou cerca
de 5 milhões de mortos desde
1998 e é incapaz de controlar
todo o seu território, alvo de cobiça de países e empresas estrangeiros e das elites locais.
"O Estado congolês é fraco;
ele não tem presença verdadeira em todo o país", diz o coronel
Jean-Paul Dietrich, porta-voz
militar da Missão das Nações
Unidas para o Congo (Monuc).
Além do Exército, das milícias aliadas aos militares e da
milícia rebelde do general
Nkunda -que representa interesses dos tutsis congoleses e
do governo da vizinha Ruanda-, há, diz o coronel Dietrich,
outros atores "internos e externos" implicados no conflito.
França e Estados Unidos lutam para exercer influência na
região dos Grandes Lagos (que
tem fronteiras com Ruanda,
Burundi, Uganda, Congo, Tanzânia e Quênia), rica em recursos minerais. A França defende
sua declinante penetração na
"África francesa" e/ou francófona, enquanto os EUA ganham
influência sobre ela: na Argélia,
na Guiné Equatorial, na Costa
do Marfim, em Ruanda.
Esta última é governada pelo
tutsi Paul Kagame, que está em
confronto com os franceses,
aos quais acusou formalmente,
em relatório divulgado em
agosto, de cumplicidade no genocídio de 800 mil tutsis e hutus moderados em 1994.
A França, do seu lado, acusa
Kagame, ex-chefe da guerrilheira Frente Patriótica Ruandesa, de envolvimento no atentado que derrubou o avião do
presidente ruandês Juvénal
Habyarimana, assassinato que
em abril de 1994 desencadeou o
genocídio.
A Alemanha recém-extraditou para julgamento na França
a chefe de protocolo de Kagame, Rose Kabuye, acusada de
participação no atentado contra Habyarimana, que tinha
apoio político e militar francês.
Com o agravamento da rebelião de Nkunda contra o governo congolês de Joseph Kabila, a
França, na presidência da
União Européia, propôs o envio
de 1.500 homens à região, sem
encontrar apoio no bloco.
"O Congo é o segundo maior
país francófono do mundo, então há uma relação forte, tanto
política quanto comercial [com
a França]", diz o congolês Muzong Kodi, analista da Chatham House, de Londres.
Os EUA são aliados de Ruanda e Uganda -onde ficava baseada a guerrilha de Kagame-
e têm interesse no Congo por
três razões: consolidar hegemonia regional (neste ano o
país pôs em operação seu Comando Militar Africano), garantir investimentos para suas
empresas (os EUA são, por
exemplo, o maior comprador
de mundial de coltan, mineral
usado em componentes eletrônicos) e usar a região dos Grandes Lagos como tampão para
frear o avanço do fundamentalismo islâmico no Sudão e na
Somália.
A China também tem interesses no Congo. O país fechou
um contrato com o governo
congolês pelo qual se comprometia a fazer obras de infra-estrutura, recebendo em troca
cobre e cobalto. Nkunda se
opõe ao contrato.
Muzong Kodi, da Chatham
House, diz que "a China não é
um fator nessa guerra. A questão chinesa é apenas uma cortina de fumaça que Nkunda utiliza para ocultar sua motivação,
que é expandir o controle das
zonas de mineração na região".
As minas de cobre e de cobalto
não ficam em Kivu, centro do
atual conflito.
Tradução de CLARA ALLAIN
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