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Oposição e governistas se agridem na Bolívia
Embates em San Julián, que deixaram 20 feridos e dez carros destruídos, acirram tensões separatistas na região da meia lua
Ato contra Evo Morales, que visava reunir um milhão, atraiu dezenas de milhares; líder boliviano foi alvo de panfletos difamatórios
FABIANO MAISONNAVE
ENVIADO ESPECIAL A SANTA CRUZ
Opositores e simpatizantes
do presidente boliviano, Evo
Morales, se enfrentaram ontem na cidade de San Julián, ao
norte do departamento de Santa Cruz, deixando ao menos 20
feridos sem gravidade, além de
dez carros destruídos.
Segundo relato da agência
Efe baseado em fontes policiais, camponeses ligados ao
MAS (Movimento ao Socialismo) bloquearam a rodovia que
liga o norte do departamento à
cidade de Santa Cruz para impedir a chegada de manifestantes da oposição para o evento
de ontem à tarde.
Dos veículos destruídos, três
pertenciam a pessoas que se dirigiam à manifestação, chamada de "cabildo", em alusão a
reuniões realizadas na época
colonial quando uma comunidade precisava tomar decisões
importantes.
A maioria dos feridos foi
atingida por pedras e teve ferimentos leves. Seis tiveram de
ser transferidos a Santa Cruz
por terem sido atingidos com
mais gravidade.
O confronto acirrou ainda
mais os ânimos para a realização de manifestações convocadas para serem realizadas simultaneamente ontem a partir
das 16h por quatro governadores oposicionistas da chamada
"meia lua", região geográfica
formadas pelos departamentos
das terras baixas bolivianas:
Santa Cruz (leste), Tarija (sul) e
os amazônicos Pando e Beni
(norte).
Na manifestação de Santa
Cruz, realizada diante de uma
estátua de Jesus Cristo, grupos
de música regional se revezavam no palco enquanto uma
multidão vestida de verde e
branco, as cores de Santa Cruz,
chegava a pé, de carro, de ônibus ou em cima de caminhões.
A maioria usava camisetas
com a palavra "autonomia" e o
símbolo "2/3", em referência à
disputa entre o governo e a
oposição que tem atrasado os
trabalhos da Assembléia Constituinte desde a sua instalação,
no início de agosto.
Um das frases mais comuns
era "2/3 é democracia", mas
também havia camisetas com
slogans como "Faço parte de
uma nova república" ao lado de
uma meia lua e a palavra "independência." Em carros, havia o
mapa dos quatro departamentos ao lado da frase "meu país".
Outro tema de camiseta eram
alusões críticas ao presidente
Evo Morales. A mais comum
dizia "Evo te quer" ao lado de
um dedo médio levantado.
Panfletos
O governo Morales foi também o principal alvo dos panfletos apócrifos distribuídos
entre a multidão, que no final
da tarde chegava a dezenas de
milhares -o objetivo declarado
dos organizadores era reunir
um milhão em Santa Cruz.
Segundo um deles, o objetivo
de Morales na Assembléia Legislativa era aprovar artigos como "eliminação da liberdade
para professar cultos religiosos", "eliminação da propriedade privada", "obrigatoriedade
do aprendizado do aimará",
"eliminação de todo vestígio de
oposição mediante a expulsão e
o exílio de todos os opositores",
entre outros.
Questionado pela Folha sobre quem os produzia, o funcionário de logística Javier
Torres, 47, disse que era de um
grupo de amigos simpatizantes
do Comitê Cívico Pró-Santa
Cruz, organização controlada
por empresários locais.
A reportagem conversou
com duas secretárias que trabalham para o governo departamental. Uma disse que gritaria "autonomia", e outra, "independência". "Autonomia ou independência, o que não quero é
o que esse índio está fazendo
conosco", disse a Alicia Ibañez,
favorável à separação.
O rechaço a Morales era visto até entre as várias crianças
presentes no evento. Um menino de não mais de seis anos
perguntou: "E se partirmos a
cabeça de Evo?", repetiu várias
vezes, até que sua mãe respondeu: "Sim, com uma dinamite."
Sinalização
O governo sinalizou a realização de uma reunião de cúpula entre Morales e governadores oposicionistas, mas o encontro não estava confirmado
ontem.
A crise política na Bolívia
vem se acirrando desde que a
bancada governista na Assembléia Constituinte passou a
aprovação dos artigos constitucionais por maioria simples,
com a exceção dos três considerados mais polêmicos, que precisariam de dois terços. O MAS
(Movimento ao Socialismo)
tem pouco mais da metade das
cadeiras da Assembléia.
Os governadores rechaçam
esse sistema e exigem que todos os artigos sejam votados
por dois terços, como prevê a
Lei de Convocatória, sancionada por Morales em março.
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