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Santa Cruz aclama texto que lhe dá poder de legislar
Estatuto aprovado por Assembléia Provisória deve acirrar relações com La Paz
Governo sinaliza que 1º alvo, "depois do Natal", será repasse de impostos de hidrocarbonetos; Beni também aprova autonomia
FLÁVIA MARREIRO
ENVIADA ESPECIAL A SANTA CRUZ
No lançamento oficial do estatuto que pretende dar a Santa
Cruz independência administrativa em relação ao governo
Evo Morales, a Assembléia Autonômica Provisória, formada
pelo governador, parlamentares nacionais e representantes
municipais, declarou-se ontem
com poder para criar leis para o
departamento, o que deve aumentar ainda mais o nível de
confrontação com La Paz.
Pela atual Constituição boliviana, os departamentos não
podem legislar.
A competência para criar leis
está nas disposições provisórias do Estatuto Autonômico
aprovado nesta semana pelos
políticos cruzenhos, cujo texto
oficial revisado foi lido na Assembléia e aclamado ontem. O
departamento oposicionista de
Beni também aprovou seu estatuto, enquanto Tarija e Pando
levaram adiante documentos
semelhantes, que ignoram o
novo texto constitucional aprovado por governistas e aliados.
O governador de Santa Cruz,
Rubén Costas, confirmou que o
corpo de 155 políticos do departamento que formam a Assembléia Provisória terá capacidade provisória para legislar, até
que o estatuto em si seja implementado. Os dirigentes pretendem submeter o documento a
um referendo no departamento, que, uma vez ratificado, prevê a convocação de eleições para governador e para a primeira
Assembléia Legislativa departamental da história dos departamentos bolivianos.
O primeiro confronto direto
entre o governo Evo Morales e
a Assembléia cruzenha -que
La Paz considera ilegal- devem ser os repasses às regiões
do IDH (Imposto Direto dos
Hidrocarbonetos). O governo
nacional fez passar no Congresso boliviano lei que corta
30% dos recursos do tributo
transferidos aos departamentos para financiar um benefício
a idosos. A crise de Morales
com os governadores opositores foi agravada pelo corte, que
começa a vigorar em janeiro.
Questionado o que Santa
Cruz faria a partir de janeiro, o
governador Rubén Costas respondeu: "Vamos esperar passar
o Natal primeiro". Para logo
completar que a Assembléia
Provisória, com capacidade legislativa, não vai permitir a redução dos recursos.
Festa e atentado
Foi dia de tensão controlada
em Santa Cruz, diante dos rumores de que o governo nacional militarizaria a zona e declarações de que os cruzenhos "lutariam com a vida, se necessário". O único incidente maior,
porém, até o fechamento desta
edição, foi a detonação de um
artefato explosivo no sexto andar do prédio que abriga o Tribunal de Justiça nacional.
Apesar de haver funcionários
do prédio no momento, não
houve feridos. E a Polícia Nacional descartou vinculação
entre a suposta bomba e a crise
política entre La Paz e Santa
Cruz. A sessão da Assembléia
Provisória não chegou a ser interrompida.
Na cerimônia oficial, tocou-se apenas o hino cruzenho e os
discursos foram recheados de
críticas à "tirania" do governo
Evo Morales. Um padre benzeu
o novo estatuto. Na nova Carta
boliviana, que ainda vai a referendo, a religião católica deixa
de ser a oficial do país.
Com bandeiras nas ruas e
propagandas do movimento na
TV com os dizeres "Já somos
autônomos", a cidade comemorava como se o estatuto fosse de aplicação imediata. Haveria ainda uma festa no parque da cidade com todos os políticos.
Como os departamentos não
têm polícia própria, a segurança na festa de ontem ficaria por
conta da guarda departamental
-que não pode usar armas- e
dos integrantes da União Juvenil Cruzenha, espécie de braço
executivo do movimento. Os
jovens, que negam usar armas,
são freqüentemente acusados
de coagir a população a participar das manifestações. "Se for
preciso, teremos armas para
nos defender. Há uma grande
tradição de ter armas aqui, uma
tradição de caça", disse o presidente da União, David Cejas .
Santa Cruz é o mais rico departamento boliviano, responsável por 35% do PIB do país.
Com o Estatuto Autonômico,
os cruzenhos querem legislar
sobre distribuição de terras e
gás e petróleo.
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