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Chile vota sob a sombra do desgaste da Concertação
Coalizão que governa país há 20 anos se arrisca a assistir à ascensão da nova direita
O esquerdista Eduardo Frei chega ao dia do pleito 1,8 ponto atrás do empresário Sebastián Piñera; desejo de renovação marca campanha
THIAGO GUIMARÃES
ENVIADO ESPECIAL A SANTIAGO
Estádio Nacional do Chile, 16
de dezembro de 2009. O ex-presidente Eduardo Frei
(1994-1999) lança sua campanha ao segundo turno diante de
5.000 militantes, funcionários
públicos e dirigentes sociais.
"Quero saudar os presidentes
de partidos", diz, e o público
responde com uma vaia que se
tornou o fato político da noite.
A cena resume a sucessão
presidencial que os chilenos
definem hoje. Independentemente do resultado, que promete ser o mais renhido dos últimos anos, a eleição foi marcada pela crise da Concertação, a
aliança de centro-esquerda que
comanda o Chile desde o fim da
ditadura (1973-1990) e guiou o
país por 20 anos de logros econômicos e sociais.
Após somar apenas 29% dos
votos no primeiro turno -o
pior resultado presidencial da
Concertação-, Frei acirrou a
disputa no segundo turno, mas
ainda vê a direita chegar como
favorita pelas mãos do moderado Sebastián Piñera, bilionário
que perdeu o pleito de 2005 para Michelle Bachelet.
Enquanto a direita se uniu
em torno de Piñera, vencedor
do primeiro turno com 44%, a
centro-esquerda pela primeira
vez foi dividida em três nomes
no primeiro turno. Entre eles
Marco Enríquez-Ominami, 36,
deputado dissidente da Concertação que, sem partido, teve
20% dos votos (1,3 milhão).
"Subestimamos o potencial
de Ominami e um descontentamento de base que havia", disse
à Folha o deputado eleito Pepe
Auth, que na última semana de
dezembro renunciou à presidência do PPD -uma das quatro siglas da Concertação.
"Se os caciques da Concertação renunciarem, há possibilidade de acordo [com Frei]",
disse Ominami à Folha após o
primeiro turno. Do alto de sua
votação, cobrava a renúncia
dos quatro presidentes que o
haviam impedido de participar
das primárias da coalizão para
escolha do candidato -estopim de sua saída da aliança.
Como a renúncia coletiva
não veio -os líderes dos dois
maiores partidos da coalizão, o
Socialista, de Bachelet, e a Democracia Cristã, de Frei, se recusaram a sair-, o apoio a Frei
chegou morno, a quatro dias do
pleito. "Os finalistas são parte
do passado", disse Ominami.
"O conceito de renovação foi
o mais forte desta eleição", afirma o analista político Cristóbal
Bellolio. Foi justamente a falta
de renovação de seus quadros,
expressa na candidatura de um
ex-presidente, que agravou o
desgaste natural da coalizão
após 20 anos no poder.
No segundo turno, a tônica
da campanha foi a busca pelos
votos de Ominami. Frei e Piñera assumiram propostas e
cooptaram membros da campanha do deputado.
Diante da ameaça de derrota
da Concertação, o governo Bachelet, que ostenta a maior
aprovação da história recente
do país (cerca de 80%), deflagrou uma ofensiva no segundo
turno. Cedeu ministros à campanha de Frei e reforçou o discurso em temas como direitos
humanos para tentar reagrupar a esquerda.
A estratégia mostrou resultado: pela última pesquisa Mori, apenas 1,8 ponto separavam
Piñera e Frei -empate técnico.
Embora seja a eleição mais
importante nos últimos anos,
por apostar o futuro da coalizão política mais exitosa do
país, a campanha não animou
os chilenos. Reflexo de um certo consenso sobre os rumos do
país -Frei e Piñera não defendem mudanças radicais-, mas
também de desencanto com a
política. Exemplo: como o registro eleitoral não é obrigatório (só precisa votar quem está
inscrito), no primeiro turno os
votos válidos representaram
apenas 56% da população.
Sobre reflexos da eleição no
Brasil, diplomatas e empresários brasileiros no Chile coincidem em que não haverá grandes mudanças.
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