|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
"Turma do terninho" surge para salvar candidata de apuros
DO ENVIADO A OHIO
A primeira a chegar é Evonne
Perfect. Dona de um site que
vende produtos cuja renda vai
parcialmente para crianças do
Haiti, impossivelmente loira,
ela é a típica eleitora de Hillary
Clinton: branca, entre 50 e 60
anos, ativa socialmente, com
atividade política reduzida,
mas que na hora do aperto sai à
luta por seu candidato.
E agora é a hora do aperto para sua candidata, que perde terreno para um adversário homem. Nessa tarde fria de quinta, num dos ginásios da Universidade Estadual de Ohio, em
Columbus, a capital do Estado,
há ela, o repórter e poucas mais.
Será uma das paradas da ex-primeira-dama, que passará
ainda por Cleveland, na beira
do lago Erie, e Lyndhurst, em
seu subúrbio, entre outros.
Aos poucos, vai chegando o
que a campanha da primeira-dama chama carinhosamente
de "turma do terninho" ou "irmandade" -e que os críticos
apelidaram maldosamente de
"turma da menopausa": mulheres que se vestem como a ex-primeira-dama, com cores escuras, se apresentam pelo primeiro nome e chamam todo
mundo de "querido" e "querida". Entram no ginásio e fazem
uma roda enquanto esperam.
"O desafio é grande", começa
a aposentada Rochelle. "Ele fala muito bem", emenda Debbie
1, que se recupera da quimioterapia. "Mas ela também", diz
Debbie 2. "Que destino, justo os
dois e justo agora", diz Susan,
advogada "com parentes em
São Paulo". "É mais que uma
eleição, são eles [os homens] de
novo contra nós", resume Melissa, cujo caçula acaba de completar um ano e meio.
O sentimento da mãe recente
foi traduzido em palavras por
duas colunistas recentemente,
com grande repercussão. Para
Maureen Dowd, a mulher mais
lida do "New York Times", "não
estamos só na eleição mais vertiginosa de nossas vidas, mas
em outro seminário nacional
sobre raça e gênero que está
nos mostrando quem somos
enquanto decidimos o que queremos ser".
Já Elizabeth Wurtzel, autora
do best-seller "Prozac Nation",
escreveu no "Wall Street Journal" que essas mulheres se
identificam com Hillary porque já passaram por isso: ficaram anos dando duro para,
quando chega sua vez de pegar
o melhor escritório da firma,
"entra esse cara, esse Obamarama suingado": "As mulheres,
no final, vão dizer não a isso".
Professora
E elas são maioria na tarde
dessa quinta, em Columbus,
como serão também na noite
de sexta numa escola pública
num subúrbio de Cleveland.
Mas há jovens e homens, na
maioria ligados a sindicatos, alguns estudantes da maior universidade do Estado, com 50
mil alunos, e negros, poucos.
Um deles é Drew Carter, 24.
Democrata, ele pendia para o
lado de Barack Obama. Mas aí a
campanha de Hillary o contratou para ser DJ -Carter é do
grupo FamClick. "Estou quase
trocando de lado", diz à Folha.
Enquanto decide, é o responsável por soltar as músicas-tema da pré-candidata: "Every
Little Thing She Does is Magic", do Police e "Takin'Care of
Business, do canadense Randy
Bachman, entre outros hits.
"Estou no ramo das realizações, não dos sonhos", repetirá
Hillary nesse e nos próximos
comícios, cutucando a "mensagem da esperança" de Obama.
O seu não é um espetáculo de
som e luzes. Com a platéia variando entre 1.500 e 1.800 mil
pessoas e uma hora de atraso,
ela sobe ao palco. Está acompanhada do governador Ted
Strickland e do astronauta e
ex-senador John Glenn.
Onde Obama é messiânico,
ela é professoral. Se os comícios do senador parecem concertos de rock cristão, os da ex-primeira-dama têm ares de palestras. A platéia do primeiro
grita, chora, tenta chegar mais
perto, enquanto o orador fala
em "esperança" e "mudança".
A da segunda sacode a cabeça
em aprovação, a cada fato triste
que ela elenca sobre saúde pública e educação.
Hillary usa frases longas e
não espera pela reação do público. De vez em quando, lança
mão do gesto que seu marido
tornou conhecido mundialmente: ao começar a enumerar
o que vai fazer, por exemplo,
em relação aos financiamentos
para estudantes, começa a contar com o dedão da mão esquerda, punho fechado. Mas é
na essência uma tecnocrata.
Quarenta longos minutos
depois, ela acaba. Os curiosos
vão embora, mas a "turma do
terninho" fica: não vai sair sem
pegar um autógrafo, posar para
uma foto, trocar uma palavra.
Cercada por sua "Hillaryland"
e observada pelos seis armários
do serviço secreto que herdou
dos oito anos de primeira-dama, ela fica. Quem pega as máquinas das fãs e faz as fotos,
sempre, é sua fiel assessora,
Huma Abedin.
Morena linda, de trinta e
poucos anos, essa filha de indiano e paquistanesa é a assessora de viagens de Hillary. Ex-estagiária da Casa Branca, onde
começou em 1996, está na comitiva da senadora há anos, o
que dá margem para especulações sobre a verdadeira natureza da relação das duas, especialmente vindas da blogosfera
ultraconservadora -e mais raivosa crítica dos Clinton.
Mais meia hora, e Hillary sai.
No final, maquiagem dos olhos
borrada, Evonne Perfect passa
pelo "hall of fame" dos esportistas do ginásio, na entrada.
Há fotos de quarenta homens e
três mulheres -todas negras. A
luta vai ser dura.
(SD)
Texto Anterior: Americanas Próximo Texto: Guerras inspiram indicados ao Oscar de documentário Índice
|