São Paulo, sábado, 17 de maio de 2008

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Arquivo das Farc vira dilema na Colômbia

Linha-dura defende endurecimento com Chávez e Correa, mas a oposição vê ameaça a interesses nacionais na região

Fortalecido por informe da Interpol, Uribe não explicita sua estratégia; documentos de computador não têm valor legal, diz ex-ministro

FABIANO MAISONNAVE
DE CARACAS

Um dia depois de a Interpol autenticar os arquivos dos computadores do líder guerrilheiro Raúl Reyes, a Colômbia enfrenta o dilema sobre o que fazer com as indicações de estreitas relações entre as Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia) e os governos dos vizinhos Venezuela e Equador. As opiniões se dividem entre os que questionam a eficácia de endurecer com os presidentes Hugo Chávez e Rafael Correa e os que apóiam medidas diplomáticas e legais.
O presidente colombiano, Álvaro Uribe, ainda não esclareceu qual será a estratégia oficial de agora em diante, limitando-se a dizer, na cúpula de Lima, que o informe da Interpol (polícia internacional) é "contundente e transparente".
A mesma cautela foi adotada pelo procurador-geral da Colômbia, Mario Iguarán, encarregado de analisar os documentos atribuídos ao computador de Reyes. Ele disse que anunciará decisões logo e não descartou ações fora da Colômbia.
"Por mais que [o delito] se cometa no estrangeiro e por mais que seja cometido por estrangeiros, a lei colombiana pode investigar. E a Procuradoria está no processo investigativo com respeito a esses cidadãos venezuelanos, costarriquenhos e mexicanos" disse, em referência aos textos atribuídos a dirigentes das Farc que relatam suas ligações nesses três países.
Um dos principais defensores de uma saída política é o líder opositor liberal Rafael Pardo. "Uribe deve saber que o objetivo fundamental de todo esse tema dos computadores é que a Venezuela e o Equador rompam suas relações com as Farc, e não que Colômbia rompa relações com esses dois governos", disse ontem o ex-senador e ex-ministro da Defesa.
Em artigo anteontem, Pardo argumentou que o governo Uribe não deve se alinhar com o governo americano e que "o caminho de desprestígio de chefes de Estado" por meio da divulgação de documentos "autênticos, mas que não são provas judiciais" dificulta a eliminação dos espaços que as Farc têm hoje nos países vizinhos.
"A Colômbia, não o governo, e sim a nação, precisa de boas relações tanto com os EUA como com a Venezuela e o Equador. Os EUA, seu atual governo pelo menos, mantêm uma mútua hostilidade com o da Venezuela. Essa briga não podemos comprar, é deles, e não nossa."
Considerado uma das vozes mais radicais dentro do uribismo, o ex-ministro do Interior (Justiça) Fernando Londoño quer a divulgação de todos os documentos atribuídos aos computadores de Reyes e o acionamento de organismos internacionais contra a Venezuela, como o Tribunal Penal Internacional (TPI) e a ONU.
"O primeiro a fazer é publicar os documentos desses computadores, colocar à disposição de quem quiser investigá-los", disse à Folha, por telefone. "O mundo tem de tomar posição. Vejamos o que fazem a OEA, a ONU e a comunidade internacional quando virem a comprovação definitiva da aliança dos presidentes Chávez e Correa com os terroristas das Farc."
Londoño discordou da proposta de Pardo para uma abordagem mais comedida. "Fazer uma aliança com os amigos das Farc para combater as Farc? É uma insensatez."
As relações entre os dois países vivem uma crise intensa desde o final do ano passado, quando Uribe suspendeu a mediação de Chávez nas negociações com as Farc para liberar seqüestrados políticos.
O auge da crise foi no início de março, após a morte de Reyes em ataque da Colômbia em território equatoriano, seguida da divulgação por Uribe de documentos que sugerem colaboração militar entre Chávez e as Farc. A crise ganhou mais força anteontem. Em reação ao relatório da Interpol, Chávez anunciou a "revisão" das relações entre os dois países, que têm fortes laços. Estima-se, por exemplo, que 4 milhões de colombianos vivam na Venezuela, que é o segundo maior parceiro comercial da Colômbia, atrás dos EUA.


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