São Paulo, segunda-feira, 17 de maio de 2010

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Irã aceita acordo nuclear, afirma Amorim

Anúncio oficial deve ser feito hoje após encontro trilateral entre Lula, Ahmadinejad e primeiro-ministro da Turquia

Chanceler turco confirma acerto, que envolveria o envio de urânio iraniano à Turquia; EUA, que pregam sanções, não comentam

Ricardo Stuckert/Presidência da República
Lula e Ahmadinejad seguram quadro dado de presente pelo presidente iraniano ao colega brasileiro, celebrando amizade entre países, durante encontro em Teerã

MARCELO NINIO
SAMY ADGHIRNI

ENVIADOS ESPECIAIS A TEERÃ

Após quase 20 horas de negociação em Teerã, Brasil, Turquia e Irã finalizaram as bases de um acordo para romper o impasse em torno do programa nuclear iraniano.
O acordo deve ser anunciado hoje, quando os chefes de governo dos três países se reunirão na capital iraniana. O ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, confirmou à Folha que uma fórmula foi alcançada para implementar a proposta da AIEA (Agência Internacional de Energia Atômica), que tem o objetivo de garantir que o Irã não produza armas atômicas. Ao final de um dia de negociações intensas entre os três países, que obrigaram o chanceler brasileiro a faltar a dois compromissos da visita do presidente Lula ao Irã, Amorim não escondeu que um acordo estava costurado.
"Há pequenas diferenças de linguagem. A fórmula está razoavelmente pronta", disse o chanceler, que em seguida, chegou a receber os parabéns pelo sucesso da negociação do subsecretário-geral para Assuntos Políticos do Itamaraty, Roberto Jaguaribe.
A conclusão do acordo foi confirmada pelo chanceler turco, Ahmet Davutoglu. Questionado pela Folha, ele foi categórico. "Temos um acordo." O chanceler se referia a uma proposta negociada desde o ano passado pela AIEA para conciliar a preocupação das potências ocidentais acerca do programa nuclear iraniano com o direito, assegurado pela ONU, de o Irã enriquecer urânio para fins pacíficos.
O plano prevê que o Irã envie parte de seu estoque de urânio pouco enriquecido para outro país e receba em troca o combustível enriquecido a até 20%, nível adequado para uso médico, mas não para a bomba. Temendo não receber o urânio de volta, Teerã impôs condições: que a troca fosse simultânea e acontecesse em território iraniano. As potências rejeitaram as exigências e ergueram uma frente diplomática no Conselho de Segurança (CS) para impor uma quarta rodada de sanções da ONU ao Irã.
Brasil e Turquia uniram esforços no CS, onde ocupam vagas rotativas, para ressuscitar o plano da ONU.

Detalhes do acordo
A Folha obteve uma cópia do esboço de acordo trilateral que deve ser finalizado hoje em café da manhã entre Lula, Ahmadinejad e o premiê da Turquia, Recep Tayyip Erdogan, que embarcou às pressas para o Irã na noite de ontem depois de ser informado sobre o êxito das conversas.
Pelo texto, o Irã enviaria 1.200 quilos de seu urânio pouco enriquecido à Turquia. Em troca, EUA, Rússia e França se comprometeriam a entregar 120 quilos de combustível necessário para o reator de pesquisa de Teerã. O texto não deixa claro se essa troca seria simultânea, como Teerã queria, ou não.
Ontem, a Casa Branca confirmou à Folha ter recebido informações sobre o acordo, mas um porta-voz disse que seria preciso mais tempo para saber o que exatamente foi oferecido antes de fazer qualquer avaliação. Já o Departamento de Estado afirmou que só falaria sobre o assunto hoje. Antes da viagem, os EUA haviam demonstrado ver com ceticismo a possibilidade de que Lula conseguisse um acordo.
O Irã tampouco confirmou que o acordo estivesse fechado, mas, questionado sobre o tema, o chanceler iraniano Manoucher Mottaki, respondeu: "Algo bom está no forno".
O bom humor esbanjado na madrugada pelas autoridades envolvidas no acordo destoou da tensão que dominou o dia.
Lula saiu com ar preocupado das três reuniões que teve com Ahmadinejad -uma delas com a presença do líder supremo Ali Khamenei, detentor da palavra final sobre todos os assuntos iranianos.
Em seu único pronunciamento, durante encontro empresarial, o presidente brasileiro esteve cabisbaixo e evitou as improvisações frequentes em suas falas.
Amorim esteve ausente da maior parte da agenda. Ele esteve das 7h à meia noite em conversas com Said Jalili, principal negociador iraniano, e o chanceler turco.
Além da questão nuclear, Brasil e Irã assinaram diversos acordos de cooperação técnica e econômica. Um deles prevê a concessão de 1 bilhão em cinco anos em crédito da Caixa Econômica Federal para financiar importadores iranianos de produtos brasileiros.


Colaborou ANDREA MURTA, de Washington


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