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Eleitor de Khatami reclama de timidez nas reformas
DA REDAÇÃO
O ainda presidente do Irã, Mohammad Khatami, deixará um legado de certo relaxamento das
restrições às liberdades civis e de
alguma abertura da sociedade iraniana ao mundo, embora parte
significativa da população, sobretudo entre os jovens, considere os
avanços insuficientes e esteja decepcionada com seus dois mandatos como chefe de governo.
Khatami faz parte do grupo dos
chamados "reformistas moderados", cuja principal estratégia é
buscar uma gradual abertura política por meio de negociações
com o establishment religioso e linha-dura -comandado pelo aiatolá Ali Khamenei, o líder supremo do Irã e seu chefe de Estado.
Sua opção por uma solução negociada para os problemas sociopolíticos iranianos afastou o presidente de sua base de apoio,
constituída principalmente por
jovens que desejam mais liberdades. Por volta de 65% da população do país tem menos de 30 anos.
Para os milhões de iranianos
que comemoraram nas ruas suas
vitórias, em 1997 e em 2001, e a
conquista da maioria no Majlis
(Parlamento) pelos reformistas,
em 2000, a retórica conciliadora
de Khatami não é mais suficiente,
pois faltam mudanças concretas.
Prova disso foi a volta de uma
maioria conservadora ao Legislativo, em 2004, por conta da apatia
do eleitorado reformista.
O Irã vive, na prática, uma crise
institucional desde que Khatami
foi eleito presidente pela primeira
vez, segundo analistas consultados pela Folha. Afinal, de acordo
com a iraniana Shireen Hunter,
do Centro para Estudos Estratégicos e Internacionais, dos EUA, "a
linha dura bloqueia as iniciativas
do presidente desde então e bloqueou as do Majlis liderado pelos
reformistas de 2000 a 2004".
As sucessivas crises políticas
que marcaram os últimos oito
anos puseram Khatami numa situação delicada, pois boa parte de
sua base de apoio popular não
mais crê que ele tenha coragem
para enfrentar os conservadores.
"O presidente perdeu credibilidade aos olhos da população.
Muita gente já diz que tudo o que
ele queria era permanecer no poder. Ele não tinha muita margem
de manobra, contudo poderia ter
impedido a realização da eleição
legislativa de 2004, o que teria gerado uma crise constitucional.
Mas preferiu só criticar a linha
dura e autorizar seu partido a participar do pleito", apontou Olivier
Roy, diretor do Laboratório Mundo Iraniano do Centro Nacional
de Pesquisa Científica, da França.
"Não se pode afirmar que ele
não tenha feito nada. Porém seu
histórico poderia ser mais rico em
conquistas ou em negociações
com os clérigos", avaliou Hunter.
Em tese, ante a inflexibilidade
do establishment religioso, os reformistas poderiam exortar a população a sublevar-se contra o regime islâmico. Como ressaltou
Roy, entretanto, "os reformistas
iranianos não são revolucionários". E, se os chamados "conservadores pragmáticos" inserirem
certas reformas liberalizantes na
pauta do Legislativo, o eleitorado
poderá aceitar uma mudança gradual do sistema político.
Categorias de conservadores
Para Roy, há duas categorias de
conservadores: "Os dogmáticos,
como Khamenei, que não suportam a oposição por princípio, e os
pragmáticos, como o ex-presidente Hashemi Rafsanjani [favorito para vencer o pleito presidencial, segundo consultas populares], que crêem que a reforma do
regime seja necessária, mas querem introduzi-la à sua maneira".
Assim, embora imagens da cantora americana Britney Spears ou
do futebolista britânico David
Beckham sejam hoje comuns nas
grandes cidades iranianas graças
a seus oito anos no poder, Khatami deverá, segundo analistas, entrar para a história como um político que perdeu a chance de introduzir mudanças concretas no Irã.
Ou, então, quem tem razão é
Saeid Zahed, professor da Universidade de Shiraz (Irã), para quem
Khatami nunca foi um verdadeiro
reformista. "Não creio que ele faça parte dos "radicais da segunda
corrente política'", disse. Só o
tempo e a historiografia revelarão
a verdade no futuro.
(MSM)
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