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Morales e opositores assinam acordo
Governo cede e promete negociar reivindicações de governadores, que abrem mão de pedir libertação de aliado preso ontem
Documento promete adiar referendo sobre nova Carta e reconhecer autonomia das regiões; oposição ameaçava deixar diálogo após prisão
FLÁVIA MARREIRO
ENVIADA ESPECIAL A LA PAZ
O governo do presidente esquerdista Evo Morales e os cinco governadores da oposição de
direita anunciaram ontem à
noite a assinatura de um pré-acordo que pode abrir caminho
para o fim negociado de um
embate que se arrasta desde
que Morales e os líderes regionais foram eleitos, em 2005.
A crise chegou ao ápice nas
últimas três semanas, quando
bloqueios e ocupações promovidos pelos oposicionistas causaram ao menos 15 mortes e
perdas milionárias à Bolívia.
Com a presença do cardeal
Julio Terrazas, o governador de
Tarija, Mario Cossío, representante do Conalde (Conselho
Nacional Democrático, que
reúne os cinco governadores),
informou que três mesas de
diálogo serão formadas na
quinta-feira, no departamento
central de Cochabamba.
O encontro, reza o documento, contará com a presença de
"facilitadores" e "testemunhas". A Unasul (União de Nações Sul-Americanas), a Igreja
Católica, a União Européia e a
ONU são citadas. Na véspera, a
Unasul decidira formar uma
comissão para apoiar o diálogo.
O documento
A base das negociações na
Bolívia será o documento negociado por Cossío e o vice-presidente, Álvaro García Linera,
em três longas reuniões realizadas desde sábado.
Nele, o governo Morales cede
a vários pontos das reivindicações dos dirigentes dos departamentos de Santa Cruz, o mais
rico do país e bastião opositor,
Tarija, o pólo gasífero, e dos
mais pobres Pando e Beni, além
do neoopositor Chuquisaca.
São eles: 1) o governo aceitou
devolver às regiões a parcela do
IDH (imposto sobre o gás) que
havia redirecionado para pagar
pensão a idosos, e compromete-se a não mexer nas porcentagens de royalties das regiões;
2) reconhece as autonomias
administrativas de Santa Cruz,
Pando, Beni e Tarija.
Em troca, a oposição se compromete a desocupar todos os
prédios públicos ocupados nas
últimas três semanas e aceita
ter como base da discussão o
texto constitucional aprovado
por constituintes governistas
no final de 2007, que contém
temas delicados como reforma
agrária e autonomia indígena.
La Paz aceitou, porém, suspender por um mês, prorrogável, a convocação dos referendos para promulgar a nova Carta, inicialmente marcados para
dezembro, e tirar do ar as propagandas para promovê-la.
Dia tenso
O desenlace positivo veio ao
fim de um dia de tensão, que começou quando a oposição suspendeu as negociações em solidariedade ao governador de
Pando, Leopoldo Fernández,
detido por desacato ao estado
de sítio em seu departamento.
Pando, no norte boliviano, foi
posto sob estado de sítio na sexta-feira, um dia depois do massacre de 15 camponeses partidários de Morales. O governo
acusa Fernández de envolvimento no episódio.
Antes do anúncio do acordo,
o governador tarijenho chegara
a declarar o diálogo "agonizante, mas não morto". O vice García Linera convocou então entrevista para rebater os oposicionistas. Acusou-os de usar a
prisão do governador pandino
como pretexto para não assinar
um documento já pronto.
"Massacre, mortes, não não
negociados politicamente, são
punidos", disse Linera.
A decisão dependia, então, do
tamanho do compromisso dos
oposicionistas com Fernández.
Segundo o senador por Tarija
Roberto Ruiz, do Podemos (direita), que participou das reuniões do diálogo, o veredicto
veio depois que os governadores falaram com o detido.
"Avaliamos que era melhor
ele se defender num contexto
de diálogo, com a presença dos
países amigos, do que num clima de nova confrontação", disse à Folha. Mais cedo, a expectativa do Conalde era a de que o
anúncio da Unasul, um dia antes, de que formaria uma comissão para investigar o massacre em Pando congelaria a
prisão de Fernández.
Cossío pediu ainda publicamente o fim dos bloqueios rodoviários na zona gasífera do
Chaco, grande parte dela em
Tarija, os únicos mantidos pelos oposicionistas ontem, após
23 dias. Os líderes dos protestos da região de Villamontes e
Yacuíba, cidades próximas aos
megacampos de gás operados
pela Petrobras no Chaco, atenderam o apelo do governador.
Antes do acordo, os movimentos sociais que apóiam o
governo ameaçavam radicalizar o cerco e bloqueios contra a
cidade de Santa Cruz. À noite,
prometeram suspendê-los.
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