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Crise Israel-EUA pode ser "mágica", diz Lula
Na Cisjordânia, presidente afirma que divergência entre aliados devido a assentamentos pode ser o que faltava para impulsionar paz
Brasileiro volta a criticar colônias judaicas em áreas reivindicadas por palestinos, mas diz deixar região mais otimista do que na chegada
Mohamad Torokman/Reuters
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O presidente Luiz Inácio Lula da Silva é apoiado pelo líder a Autoridade Nacional Palestina, Mahmoud Abbas, com quem se reuniu ontem em Ramallah (Cisjordânia)
CLÓVIS ROSSI
ENVIADO ESPECIAL A RAMALLAH
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva vê na crise entre Israel e os EUA, o principal respaldo internacional do Estado
judaico, uma divergência "que
parecia impossível de ocorrer",
mas que "quem sabe", seja a
"coisa mágica que faltava para
chegar ao acordo [de paz] entre
israelenses e palestinos".
Pode parecer uma adaptação
do lugar comum segundo o qual
toda crise é também uma oportunidade. Mas a frase, pronunciada em entrevista coletiva
concedida ontem em Ramallah, a capital provisória dos palestinos, reflete uma análise
geopolítica mais abrangente da
diplomacia brasileira.
Análise que tem como eixo
central o crescente avanço do
Irã no Oriente Médio. Hoje, o
país tem penetração no Líbano,
por intermédio do Hizbollah,
misto de movimento político,
social e militar, e na faixa de
Gaza, usando o Hamas.
É eloquente que o presidente
palestino, Mahmoud Abbas, ao
lado do qual Lula falou aos jornalistas, tenha dito há uma semana que o Hamas "deveria livrar-se da tutela iraniana". É
uma raríssima coincidência de
ponto de vista entre um líder
palestino e um israelense, no
caso o presidente Shimon Peres, que disse ao jornal espanhol "El País", no domingo:
"Gaza está sob domínio do
Irã. É um organismo iraniano.
Eles é que põem o dinheiro".
Na análise da diplomacia
brasileira, o avanço iraniano é
alimentado pelo conflito israelo-palestino. Não é uma opinião isolada: no jornal "Haaretz" de ontem, o colunista Eidad Yaniv escreveu que "é bom
para eles [os radicais palestinos
e o Irã] que Israel esteja se tornando uma versão atualizada
de um Estado de apartheid".
Chega-se, assim, à "coisa mágica" desejada por Lula: só a
pressão americana seria de fato
capaz de forçar Israel a fazer as
concessões indispensáveis para
a criação de um Estado palestino "viável", o que tiraria do Irã
a arma principal para conquistar adeptos no Oriente Médio.
Se a análise estiver correta,
vem a pergunta seguinte inevitável: os EUA exercerão pressão suficiente para convencer o
governo Binyamin Netanyahu?
Claro que não há uma resposta
científica, mas Reuven Rivlin,
presidente da Knesset, o Parlamento de Israel, e do mesmo
partido de Netanyahu, disse
ontem ao "Haaretz": "Se não
fosse presidente da Knesset, diria que os americanos não derramarão uma lágrima se Netanyahu e seu governo caírem".
Enquanto não acontece a
"coisa mágica", Lula cravou ante as autoridades palestinas demandas que não foram apresentadas a Israel, ao menos não
de público, e que, claro, soaram
como música:
1 - "O muro da separação deve vir abaixo. O mundo não suporta mais muros". É uma alusão ao muro de 350 quilômetros que Israel está construindo para separar seu território
das áreas palestinas. As chances de que Israel concorde tendem a zero;
2 - "A ampliação dos assentamentos também deve parar sob
pena de apagar definitivamente a chama da esperança". A frase é bonita, mas passa por cima
do fato de que, na presença do
próprio Lula, Netanyahu dissera, na segunda, que Israel não
pretende parar as construções
em Jerusalém Oriental.
Lula reconhece que é difícil a
tarefa de negociar a paz, mas
afirmou que seu governo "está
mais disposto do que nunca" a
ajudar nas negociações.
Tão disposto que aceita conversar até com o Hamas, considerado organização terrorista
pelos EUA e pela União Europeia e em choque aberto com
Abbas, o anfitrião de Lula.
"Converso com quem quer
que tenha importância na mesa
de negociação e faça o processo
andar. Não existe força política,
de direita ou de esquerda, com
quem o Brasil não tenha disposição de conversar."
Para materializar qualquer
conversa com o Hamas, no entanto, há um problema: Lula
pede que "o povo palestino seja
coeso e fale com uma só voz",
ao mesmo tempo em que cobra
que essa voz seja "de equilíbrio
e moderação e respeite os direitos de Israel".
Não é uma descrição que se
aplique usualmente ao Hamas,
mas, ainda assim, Lula encerrou sua visita a Ramallah com a
afirmação de que saía mais otimista do que chegara. Ainda
ontem, ele viajou à Jordânia,
escala final de sua turnê pela
região, onde foi recebido pelo
rei Abdullah 2º.
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