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COMPORTAMENTO
Pesquisador britânico adverte que correio eletrônico não deve substituir o face a face no ambiente de trabalho
E-mail de chefe faz mal à saúde, diz estudo
OTÁVIO DIAS
DA REDAÇÃO
O uso inadequado de e-mails no
trabalho pode ser uma fonte adicional de estresse para os funcionários, prejudicar as relações entre colegas ou entre o chefe e seus
subordinados e comprometer o
trabalho em grupo, fundamental
dentro de uma empresa.
As ponderações acima têm sido,
cada vez mais, motivo de debate e,
recentemente, têm motivado pesquisas em universidades e experimentos em companhias privadas
ou públicas. No Reino Unido, recentemente foi feito um estudo,
ainda não conclusivo, sobre os
efeitos que e-mails podem ter na
saúde de funcionários.
Especialistas da Buckinghamshire Chilterns University College,
situada a oeste de Londres, colocaram monitores para medir a
pressão arterial de voluntários antes de eles abrirem suas caixas de
correio no trabalho.
Identificaram uma elevação da
pressão arterial quando os funcionários recebiam e-mails de
seus superiores, especialmente
quando a mensagem estava escrita num tom de crítica ou de cobrança.
"E-mails nunca devem ser usados para criticar a atitude profissional de um funcionário, fazer
cobranças e dar ordens ou transmitir más notícias", diz Cary Cooper, professor de saúde e psicologia organizacional da Escola de
Administração da Universidade
Lancaster (Reino Unido).
O estudo acima citado, realizado com 48 voluntários, foi apresentado na conferência anual da
Sociedade Psicológica Britânica,
no início deste ano. "Observamos
uma elevação da pressão mais
acentuada entre aqueles que receberam um e-mail ao mesmo tempo ameaçador e de um colega de
nível mais elevado", diz Howard
Taylor, um dos coordenadores da
pesquisa.
"Você nunca deve contratar ou
despedir alguém por e-mail, ou
mesmo escolher esse meio para
punir", afirma o professor Cooper. "Chefes fazem isso porque
não têm coragem de dar notícias
desagradáveis olho no olho."
Cooper é autor de diversos livros sobre saúde e psicologia no
trabalho, entre eles "Shut Up and
Listen!: The Truth About How to
Communicate at Work" (cale a
boca e ouça: a verdade sobre como se comunicar no trabalho),
publicado em 2004 pela editora
Kogan Page, no qual há um capítulo sobre como usar o recurso do
correio eletrônico.
Segundo Cooper, se colocássemos na balança os benefícios e os
malefícios provocados pelo uso
de e-mails no trabalho, o resultado, neste momento, seria equilibrado.
"Quando o e-mail surgiu, diria
que era 70% a favor, 30% contra.
Mas, agora, devido ao abuso, acho
que é 50% a 50%", disse.
Uso inadequado
São vários os exemplos de uso
inadequado de e-mails no trabalho, segundo especialistas e profissionais ouvidos pela Folha.
O primeiro deles é a dificuldade
de priorizar diante da grande
quantidade de mensagens recebidas, muitas delas inúteis ou pouco
importantes.
O funcionário precisa desenvolver a capacidade de identificar as
realmente importantes e dar preferência a elas.
"Quando recebíamos cartas pelo correio, era mais fácil priorizá-las por ordem de importância.
Atualmente, somos compelidos a
ler e responder tudo -ou quase
tudo- que recebemos, sem avaliar adequadamente sua importância. Perdemos muito tempo
com isso", afirma Cooper.
"A quantidade de e-mails que
uma pessoa recebe no início de
cada dia ou durante um período
de férias virou símbolo de status,
como se fosse um indício de como
ela é importante", diz.
O segundo erro é incluir na lista
de destinatários pessoas que não
precisam necessariamente receber a mensagem. Além de contribuir para a overdose de e-mails
recebidos a cada dia, essa prática,
muitas vezes, revela uma tentativa
de se livrar de responsabilidades.
"Às vezes, um funcionário encaminha um e-mail para diversos
colegas com a intenção de dividir
a responsabilidade. É como se
pensasse: "Fiz minha parte, se o
outro não fez, não é culpa minha'", afirma Patricia Molino, diretora de assessoria e gestão de recursos humanos da multinacional KPMG no Brasil.
Segundo Molino, é preciso selecionar cuidadosamente para
quem enviar um e-mail. E não se
devem mandar mensagens para
destinatários ocultos (cujos endereços eletrônicos não apareçam
claramente no cabeçalho), pois isso pode prejudicar a confiança
entre colegas de trabalho. "Enviar
um e-mail para uma terceira pessoa sem que o destinatário principal saiba não é ético", diz.
Um terceiro erro muito comum
é privilegiar as mensagens eletrônicas em detrimento dos contatos
pessoais com colegas que trabalham perto, às vezes a apenas algumas mesas de distância.
"Isso empobrece as relações entre colegas e nos torna mais sedentários ainda", diz o consultor
Simon Franco, da Simon Franco
Recursos Humanos, umas das
empresas da área mais tradicionais do país.
O professor Cooper lembra que
um dos motivos para as pessoas
irem ao escritório é justamente a
necessidade de socializar e de trabalhar em grupo.
"Não é bom enviar e-mails para
pessoas que estão perto de você.
Por que não falar com elas pessoalmente? O contato direto ajuda a construir as relações pessoais, melhora o trabalho em grupo e estimula a criatividade ", diz.
Algumas organizações públicas
e privadas britânicas têm realizado experiências para combater
esse fenômeno como, por exemplo, o estabelecimento de "dias livres de e-mails" entre funcionários (leia texto nesta página).
As mensagens eletrônicas
-por serem muito rápidas e parecerem "descartáveis"- também podem ser fonte de mal-entendidos.
É comum, por exemplo, alguém
ler um e-mail rapidamente ou de
forma até incompleta, tirar conclusões equivocadas e responder
apressadamente, às vezes num
tom inadequado, dando início a
uma cadeia de desentendimentos.
"Já presenciei brigas incríveis
em grupos de discussão", diz Rosa Maria Farah, do Núcleo de Pesquisa da Psicologia em Informática da PUC (Pontifícia Universidade Católica), em São Paulo. "As
pessoas não estavam se entendendo e continuavam reagindo impulsivamente."
O antídoto para isso é "dar um
tempo antes de responder", afirma Patricia Molino. "Não há obrigação de responder imediatamente nem mesmo num prazo de
24 horas. Você pode se dar um
prazo maior para responder de
forma adequada", afirma.
"A rapidez na comunicação facilita a ambigüidade das mensagens", alerta Franco. Para Cooper,
a melhor coisa que uma pessoa
pode fazer ao receber um e-mail
que, por algum motivo, considera
desagradável é ligar para o colega
de trabalho ou procurá-lo para
conversar pessoalmente.
"Às vezes, você acha que alguém está fazendo uma crítica
quando não está. Um telefonema
ou um bate-papo pode solucionar
mal-entendidos antes que seja
tarde", diz.
Também é importante refletir
sobre a forma e a linguagem utilizadas. Embora e-mails sejam naturalmente mais informais do que
outras ferramentas de comunicação, eles devem ser claros, concisos, bem escritos e educados.
"Informalidade não significa escrever com displicência", diz Farah. "Nos e-mails, a correção no
emprego da língua muitas vezes
vai para o brejo", afirma Franco.
Critério
Segundo os entrevistados, também é importante definir "para o
que o e-mail é bom e para o que
não é bom".
"O e-mail é bom para manter
contato com os colegas ou com
clientes, para fazer circular informações que possam ser úteis ao
trabalho das pessoas e para acompanhar o progresso de um determinado trabalho", diz Cooper.
"Mas não é bom para buscar soluções criativas, dar ordens, definir diretrizes e analisar ou criticar
a atuação de alguém", afirma.
Segundo Cooper, a substituição
das relações individuais pelo excesso de comunicação eletrônica
tem como conseqüência o desenvolvimento de uma "baixa moral"
no trabalho.
"As pessoas passam a se sentir
apenas uma peça dentro da empresa, tão desimportantes que
nem merecem um tratamento face a face", diz.
"O e-mail é um brinquedo relativamente novo. Ainda estamos
aprendendo a fazer bom uso dele", diz Farah.
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