São Paulo, quarta-feira, 18 de julho de 2001

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IMPRENSA

Katharine Graham, que comandou diário durante caso Watergate, tornou-se exemplo de independência jornalística

Morre dona e executiva veterana do "Washington Post"

MARCIO AITH
DE WASHINGTON

Katharine Graham, dona e executiva veterana do "The Washington Post", que comandou o diário durante o escândalo de Watergate e transformou a empresa que publica o jornal num poderoso grupo financeiro, morreu ontem aos 84 anos.
Ela estava em estado grave desde sábado, quando bateu a cabeça ao cair durante uma caminhada em Sun Valley, em Idaho, onde participava de uma conferência de negócios.
Katharine Graham é considerada uma das lendas e símbolo de independência editorial do jornalismo norte-americano. Foi levada à direção do grupo que edita o "Washington Post" em 1963, depois do suicídio de seu marido, Philip Graham, e presidiu o conselho executivo do jornal de 1973 a 1993, quando passou o comando para o filho Donald Graham. O jornal pertence a sua família desde 1933, quando seu pai, Eugene Meyer, comprou-o de uma empresa que estava em falência.
Em 1971, ela autorizou Benjamin Bradley, editor do "Post", a publicar um relatório militar secreto sobre o envolvimento dos EUA na Guerra do Vietnã, conhecido como "Documentos do Pentágono". A Casa Branca queria suspender a publicação sob o argumento de que ela traria danos irreparáveis à capacidade de o Estado proteger-se de ameaças externas.
A decisão de Graham deu início a uma batalha judicial que acabou sendo ganha pelo "Post" na Suprema Corte, em Washington, numa decisão judicial que colocou a liberdade de imprensa e o direito à informação acima de apelos oficiais relacionados com a segurança nacional.

Watergate
Entre 1973 e 1974, durante o escândalo de Watergate, mesmo sob pressões e ameaças da Casa Branca, Graham deu o sinal verde e a sustentação corporativa necessária para que a equipe do "Post" avançasse a investigação que levou o presidente Richard Nixon à renúncia.
Quando completou 80 anos, Graham ganhou um prêmio Pulitzer por sua autobiografia "Uma História Pessoal" (publicada no Brasil pela editora DBA), na qual descreveu a si própria como uma mulher insegura e solitária que, embora educada nas melhores escolas, não havia sido criada para assumir a direção do jornal.
Segundo relato de Graham, ao justificar a transferência do comando do jornal ao genro, descartando a hipótese de passar o cargo a ela, seu pai teria dito: "Nenhum homem deve ser colocado na situação de trabalhar para sua própria mulher".
Em 1963, quando assumiu a direção do "Post", Graham tinha pouca experiência em jornalismo (havia trabalhado como repórter na Califórnia, cobrindo relações sindicais) e nunca havia administrado uma empresa.
"Eu tinha medo de fazer perguntas idiotas e, na primeira festa de Natal da companhia depois de assumir o comando, passei um bom tempo no espelho ensaiando a frase "Feliz Natal'", disse ela numa entrevista em 1998. "Minha estratégia foi contratar as pessoas certas e defender o interesse dos nossos leitores, não os interesses privados."

Referência
À frente do "Post", Graham expandiu o grupo, que também publica a revista "Newsweek", para o setor de TV e colocou ações da companhia à venda na Bolsa de Nova York, transformando-se também numa referência feminina no mundo dos negócios.
Foi a primeira mulher a comandar uma empresa incluída na lista das 500 principais companhias da revista "Fortune" e a primeira a sentar-se à mesa da Associação de Editores de Jornais Americanos.
Até sua morte, Graham foi personagem ativa na vida social de Washington, cidade sobre a qual publicaria um livro em breve. Em janeiro, promoveu um jantar para apresentar o presidente George W. Bush a personalidades importantes da capital norte-americana. Já hospedou em sua casa os ex-presidentes Ronald Reagan e Bill Clinton.
"Presidentes vão e vêm, e Katharine Graham conheceu todos", disse ontem Bush por meio de uma nota. "Ela transformou-se numa lenda ainda em vida."
Apesar dos conflitos do "Post" com o Partido Republicano na primeira metade da década de 70 e de sua amizade íntima com a família do presidente democrata John Kennedy, Graham manteve uma relação de amizade com Henry Kissinger, que foi secretário de Estado de Nixon, e com a família Reagan. "Apesar de termos nos encontrado várias vezes em campos opostos, sempre fomos amigos, e ela nunca usou a relação para me fazer qualquer pedido", disse Kissinger.
Bradley, editor do "Post" durante o escândalo de Watergate, disse ontem que, com sua objetividade e simplicidade, Katharine Graham ajudou a moldar o jornalismo norte-americano.
"Ela assumiu o jornal depois de um episódio trágico [o suicídio de seu marido" e sob a sombra dos homens da família [do marido e do pai". Fez um trabalho extraordinário."
Até sua morte, Katharine Graham ocupava o cargo de presidente do conselho da companhia que controla o grupo -a Washington Post Co.



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