São Paulo, terça-feira, 18 de julho de 2006

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Policiais não serão julgados por morte de Jean Charles

Sang Tan/Associated Press
Familiares de Jean Charles dão entrevista coletiva em Londres


Procuradoria-Geral do Reino Unido alega que as evidências são "insuficientes"

Caso venha a ser condenada como instituição, a Polícia Metropolitana de Londres pode receber apenas uma multa; família fica revoltada

MARCO AURÉLIO CANÔNICO
DE LONDRES

Quase um ano após o assassinato do eletricista brasileiro Jean Charles de Menezes em Londres, o Serviço de Procuradoria da Coroa (Procuradoria-Geral britânica, CPS, na sigla em inglês) anunciou ontem que os policiais que o mataram não serão processados. O procurador Stephen O'Doherty alegou que não há evidências suficientes para responsabilizar os oficiais que atiraram.
O CPS decidiu processar apenas a polícia britânica como instituição, por descumprimento da lei de saúde e segurança -segundo a qual a polícia deve zelar pelo bem-estar de terceiros durante suas ações.
Avisada da decisão às 11h, a família do brasileiro se revoltou. "É inacreditável, esperamos um ano para receber uma decisão vergonhosa dessas", disse Alex Pereira, primo de Jean Charles que mora em Londres.
"Já esperava uma resposta negativa da Procuradoria, mas fiquei muito decepcionada com o que foi feito. Eles estão tratando meu primo como um animal morto, usaram uma brecha legal para não responsabilizar ninguém", disse Patrícia Armani, prima que morava com Jean Charles.
Uma missão brasileira comandada pelo embaixador Manoel Gomes Pereira foi enviada para acompanhar a decisão e se declarou surpresa.
"O governo brasileiro não esperava esse resultado. Lamentamos muito a decisão, mas não podemos fazer uma avaliação mais precisa agora porque a Procuradoria utilizou uma lei da qual não tínhamos conhecimento", disse Gomes Pereira.

Evidências
Jean Charles foi assassinado no dia 22 de julho do ano passado, após a polícia tê-lo confundido com um terrorista. Ele foi seguido de casa até a estação de metrô de Stockwell e morto por dois policiais com sete tiros na cabeça e um no ombro.
A partir do relatório produzido pela Comissão Independente de Queixas contra a Polícia (IPCC, na sigla em inglês), o procurador O'Doherty analisou quatro possíveis crimes cometidos pela polícia: homicídio culposo e doloso, falsificação de evidências e descumprimento da lei de saúde e segurança.
"As evidências mostram que os dois policiais que atiraram realmente acreditavam que Menezes era um homem-bomba e, portanto, a Procuradoria não pode processá-los por homicídio ou qualquer crime relacionado", disse O'Doherty.
A advogada da família de Jean Charles, Harriet Wistrich, afirmou que pretende recorrer da decisão. "Com as explicações que recebemos hoje, não consideramos que a decisão seja razoável. Ainda temos que considerar se ela pode ser contestada, mas certamente precisamos de mais explicações sobre como se chegou a ela", disse. "Ficamos decepcionados porque ninguém foi responsabilizado pelo assassinato."
A família de Jean Charles também apontou discrepâncias entre as evidências citadas pela Procuradoria e as informações que receberam do IPCC.
"O procurador disse que meu primo estava com as mãos no bolso quando foi abordado, e os policiais pensaram que ele poderia detonar uma bomba. Mas o IPCC já nos tinha dito que ele segurava um jornal com as duas mãos", disse Pereira.
Apesar de seus oficiais terem sido isentos de culpa e de seu processo se resumir ao desrespeito à lei de saúde e segurança -o que pode render apenas uma multa- a Polícia Metropolitana também reclamou.
"Ficamos desapontados com a decisão da Procuradoria de processar a Polícia Metropolitana. Os policiais envolvidos em ações antiterrorismo operam em um dos ambientes mais desafiadores e merecem todo o nosso apoio", declarou o órgão em um comunicado.


Texto Anterior: Iraque sob tutela: Ataque mata 50 civis e causa protesto contra militares
Próximo Texto: O caso Jean Charles
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.