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MINHA HISTÓRIA ANTONIO VILLARREAL ACOSTA, 59
Sozinho e sem luz
(...)Um dia entraram na minha casa e me levaram (...) Não bebo nem rum, e agora faço tratamento psiquiátrico. Surtei (...) Cuba não vai mudar
RESUMO
Um dos sete
presos políticos cubanos
libertos e enviados à Espanha nesta semana, o economista e professor universitário Antonio Villarreal Acosta, 59, tem estado
de saúde delicado. Preso
em 2003, passou um ano e
meio na solitária, período
em que começou a sofrer
transtornos psiquiátricos.
Quando soube que seria
solto, ficou tão emocionado que por quatro dias não
se levantou da cama.
LUISA BELCHIOR
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA,
DE MADRI
Antes de qualquer atividade, sempre começávamos
com uma canção que diz:
"América imortal, fonte de
luz, farol de liberdade. Suas
fronteiras são traços de
amor, de glória sem igual.
Sempre serás a salvação,
América imortal!".
Essa era nossa apresentação na Frente Democrática
Independente (FDI), a organização que eu presidia, com
mais de 2.000 membros. Todos clandestinos. Isso antes
de ir preso. Me prenderam
sem dizer nada e me separaram da minha mulher [Silvia
Aguada Alfonso, 45] e da minha filha [Diana Villarreal,
13]. Enlouqueci, pode ver o
atestado médico [do Hospital
Nacional de Presidiários de
Cuba com um diagnóstico de
"transtornos psicológicos",
como depressão e ansiedade,
"com alto risco suicida"].
Na FDI, nós atendíamos as
crianças [filhos de presos políticos], dávamos assistência.
Não aceitávamos membros
que não fossem casados, porque acreditamos muito em
Deus, não importa como o
chamem. Quando alguém
[preso] adoecia, buscávamos
os medicamentos. Quando
alguém fazia aniversário, sobretudo as Damas [de Branco, grupo de mulheres familiares dos dissidentes], comprávamos flores e as levávamos para passear no parque.
E a nossa aspiração era a
aprovação [por Cuba] dos 30
artigos que a Declaração Universal dos Direitos Humanos
aprovou em 30 de dezembro
de 1948, em Genebra, Suíça.
Minha mãe dizia que se eu
tivesse seguido a carreira
eclesiástica, teria chegado a
bispo ou arcebispo, e meu
pai, que poderia chegar a coronel ou a general. Mas eu escolhi ser defensor dos direitos humanos. Como slogan,
tenho o de que, quando minhas feridas estiverem cicatrizadas, alguém pagará por
ter me ferido. Sim, porque
pode-se esquecer com quem
se riu, mas é muito difícil esquecer com quem se chorou.
PRIVAÇÃO
Um dia [23 de abril de
2003], vários carros com muitas pessoas pararam na porta
de casa. Não me deram nenhuma explicação e me levaram. No Departamento de Segurança do Estado, queriam
que eu reconhecesse que havia potências como os EUA
por trás do meu trabalho, o
que não era verdade. Por isso
me condenaram a 15 anos de
privação de liberdade.
Me puseram numa cela de
castigo, uma cela solitária e
sem nenhuma iluminação.
Sem luz, e eu sozinho. Era
um breu. Passei um ano e
meio lá. Chamava-se assim:
Regime Especial Boniatico,
em Santiago de Cuba. As visitas eram a cada três meses,
por duas horas. Depois, me
levaram para um presídio em
Santa Clara. Não sei o porquê, nunca me explicaram
nada. Aí era o contrário: era
muita gente, muitos bandidos. Passei cinco anos lá.
NEM RUM
Antes de entrar na prisão,
não tomava nem aspirina.
Não bebo nada de álcool.
Nem rum. E, agora, faço tratamento psiquiátrico. Acho
que fiquei assim pela agonia
de estar longe da família e rodeado de pessoas que cometeram vários delitos. Eu surtei, e até hoje tomo muitos
medicamentos.
Mas comecei a ficar mal
em Santiago, acho que por
estar sozinho o dia todo e
sem luz. Tive muitas crises, e
várias vezes fui transferido
para o sanatório. Lá era um
lugar mais digno, mais humano. Eu podia tomar banho
todos os dias, usar pijama,
ver TV, tinha cama individual. Ficava lá duas, três semanas e me mandavam de
volta, o que era terrível. Voltava para a realidade.
ENAMORADO
O pessoal da igreja já tinha
me comunicado da possibilidade de vir à Espanha. Fiquei
tão emocionado que passei
quatro dias sem sair da cama.
No caminho para o aeroporto, nos deixaram separados,
não via ninguém. Quando
entrei no avião, vi minha mulher e me senti enamorado
dela. E da minha filha.
Aqui em Madri está bem,
mas é tudo muito diferente. E
não temos nada certo, não
sabemos de nada. Vou tentar
continuar a luta daqui. Sei
que é difícil, mas já estou em
contato com organizações
aqui da Espanha. E seguirei.
Não acho que vai haver nenhuma mudança em Cuba.
Isso [a libertação] foi só por
uma pressão internacional.
Cuba não vai mudar.
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