São Paulo, quarta-feira, 18 de agosto de 2004

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VENEZUELA

Washington demora um dia para reconhecer o triunfo chavista no plebiscito; Carter anuncia auditoria, mas nega fraude

Com atraso, EUA admitem vitória de Chávez

DE WASHINGTON
DO ENVIADO ESPECIAL A CARACAS

Com um dia de atraso, o governo americano reconheceu ontem a vitória do presidente venezuelano, Hugo Chávez, desafeto declarado de Washington, no plebiscito de domingo passado.
Adam Ereli, porta-voz do Departamento de Estado, disse que os resultados do plebiscito, convocado pela oposição para abreviar o mandato do presidente, "mostram que Chávez recebeu o apoio da maioria dos votantes".
"Vamos nos unir ao Grupo de Amigos da Venezuela no reconhecimento dos resultados preliminares", disse Ereli.
Na segunda-feira, os EUA foram o único país do Grupo de Amigos da Venezuela -formado também por Brasil, Chile, Espanha, México e Portugal- a não reconhecer a vitória de Chávez, mesmo depois que a OEA (Organização dos Estados Americanos) e o Centro Carter respaldaram os resultados do plebiscito.
Os EUA preferiram uma posição dúbia, afirmando que apoiavam a checagem dos votos pedida pela oposição. Ontem, apesar do reconhecimento da vitória, Ereli voltou a tocar no mesmo ponto.
"Ainda há uma preocupação em relação a algumas questões relacionadas à votação e pedimos aos observadores internacionais que ajudem a realizar uma auditoria transparente sobre o assunto, como parte de um processo de reconciliação nacional", disse.
O ex-presidente americano Jimmy Carter (1977-1981), um dos principais observadores da votação, anunciou a realização da auditoria, mas disse que as acusações de fraude "não têm mérito"..
O porta-voz do Departamento de Estado afirmou que "o povo e o governo venezuelanos devem agora decidir os passos a seguir".
A relação entre Chávez e EUA é conturbada. Quando o presidente foi derrubado por um golpe em abril de 2002, Washington limitou-se a dizer que esperava a "normalização" da Venezuela, enquanto outros países condenavam o levante.
Ao voltar ao poder, Chávez, cuja proximidade com o ditador cubano, Fidel Castro, sempre irritou Washington, acusou a Casa Branca de ter urdido o golpe, o que os americanos negam.
Mas os EUA financiaram grupos opositores do regime chavista. Segundo documentos obtidos pela Folha no início do ano, os EUA transferiram nos dois últimos anos mais de US$ 1 milhão a esses grupos.

Recontagem
Isolada dentro e fora do país, a oposição abriu uma possibilidade para admitir a derrota no último domingo: a recontagem manual dos votos do plebiscito.
"Estamos simplesmente pedindo a recontagem dos votos simples, porque temos dúvidas da lisura desse processo. Se Chávez ganhar nessa contagem, aceitaremos o resultado", disse à Folha o deputado Julio Borges, um dos principais líderes da oposição.
Anteontem, após analisar as denúncias da oposição, o Centro Carter e a OEA (Organização dos Estados Americanos) disseram que não há indícios de fraude e ratificaram a vitória de Chávez, que agora tem o mandato garantido até janeiro de 2007.
Ontem, o mais importante grupo de defesa de direitos humanos da Venezuela, o Provea, pediu que a oposição reconhecesse a derrota, mas solicitou que o Conselho Nacional Eleitoral "dissipasse as dúvidas".
Os votos manuais são uma espécie de recibo, que é impresso depois de os eleitores votarem na urna eletrônica. Depois de averiguação do voto, esse papel é depositado numa urna. São esses recibos que a oposição quer revisar, o que será feito na auditoria anunciada por Carter.
Depois dos conflitos de segunda-feira em Caracas, que deixaram ao menos quatro feridos a bala, a cidade teve um dia calmo. Nas ruas, os opositores repetiam a acusação de que houve fraude.
(FERNANDO CANZIAN E FABIANO MAISONNAVE)


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