São Paulo, quarta-feira, 18 de agosto de 2004

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POR QUE APÓIO CHÁVEZ

"Chávez dá esperança aos pobres"

TARIQ ALI
ESPECIAL PARA O "INDEPENDENT"

O comparecimento às urnas na Venezuela, no domingo, foi enorme. Sob sua nova Constituição, o país deu aos cidadãos o direito de sustar o mandato de um presidente. Nenhuma outra democracia ocidental prevê esse direito.
Os oligarcas da Venezuela e seus partidos políticos, que haviam feito oposição a essa Constituição (e tentado derrubar Chávez com um golpe apoiado pelos EUA e uma greve dos petroleiros, liderada por uma burocracia sindical corrupta), a usaram para tentar livrar-se do homem que fortaleceu a democracia no país.
Eles fracassaram. Por mais fortes tenham sido seus gritos de angústia (e os de seus apologistas na mídia, nacional e estrangeira), na realidade o país inteiro sabe o que aconteceu. Chávez derrotou seus adversários democraticamente e pela quarta vez. A democracia na Venezuela, sob a bandeira dos revolucionários bolivarianos, superou o sistema bipartidário corrupto favorecido pela oligarquia e seus aliados no Ocidente.
Algumas semanas atrás tive uma conversa longa com Chávez em Caracas. Ficou claro para mim que o que ele está tentando fazer é criar na Venezuela uma democracia social radical, que procura dar poder às camadas sociais mais pobres.
Nestes tempos em que a política é subordinada à desregulamentação e à privatização, as metas de Chávez são vistas como revolucionárias. Parte da receita do petróleo está proporcionando educação e saúde aos pobres.
As razões da popularidade de Chávez se tornam evidentes. Nenhum regime anterior havia dado atenção à situação dos pobres.
E não podemos deixar de notar que não se trata apenas de uma disparidade entre ricos e pobres, mas também de uma desigualdade baseada na cor da pele. Os chavistas tendem a ser morenos, refletindo sua origem indígena e escrava. A oposição é formada por pessoas de pele clara, e alguns de seus membros mais revoltantes descrevem Chávez como macaco preto. Chegou a ser montado na embaixada americana em Caracas um espetáculo de marionetes em que Chávez era representado por um macaco. Mas Colin Powell não achou graça, e o embaixador foi obrigado a se desculpar.
Um editorial hostil publicado na ""Economist" desta semana chegou a aventar o argumento bizarro de que o esforço chavista visava apenas conquistar votos. A verdade é o contrário. Os bolivarianos queriam o poder para implementar reformas reais. Tudo o que os oligarcas têm a oferecer é a continuação do passado.
Sugerir que a Venezuela esteja à beira da tragédia totalitária é ridículo. É a oposição que vem tentando conduzir o país nesse rumo. Os bolivarianos têm se mostrado espantosamente contidos.
Quando pedi a Chávez que explicasse sua filosofia, ele respondeu: ""Não acredito nos postulados da revolução marxista. Não aceito que estejamos vivendo num período de revoluções proletárias. A realidade nos diz isso todos os dias. Mas se me dizem que, por causa dessa realidade, não podemos fazer nada em prol dos pobres, então respondo: "Nesse caso, vamos seguir caminhos opostos". Jamais aceitarei que não possa ocorrer redistribuição da renda. Acredito em tentar fazer nossa própria revolução, partir para o combate, avançar um pouco na direção certa, nem que seja apenas um milímetro, em lugar de ficar sonhando com utopias".


O escritor paquistanês Tariq Ali é editor da "New Left Review", em Londres, e autor de "Bush na Babilônia" (Record)

Tradução de Clara Allain


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