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Obama abandona escudo antimísseis de Bush
Presidente decide substituir projeto que envolvia instalações na República Tcheca e na Polônia e contrariava Rússia
Justificativa para mudança é fato de tecnologia do Irã para
produzir projéteis de longo alcance não avançou tanto quanto os EUA esperavam
Tim Sloam/France Presse
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O secretário da Defesa, Robert Gates, disse que novo plano é melhor do que o que apoiou há 3 anos
JANAINA LAGE
DE NOVA YORK
LUCIANA COELHO
DE GENEBRA
O presidente dos EUA, Barack Obama, anunciou ontem
que não dará continuidade ao
projeto do antecessor George
W. Bush de construir um escudo antimísseis com bases na
Polônia e na República Tcheca.
O governo anunciou que, no
lugar do programa elaborado
por Bush para combater mísseis de longo alcance do Irã,
adotará um sistema com foco
na intercepção de mísseis de
curto e médio alcance.
A decisão favorece as relações dos EUA com a Rússia, que
via o projeto de Bush como
uma ameaça à sua segurança, e
pode servir para que Washington peça como contrapartida a
Moscou o apoio no Conselho de
Segurança da ONU a sanções
mais duras contra Teerã.
A Casa Branca negou que a
decisão tenha sido motivada
por aspectos diplomáticos. Antevendo críticas, Obama disse
que seguiu as recomendações
do secretário de Defesa, Robert
Gates, e do chefe do Estado-Maior conjunto.
Segundo o presidente, a decisão foi motivada por dois fatores. O primeiro seria a atualização dos dados de inteligência
do programa de mísseis do Irã.
Ao contrário do que se previa
antes, o programa não teria
avançado tão rapidamente na
fabricação de mísseis de longo
alcance, mas sim na de projéteis de curto e médio alcance,
que poderiam atingir Israel e
países europeus.
O segundo aspecto seria o
próprio avanço da tecnologia
de defesa americana, que permitiria ao novo programa passar a funcionar mais rapidamente e ser mais flexível para
responder a eventuais ataques.
"Bush estava certo quando
disse que o programa de mísseis do Irã representa uma
ameaça significativa. E é por isso que estou comprometido a
desenvolver um sistema de defesa forte que se adapte às
ameaças do século 21", disse.
Obama reiterou o compromisso dos EUA com o artigo 5º
do tratado da Otan (a aliança
militar ocidental) que determina que o ataque a um membro
representa um ataque à aliança.
"Aqueles que dizem que estamos jogando fora nosso programa de defesa na Europa estão
desinformados ou deturpando
a realidade do que estamos fazendo", afirmou Gates.
Segundo o secretário, a nova
configuração dá maior capacidade de defesa de mísseis para
as forças americanas e europeias do que o programa que
ele mesmo recomendou há
quase três anos, quando era secretário da Defesa de Bush.
Quatro etapas
Na prática, o novo programa
é dividido em quatro etapas.
Até 2011, o Pentágono vai utilizar navios Aegis equipados com
interceptadores SM-3 no Mediterrâneo que estarão ligados
a sensores. Isso daria aos EUA
habilidade para defender infraestrutura e forças americanas na Europa.
A segunda etapa, prevista para ocorrer até 2015, exigiria
uma base em terra, e há discussões em curso para a definição
do local -a Turquia é uma das
opções. Nesta etapa haveria um
aumento da área coberta.
Na terceira fase, até 2018,
versões maiores e mais potentes dos interceptadores permitiriam a cobertura de praticamente toda a Europa contra os
mísseis de alcance menor e intermediário. Até 2020, o sistema se tornaria capaz de proteger os EUA contra mísseis de
longo alcance.
A decisão foi alvo de críticas
entre os republicanos. O senador John McCain, rival de Obama nas últimas eleições presidenciais, disse que a estratégia
era equivocada. "Dadas as sérias e crescentes ameaças impostas pelos programas nuclear e de mísseis do Irã, agora é
o momento em que deveríamos
fortalecer nossas defesas e as
de nossos aliados", afirmou.
Repercussão
A Rússia, por sua vez, celebrou o anúncio. "Apreciamos
essa medida responsável do
presidente americano em relação a reconhecer nosso entendimento. Estou preparado para
continuar esse diálogo", disse o
presidente Dmitri Medvedev.
"Juntos poderemos trabalhar em medidas efetivas contra os riscos da proliferação dos
mísseis, que levem em conta interesses e preocupações de todos os lados e garantam a segurança igualitária de todos os
Estados da Europa", acrescentou, sinalizando possíveis avanços nas negociações para retrair os arsenais nucleares.
Os aliados americanos na Europa Ocidental também aplaudiram -a chanceler (premiê)
alemã, Angela Merkel, disse
que se tratava de um "sinal de
esperança" para "superar os
obstáculos com a Rússia".
Os premiês Donald Tusk (polonês) e Jan Fischer (tcheco)
foram comedidos, embora tenham mostrado alguma surpresa. "Com a mudança na
questão do escudo, a Polônia
tem a chance de ganhar uma
posição exclusiva. Nossas relações com os EUA e as negociações estão surtindo efeitos, diferentes do que esperávamos,
porém benéficos", disse Tusk.
Seu governo é muito menos
antagônico ao Kremlin do que
o de seu antecessor Jaroslaw
Kaczynski, que forjou o acordo.
Ele disse que não via o movimento estratégico uma "derrota", e sua Chancelaria enfatizou
os laços com Washington.
Fischer, por sua vez, afirmou
esperar que os EUA "cooperem
com a República Tcheca no futuro e façam um acordo sobre
cooperação científica e militar,
que envolva o financiamento
de projetos concretos".
Já Mirek Topolek, seu predecessor, rechaçou a mudança
política. "São más notícias",
disse Topolek. "Depois de 20
anos em nosso caminho para as
estruturas euro-atlânticas e de
nosso envolvimento ativo, o
processo foi suspenso."
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