São Paulo, quinta-feira, 18 de dezembro de 2008

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Cúpula lança OEA com Cuba e sem EUA

Organização dos Estados da América Latina e do Caribe terá a sua criação formalizada até 2010; Lula vê "dia histórico"

Comunicado, vago sobre papel da nova entidade, acomoda interpretações divergentes de líderes pró-Washington e bolivarianos

CLÓVIS ROSSI
ENVIADO ESPECIAL À COSTA DO SAUÍPE

Os líderes dos 33 países da América Latina e do Caribe festejaram ontem na cúpula da Costa do Sauípe o nascimento da OEALC (Organização dos Estados da América Latina e do Caribe), uma espécie de OEA do B, já que a Organização dos Estados Americanos continuará funcionando, com 32 desses países mais Estados Unidos e Canadá (a exceção é Cuba, expulsa há 46 anos).
"É um dia histórico", celebrou o presidente-anfitrião, Luiz Inácio Lula da Silva. Explicou: "Há mais de 200 anos todos os países conquistaram a sua independência. Em 2022, a do Brasil fará 200 anos. Mas é a primeira vez que conseguimos reunir todos os países da América Latina e do Caribe".
"Tomara que seja este o dia da libertação", emendou o venezuelano Hugo Chávez.
As duas frases podem ser tomadas como o diferente modo como a nova organização é vista. Para Chávez, Evo Morales (Bolívia), Rafael Correa (Equador) e Daniel Ortega (Nicarágua), é uma instituição antiimperialista e voltada principalmente para dentro. Para Lula, Felipe Calderón (México) e Cristina Kirchner (Argentina), presidentes dos três países mais importantes do subcontinente, é um mecanismo adicional de integração, por reunir o conjunto de países das Américas, excetuados os dois únicos ricos (EUA e Canadá).
"Todos nós, do menor ao maior país, estamos compreendendo que, quanto mais nos juntarmos, mais chances teremos de participação nas políticas globais, mais chances de participação na riqueza global e mais chances de evitar que a crise, nascida nos países riscos, atinja muito fortemente os países que não criaram a crise", disse Lula na entrevista coletiva que encerrou a cúpula.
Já Chávez preferiu mencionar as medidas anticrise definidas há um mês, em cúpula da Alba (Allternativa Bolivariana para as Américas), que, como a Folha já mostrou ontem, tratam de mecanismos regionais. Calderón, ao contrário, referiu-se às propostas que o México apresentou na cúpula do G20 em Washington, em novembro, todas voltadas para a reconstrução do sistema financeiro global, não regional.
Mas o caudaloso comunicado oficial, de cinco páginas e meia, é bem menos nítido, já que foi, como de costume, redigido em uma linguagem que possa ser aceita sem preocupações pelo México, sócio dos Estados Unidos no Nafta (o acordo de livre comércio da América do Norte), e pela Venezuela, cujo presidente diz que "o capitalismo é do Diabo".
Coube à Colômbia, um dos países sul-americanos mais alinhados aos EUA, apesar de integrar o novo grupo, sair em defesa da OEA. "A integração significa valorizar o que já foi feito. Organizações como a OEA nos permitiram abrir um espaço de diálogo em momentos difíceis", disse o vice-presidente Francisco Santos, representante na cúpula de Álvaro Uribe, que ficou na Colômbia para lidar com o problema das enchentes.

Aos poucos
A OEALC, que Calderón prefere que se chame "União (ou Unidade) da América Latina e do Caribe", nascerá aos poucos. No ano que vem, haverá uma reunião ministerial para lançar "as bases econômicas, sociais, políticas e culturais" desse processo de integração.
Depois, em 2010, os presidentes voltam a se reunir, para aí, sim, se tudo der certo, formalizar a nova instituição.
Antes, no entanto, haverá um encontro no Chile, em março, provavelmente de ministros, para discutir posições conjuntas que serão levadas à reunião do G20 de abril, em Londres. Brasil, México e Argentina serão os porta-vozes.
Além da disputa ideológica, há uma velada disputa de liderança. Ontem, um jornalista perguntou a Chávez sobre a liderança que Lula vem exercendo nesse processo. Chávez reconheceu, como é óbvio, que se trata de "uma liderança importante", mas emendou:
"Não se trata de que um país seja líder. Trata-se de um conjunto de lideranças. A Bolívia exerce liderança, o Equador exerce liderança, Cuba também. É um conjunto de líderes, de homens líderes, de mulheres líderes, de povos líderes".


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