São Paulo, sexta-feira, 18 de dezembro de 2009

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Clarín obtém vitória judicial contra Cristina

Juiz considera inconstitucional artigo de lei de mídia que obriga grupo a se desfazer em um ano de negócios na TV a cabo

Governo argentino diz que vai recorrer de decisão; chefe de gabinete desqualifica juiz e fala em "pressão altíssima" exercida pelo "monopólio"


Presidência argentina
Presidente Cristina Kirchner participa de cerimônia de posse da nova cúpula das forças de segurança argentinas, em Buenos Aires

SILVANA ARANTES
DE BUENOS AIRES

O Grupo Clarín, maior conglomerado de mídia argentino, obteve sua primeira vitória na Justiça contra a Lei de Serviços Audiovisuais, que o governo da presidente Cristina Kirchner conseguiu aprovar no Congresso em outubro passado.
A lei regula os mercados de rádio e TV com o objetivo, segundo o governo, de erradicar os "monopólios" do setor.
Os limites impostos à propriedade de concessões de canais e ao volume de audiência por empresa privada obrigam o Clarín a reduzir seus negócios no mercado de TV a cabo, em que é líder no país. O Clarín teria, por exemplo, que se desfazer do canal de notícias a cabo que possui para manter seu canal de TV aberta -a nova lei não permite que uma mesma empresa tenha as duas coisas.
Um juiz federal deferiu anteontem medida cautelar requisitada pelo Clarín, por considerar inconstitucionais dois artigos cruciais da lei.
A decisão do juiz derruba o prazo de um ano que a lei estabelece para as empresas já atuantes no mercado adaptarem-se às novas regras, desprendendo-se de parte de seus negócios, até se enquadrarem aos limites de mercado fixados.
Pela sentença, cai também a necessidade de prévia aprovação do governo para a transferência de canais de rádio e TV de uma empresa para outra.
Em seu veredicto, o juiz diz que esses trechos da lei "ignoram a vigência do direito à propriedade". Segundo ele, os artigos impugnados "contrariam o disposto pelo artigo 3º do Código Civil, que estabelece que as leis não têm efeito retroativo e que, em nenhuma hipótese, a retroatividade estabelecida por lei poderá atingir direitos amparados por garantias constitucionais, afetando as relações e situações jurídicas realizadas anteriormente".
Durante o debate da Lei de Serviços Audiovisuais no Congresso, o governo rebateu a crítica de que seu projeto feria o direito à propriedade, com o argumento de que o espectro radioelétrico não é propriedade privada. Segundo essa premissa, as empresas apenas exploram concessões do espectro outorgadas pelo Estado, sem adquirir direitos sobre elas.

Reação do governo
A Casa Rosada anunciou ontem que, "por instrução expressa da presidente", recorrerá da decisão judicial.
O governo desqualificou o juiz que a ditou, Edmundo Carbone. "A falta de ética do doutor Carbone é superlativa", afirmou o chefe de gabinete, Aníbal Fernández. "Temos 99% de juízes probos e responsáveis, mas temos personagens com essas características, que, faltando 15 dias para aposentar-se, tomam decisões que fogem à sua alçada", disse.
Carbone, que se aposentará no próximo dia 31, é juiz federal de primeira instância na Câmara Civil e Comercial.
O chefe de gabinete de Cristina disse que "pessoas do entorno do juiz disseram que a pressão por parte do monopólio [o Grupo Clarín] foi altíssima".
Procurado pela Folha, Carbone disse que não comentaria as afirmações de Fernández. "Depois de uma trajetória [profissional] de 30 anos, não tenho que dar atenção às imbecilidades que diz o estúpido do Aníbal Fernández. Além disso, não falo com animais", disse.
O governo Cristina e o Grupo Clarín estão em atrito desde meados de 2008, quando os órgãos de imprensa do conglomerado passaram a adotar tom crítico à gestão da presidente.
O Clarín julga haver uma "escalada" de ações do governo para lesá-lo -na ação mais recente, a Secretaria de Comércio Interior ordenou a reversão da fusão da Multicanal, empresa prestadora de serviços de TV a cabo do grupo, com a Cablevisión, autorizada em 2007 pelo marido e antecessor de Cristina, Néstor Kirchner.


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