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ARTIGO
Unilateralismo é prenúncio de novo embate
RAMI G. KHOURI
ASSIM COMO a retirada
israelense unilateral de
Gaza, em 2005, desencadeou uma série tumultuada
de fatos políticos que levaram
palestinos e israelenses a esta
guerra, o cessar-fogo israelense
unilateral em Gaza será seguido por mudanças políticas profundas que vão transformar a
região por anos futuros.
As mudanças históricas já estão em curso em três arenas: na
sociedade palestina, entre Palestina e Israel, e entre o Oriente Médio e as potências ocidentais. Todas as três estiveram em
evidência nesta semana, com
quatro cúpulas árabes diferentes ocorrendo em quatro cidades -onde a batalha militar entre Gaza e Israel continua sob a
forma de batalhas políticas de
implicações regionais e globais.
Uma luta ideológica começou nos anos 70: foi quando o
nacionalismo pan-árabe dos
anos 50 e 60 morreu, grupos
guerrilheiros palestinos desafiaram Israel e alguns regimes
árabes, e nacionalistas islâmicos iranianos derrubaram o xá
do Irã. Os últimos 30 anos no
Oriente Médio testemunharam um cabo-de-guerra entre
aqueles que querem ancorar
seu nacionalismo e desenvolvimento em suas identidades
árabe-islâmicas, iraniano-islâmicas ou turco-islâmicas e
aqueles que preferem vincular
seu destino aos incentivos materiais e militares da aceitação
dos interesses americanos e israelenses, como vassalos.
A batalha por Gaza capta todos esses elementos simultaneamente de uma maneira que
nunca foi tão clara. Por um lado, Israel depende do apoio
americano, europeu e de alguns
países árabes em sua tentativa
de forçar os palestinos de Gaza
a se submeterem, à custa da
força e da fome, e procura substituir o Hamas, em ascensão,
pelo cansado e desacreditado
presidente Mahmoud Abbas.
Por outro lado, meia dúzia de
importantes atores árabes, iranianos e turcos, além de uma
maioria crescente da opinião
pública mundial, apoiam os direitos dos palestinos. Esse
apoio às vezes se reflete em
apoio explícito ao Hamas, mas
se reflete sobretudo em solidariedade com os civis palestinos.
O cessar-fogo israelense unilateral vai enfatizar e agravar
essas tendências e preparar o
palco para um embate político.
A questão-chave é o equilíbrio
entre o desejo israelense de
controle e hegemonia unilateral versus a determinação dos
palestinos em conquistar a libertação do cerco de Gaza liderado por Israel e EUA e seu desejo de legitimidade política explícita, por meio de um engajamento diplomático formal.
O problema central, no curto
prazo, tem sido o desejo israelense de tomar decisões unilaterais que afirmem seu controle da situação, sem dialogar
com o poder crescente do Hamas e dos islâmicos e nacionalistas palestinos aliados a ele.
Israel ocupou Gaza em 1967,
colonizou-a unilateralmente,
brutalizou-a unilateralmente,
depauperou-a unilateralmente, retirou-se dela unilateralmente, cercou-a unilateralmente e agora a atacou e declarou cessar-fogo unilateralmente. Cada ação dessas de Israel
falhou em alcançar suas metas
-o mesmo deve ocorrer agora.
A lição que Israel parece frenético ou obstinado demais para aprender é que resolver o
conflito palestino-israelense
subjacente requer um acordo
negociado entre dois lados. A
importância histórica do Hamas se deve ao fato de ele desafiar o pendor unilateralista de
Israel como movimentos palestinos anteriores -sobretudo o
Fatah de Iasser Arafat- não
puderam ou não ousaram fazer.
Ambos os lados dirão que alcançaram seus objetivos. Mas,
na esteira dos combates, o Hamas será o vencedor político
maior. Ele agora terá que usar
seu capital político para operar
de modo mais sutil em fóruns
domésticos, regionais e globais,
onde gozará de mais credibilidade, legitimidade e impacto.
RAMI G. KHOURI é editor do "The Daily Star" e
diretor do Instituto Issam Fares de Política Pública e Assuntos Internacionais da Universidade
Americana em Beirute. Este artigo foi distribuído pela Agence Global
Tradução de CLARA ALLAIN
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