São Paulo, sexta-feira, 19 de março de 2010

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Brasil estende seu giro diplomático à Síria

Em decisão de última hora, Amorim viaja a Damasco para convencer aliado do Irã a fazer "pressão positiva" sobre o país

Visita encerra semana em que Brasil tentou alavancar sua participação no diálogo em busca de solução para conflitos do Oriente Médio


Sana/Efe
O sírio Bashar Assad (à esq.) recebe Amorim

MARCELO NINIO
ENVIADO ESPECIAL A DAMASCO
CLÓVIS ROSSI
ENVIADO ESPECIAL A AMÃ

Consciente de que tem pouca chance de influenciar sozinho o Irã a tomar medidas para diminuir a desconfiança em torno de seu programa nuclear, o Brasil buscou ontem ajuda da Síria, principal aliada de Teerã no Oriente Médio.
Numa decisão de última hora, o chanceler Celso Amorim fez visita-relâmpago a Damasco, encurtando sua passagem pela Jordânia, escala final da turnê que levou o presidente Luiz Inácio Lula da Silva ainda a Israel e ao território palestino da Cisjordânia.
"A Síria é peça importante tanto no conflito [do Oriente Médio] como na sua solução", disse Lula ao explicar a viagem de seu chanceler.
"Se os países ricos, se os EUA e a Europa não conversam com a Síria, nós precisamos aproximar os interlocutores que podem achar a solução e que não acham porque estão distantes uns dos outros", completou.
No encontro de Amorim com o ditador sírio, Bashar Assad, a conversa se concentrou em possíveis formas de destravar os dois principais nós políticos da região: o processo de paz com Israel e o impasse nuclear com o Irã.
"Achei interessante expor nosso esforço em relação ao Irã porque a Síria tem uma relação próxima com o país", disse Amorim à Folha após a conversa em Damasco. "Qualquer negociação num tema sensível como este exige flexibilidade de todos os lados. Quem sabe a Síria pode ajudar?"
Embora defenda o direito do Irã de ter um programa nuclear, o Brasil começa a demonstrar preocupação em garantir que ele se limite a fins pacíficos. Mas em vez de sanções mais duras contra Teerã, como querem os EUA, o Itamaraty aposta numa "pressão positiva" de aliados como a Síria.
Ontem, o assessor diplomático de Lula, Marco Aurélio Garcia, disse na Jordânia que o governo brasileiro vai pedir "contrapartidas" do Irã durante a visita que o presidente fará a Teerã em maio.
O próprio Lula, em entrevista a jornalistas brasileiros, admitiu que há controvérsias sobre sua viagem ao Irã, para depois acrescentar que é preciso "conversar exatamente com os que não querem a paz".
Não é, necessariamente, uma alusão ao Irã, até porque o presidente diz que ainda não descobriu quem não quer a paz. Mas é certamente uma resposta indireta à cobrança recebida em Israel sobre a visita ao Irã, tida como legitimação indireta do regime iraniano. Na segunda, governo e oposição israelenses se uniram num apelo para que o Brasil se afaste do Irã, durante sessão do Parlamento na qual Lula discursou.

Síria e Israel
Na Síria, Amorim reiterou o convite para que Assad venha ao Brasil nos próximos meses, mas não quis comentar a hipótese de a visita coincidir com a do premiê de Israel, Binyamin Netanyahu. A ideia foi ventilada nesta semana, em conversa de Lula com o presidente israelense, Shimon Peres.
O chanceler brasileiro justificou a viagem a Damasco afirmando que a Síria é um ator fundamental na região. "As relações da Síria com outros países estão melhorando, e a nomeação de um embaixador americano para Damasco é prova disso", disse.
Sobre o envolvimento do Brasil nas explosivas relações regionais, após conversar em poucos dias com autoridades israelenses, palestinas, jordanianas e sírias, Amorim disse que ele já está em curso.
"Ao fazer essas conversas o Brasil já está participando", disse o chanceler, que afirma ter percebido em Assad interesse em retomar as negociações com Israel. "Há uma abertura de espírito, um desejo de engajamento. Mas são processos que levaram 2.000 anos se criando, você não pode querer resolver tudo em meia hora."
Amorim, que diz ter levado uma mensagem confidencial da Síria a Israel em 2008, disse que desta vez não serviu de emissário no sentido oposto. Mas contou ter relatado a Assad como foram as conversas entre Lula e os israelenses.
""Não apresentei uma proposta específica, mas se [Assad] for ao Brasil teremos a chance de uma conversa mais aprofundada", disse Amorim.


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