São Paulo, quarta-feira, 19 de abril de 2006

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HISTÓRIA

Moradores lembram tragédia que matou 3.000 e destruiu 500 quarteirões da cidade do noroeste americano

San Francisco evoca cem anos do terremoto

MARY MILLIKEN
DA REUTERS, EM SAN FRANCISCO

Há cem anos, os habitantes de San Francisco foram acordados às 5h13 por um terremoto que devastou a cidade. Na terça-feira, eles voltaram a levantar-se antes do amanhecer para comemorar a sobrevivência e o renascimento da cidade, após o "Big One".
Para lembrar o centenário da catástrofe, milhares de pessoas se reuniram em torno da fonte Lotta, um monumento no qual as famílias deixaram mensagens à procura de seus entes queridos após o terremoto de 1906. Entre elas havia uma dúzia de sobreviventes do terremoto.
Estimadas 3.000 pessoas morreram no abalo sísmico, que durou um minuto e teve intensidade de 7,9 graus, e nos três dias de incêndios que se seguiram a ele, que devoraram 500 quarteirões da cidade e deixaram desabrigados mais da metade dos 400 mil moradores daquela cidade americana.
Os sobreviventes, em sua maioria, eram crianças muito pequenas quando o terremoto aconteceu, mas ainda têm histórias a contar. "Lembro-me de ver uma vaca subir o morro correndo, com a cauda em pé", contou uma delas, Violet. Outra mulher, com 99 anos, disse que se considera "fruto do terremoto", porque foi concebida e nasceu em uma das muitas barracas montadas para os abrigar sobreviventes no parque Golden Gate.
O prefeito Gavin Newsom disse que San Francisco é um exemplo de um lugar devastado por uma catástrofe, como Nova Orleans após a passagem do furacão Katrina, no ano passado. "Quem teria imaginado que, poucos dias após o desastre, as pessoas teriam literalmente começado a tirar o pó das casas e decidido reconstruí-las da maneira milagrosa que vemos aqui hoje?"
Sirenas tocaram ao amanhecer, e bares foram abertos antes do sol nascer, para intensificar as comemorações do centenário. Os moradores de San Francisco encontraram nas portas de suas casas uma cópia da edição do dia seguinte ao desastre de 1906 do jornal "The Call-Chronicle Examiner", ostentando a manchete "Terremoto e Incêndios: San Francisco em Ruínas".
Entretanto, apesar das comemorações da sobrevivência da cidade, o centenário também serviu para recordar que a área da baía de San Francisco continua profundamente vulnerável às sete falhas geológicas da região.
Especialistas em sismologia acreditam que a região tem 60% de chances de sofrer um terremoto de grandes proporções nos próximos 25 anos. Um terremoto que ocorresse hoje na falha de San Andreas, com magnitude semelhante ao de 1906, poderia causar milhares de mortes e danos de US$ 150 bilhões.
"Vivo na região da falha de Hayward, e lá também estamos sujeitos a outros terremotos", comentou Art Brandenburg, que foi à cerimônia usando ceroulas, sobretudo e cartola. "Todo o mundo deveria andar sempre com farolete e apito." Brandenburg disse que se vestiu para a ocasião em homenagem ao grande tenor italiano Enrico Caruso, que estava vestido assim quando fugiu de seu quarto no vizinho Palace Hotel. Caruso nunca mais retornou a San Francisco.
As recordações de terremoto que a maioria dos moradores da cidade tem datam de outubro de 1989, quando um tremor de 6,9 graus em Loma Prieta, 100 km ao sul da cidade, matou mais de 60 pessoas e danificou gravemente a ponte sobre a baía, que liga San Francisco a Oakland.
"Foi muito estranho, pareceu durar para sempre", comentou a moradora de Oakland Phyllis McCaughey. Desde então, ela tem um kit para terremotos sempre pronto no guarda-roupa, mas duvida que algum dia precise usá-lo. "Uma vez a cada 80 anos está bem", disse ela. "Acho que estamos seguros por algum tempo."
No bar da estação Sutter, na Market Street, os freqüentadores da madrugada também preferiram ignorar o perigo. "É um aniversário, não um desastre", comentou Ryan Quiel, 25, terminando sua cerveja.


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