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HISTÓRIA
Documentos aos quais apenas a Cruz Vermelha teve acesso mostram como funcionava a máquina de extermínio nazista
Arquivo recém-aberto detalha Holocausto
TONY PATERSON
DO "INDEPENDENT", EM BERLIM
Na tranqüila cidade de Bad
Arolsen, na Alemanha, um antigo
quartel da SS contém o que é provavelmente o mais extenso registro de horror humano jamais
mantido. Os detalhes, que podem
ser encontrados em mais de 47
milhões de arquivos que cobrem
26 quilômetros de estantes, estão
contidos em cadernos comuns, de
capa dura, do tipo que poderia ser
encontrado em qualquer escola.
Está registrado minuciosamente no "Totenbuch", ou "Livro da
Morte", compilado no campo de
concentração de Mauthausen, na
Áustria, o "presente" que o comandante do campo preparou
para Adolf Hitler na ocasião do
aniversário do Führer em 20 de
abril de 1942. Para comemorar o
dia, 300 prisioneiros russos foram
selecionados para execução.
A lista de morte revela como cada prisioneiro foi submetido a um
chamado "Genickschuss", ou tiro
na nuca -apenas uma bala disparada de uma pistola apertada
contra a base do crânio.
Os nomes, números, datas e locais de nascimento de cada preso
são cuidadosamente registrados
linha a linha. A matança começou
às 11h20, quando a palavra "Genickschuss" aparece pela primeira vez, e se repetiu a partir disso a
cada dois minutos, por 299 vezes.
Nesta semana foram divulgadas
publicamente, pela primeira vez,
arquivos contendo detalhes sobre
cerca de 17 milhões de vítimas do
sistema nazista de campos de extermínio e de trabalho escravo.
Nas últimas seis décadas esses
arquivos foram utilizados exclusivamente pelo Serviço Internacional de Rastreamento da Cruz Vermelha para averiguar o destino de
milhões de pessoas desaparecidas
sob o domínio nazista.
Os arquivos foram mantidos fora do alcance do público em grande parte graças a objeções feitas
pela Alemanha, alegando a necessidade de proteger a privacidade
das vítimas.
Mas, na última terça-feira, a comissão de 11 países que controla o
arquivo -EUA, Reino Unido,
França, Alemanha, Itália, Bélgica,
Holanda, Grécia, Israel, Polônia e
Luxemburgo- finalmente concordou em abri-lo aos historiadores, pela primeira vez.
Revelações
As informações que virão à tona
vão fornecer novos dados sobre o
funcionamento da máquina nazista de extermínio e de trabalho
escravo.
O historiador Ulrich Herbert,
da Universidade de Freiburg, declarou: "São relatos pavorosos de
uma época terrível. É frustrante,
até mesmo assustador, que esses
registros tenham sido mantidos
fora do alcance dos pesquisadores
por tanto tempo".
Os arquivos retratam a barbárie
do domínio nazista imposto a milhões de pessoas, em detalhes sumários, mas reveladores. Um arquivo registra a situação de Katrina, uma francesa detida pela Gestapo por "reclamar de ter sido involuntariamente esterilizada pelas autoridades depois de dar à luz
um bastardo de cor".
Outro arquivo registra o que
aconteceu com um banqueiro alemão enviado ao campo de concentração de Buchenwald, em
1937, depois de um informante tê-lo ouvido fazendo críticas ao regime nazista. Em 1944, ele levou "25
chicotadas por preguiça" e, depois de ter sido submetido a interrogatório, "perdeu todos os dentes da boca".
Há, também, a história de uma
enfermeira de 31 anos forçada a
usar a "estrela de Davi" preta e
amarela que declarava sua condição de "maculada pela raça judaica". Seu arquivo ressalta: "A mulher é metade judia e vive com o
namorado ariano. Ela admite que
eles já tiveram relações sexuais".
A mulher desapareceu depois de
ser enviada ao campo de concentração de Ravensbrück.
Desde 1945, a Cruz Vermelha
vem utilizando os arquivos de
Bad Arolsen para responder a
mais de 11 milhões de pedidos de
informação, vindos de 62 países,
sobre o paradeiro de pessoas desaparecidas sob o governo nazista. Apenas no ano passado foram
mais de 150 mil solicitações de informação.
Mais recentemente, os registros
foram usados para ajudar as vítimas do trabalho escravo a pedir
indenização. Alguns conseguiram
registrar esses pedidos apenas
porque os registros dos prisioneiros submetidos a tratamento antipiolhos nos campos possibilitaram sua identificação.
Além de fornecer detalhes históricos tenebrosos sobre o período nazista, grupos judaicos dizem
que os arquivos vão fornecer um
antídoto poderoso à ação dos setores que negam que o Holocausto tenha acontecido.
Israel Singer, do Conselho Judaico Mundial, declarou: "Os milhões de documentos escritos que
comprovam o massacre nazista
dos judeus estarão abertos aos
pesquisadores. É um golpe contra
os que negam o Holocausto".
Tradução de Clara Allain
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