São Paulo, sexta-feira, 19 de junho de 2009

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ANÁLISE

Repetição de 1979 é improvável

PATRICK COCKBURN
DO "INDEPENDENT"

À primeira vista, o que está acontecendo em Teerã se assemelha muito aos eventos da Revolução Islâmica de 30 anos atrás. Em 2 de dezembro de 1978, 2 milhões de iranianos foram às ruas do centro de Teerã exigir o fim do governo do xá e a volta do aiatolá Khomeini. À noite, as pessoas subiam aos telhados de suas casas para bradar "Deus é grande". De dia, comícios imensos celebravam como mártires os manifestantes mortos pela repressão.
Os métodos de protesto hoje em uso são muito semelhantes. Os manifestantes que querem tirar Mahmoud Ahmadinejad do poder esperam que o tipo de protesto que funcionou contra o xá funcione agora. A questão é que o atual governo iraniano não tem a intenção de deixar que a história se repita.
A Revolução Iraniana foi realizada por uma coalizão que abarcava esquerda e direita, com religiosos conservadores em um dos extremos e marxistas revolucionários no outro. O movimento dispunha de um líder messiânico -o aiatolá Khomeini-, que servia como alternativa visível ao xá, líder cuja legitimidade começara a ser questionada ainda antes que ele chegasse ao trono.
A Revolução Islâmica obteve sucesso, em parte, porque apanhou seus inimigos de surpresa. Mas não foi um evento espontâneo. Khomeini e o clero que o apoiava eram revolucionários dedicados. Haviam calculado como tomar o poder e como mantê-lo. Ainda que lastimassem o nacionalismo, foi seu compromisso de defender o Irã contra intervenções estrangeiras que se provou o fator crucial de seu sucesso.
Khomeini foi expulso do Irã porque se opôs à decisão do xá de conceder direitos extraterritoriais a funcionários do governo americano que serviam no país. A atual liderança iraniana não padece da maior fraqueza do xá, que era visto como um títere de potências estrangeiras.

Apoio
Quando o xá deixou o Irã, em 16 de janeiro de 1979, ele não tinha praticamente nenhum apoio. A situação atual é muito diferente. Ahmadinejad foi reeleito com 62,6% dos votos na semana passada. Os adversários dele alegam que as eleições foram fraudadas, mas o fato é que essa proporção dos votos é praticamente idêntica aos 61,7% que ele conquistou na eleição de 2005. Ahmadinejad é um político popular -o xá nunca foi. É altamente improvável que o presidente seja derrubado. E tampouco é provável que venha a se render.
No final de 1978, os iranianos eram capazes de perceber claramente que o xá não conseguiria se manter no posto. O núcleo de apoio com que ele contava nas Forças Armadas começara a oscilar. E, de qualquer modo, Reza Pahlevi não desejava lutar. Na metade de janeiro, ele e sua mulher deixaram o Irã, para nunca mais retornar. Em 1º de fevereiro de 1979, Khomeini retornou ao seu país e foi recebido por milhões de iranianos; ele completou rapidamente a tomada de poder.
Marginalizou os aliados laicos e começou a radicalizar a revolução. Porque recordava a maneira pela qual o xá havia conseguido retornar do exílio com apoio americano, em 1953, mandou deter ou fuzilar todos os potenciais aliados do xá.
Os líderes do novo regime estavam determinados a manter o poder. E pouco mudaram de lá para cá. Os símbolos e a linguagem usados no Irã em 2009 se assemelham ao que aconteceu em 1978/9, mas as forças políticas que estão em ação não poderiam ser menos parecidas. Os manifestantes então eram muito mais fortes do que pareciam; já os atuais enfrentam situação altamente desfavorável.

Tradução de PAULO MIGLIACCI



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