São Paulo, sexta-feira, 19 de outubro de 2007

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Ataque a Benazir mata 126 no Paquistão

Luto substitui a festa pelo retorno da ex-premiê pró-ocidental, que liderará 2º partido do Paquistão nas eleições gerais

Autoridades paquistanesas dizem que líder escapou ilesa; atentado põe em xeque estabilidade de país vital para guerra ao terror

Aamir Qureshi/France Press
Após explosões, automóvel da carreata de Benazir Bhutto pega fogo, em frente ao veículo que conduzia a ex-premiê do Paquistão

DA REDAÇÃO

Um duplo ataque contra a caravana da ex-premiê paquistanesa Benazir Bhutto matou ontem ao menos 126 pessoas em Karachi, sul do Paquistão, e deixou mais de 200 feridos, de acordo com a Associated Press.
O atentado pôs fim aos festejos pela volta do exílio, ontem, da líder política -que pouco antes dispensara o cubículo à prova de balas para seguir à frente do comboio do PPP (Partido do Povo Paquistanês), espremida entre integrantes da cúpula da legenda que vai liderar nas eleições legislativas, previstas para janeiro.
Segundo autoridades paquistanesas, Benazir foi retirada do local, como previsto em um plano de contingência das Forças Armadas, e está bem.
"Os verdadeiros muçulmanos sabem que queimarão no inferno se atacarem uma mulher", tinha dito a ex-premiê, desdenhando dos três planos de atentado contra ela que, segundo o governo, haviam sido desmantelados até o início da semana. Grupos ligados à Al Qaeda e ao Taleban paquistanês seriam os responsáveis pelo planejamento das ações.
Ontem, um dos líderes do Taleban do país disse à Reuters, por telefone, que promoveriam ataques contra a ex-premiê porque "ela tem um acordo com os EUA". "Eu culpo o governo por estes atentados. Este é um trabalho do serviço secreto", disse ontem o marido de Benazir, Asif Ali Zardari.
Bem vista pela Casa Branca, Benazir já declarou apoio a uma ação militar dos EUA na conturbada região da fronteira afegã, base de radicais islâmicos. Para desgosto dos fundamentalistas, Benazir -ela própria muçulmana, como 97% dos paquistaneses- lidera um partido laico. O recente flerte com o ditador Pervez Musharraf, que já foi alvo de ataques terroristas, também contribui para as ameaças à ex-premiê.
As explosões seqüenciais ocorreram a poucos metros do carro que levava a líder do PPP. Segundo autoridades, as explosões foram provocadas por um terrorista suicida e um carro-bomba. Benazir havia sido advertida pelo governo a adiar o retorno. Não se sabe até que ponto questões de segurança motivaram o pedido, inicialmente considerado uma questão política -a legalidade da reeleição de Musharraf ainda está sendo analisada e não há acordo oficial com o PPP.
Recebida por cerca de 200 mil pessoas no aeroporto -uma multidão, mas bem menos que o milhão estimado anteontem pelo PPP-, Benazir seguia em carro aberto no momento da explosão. Cerca de 20 mil agentes faziam a segurança.

Aliança estratégica
Uma morte trágica da ex-premiê poderia complicar a vida de Musharraf, figura-chave na guerra ao terrorismo empreendida pelos EUA e aliado americanos na tensa região.
Washington patrocina a aproximação entre o ditador e a líder pró-ocidental para manter sob controle o país, que possui armas atômicas e é considerado vital para estabilizar o vizinho Afeganistão. O retorno de Benazir foi celebrado como um passo para "assegurar uma democracia estável", pela porta-voz da Casa Branca, Dana Perino. Horas depois, os EUA seriam a primeira potência a condenar os ataques.
Sob intensa pressão americana, Musharraf anistiou neste mês a antiga rival, processada por corrupção. Tratamento bem diferente foi recebido por Nawaz Sharif, premiê deposto pelo golpe de 1999, cuja tentativa de retorno foi frustrada ainda no aeroporto, em setembro.
Porém, a volta da Benazir torna ainda mais complexo o instável cenário político paquistanês. Após meses de negociações com o regime, ainda não se sabe se Benazir será, afinal, rival ou aliada de Musharraf nas eleições gerais. A longa negociação com o ditador desgastou as credenciais democráticas de Benazir e, sob fogo cerrado da base governista, tampouco foi proveitosa para o general até agora.

Da festa ao luto
A chegada de Benazir foi marcada pela comoção. Após oito anos no exílio, ela desembarcou trajando as cores da bandeira nacional, com um exemplar do Corão e olhos rasos d'água.
"É muito bom estar em casa", disse Benazir, que definiu o retorno como o mais importante passo na batalha até as eleições. Após orar, ela prometeu reconduzir o país à democracia e dar prosseguimento ao combate do radicalismo islâmico -promessa recebida com ceticismo pela maioria dos paquistaneses, que há décadas convivem com a instabilidade nas regiões próximas à fronteira afegã.
Mas não por todos. Uma onda de otimismo começou a tomar conta de Karachi na quarta, quando simpatizantes de várias regiões do país começaram a chegar para receber Benazir.
"Com ela no poder, não há explosões de bombas porque tem emprego e não há frustração", disse o criador de gado Azad Bhatti, 35, Bhatti no início do dia. Horas depois, silêncio. Mesmo o governo, que desdenhara dos "apenas" 200 mil de Benazir, preferiu calar.


Com agências internacionais


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