São Paulo, quarta-feira, 19 de novembro de 2008

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Ataques na costa somali aumentam 140%

Ação de piratas no golfo de Áden explode entre 2007 e 2008; petroleiro saudita seqüestrado é ancorado no país africano

Birô Marítimo Internacional contabiliza 95 ataques no Chifre da África; 17 navios com 339 reféns estão em poder dos criminosos

CLARA FAGUNDES
DA REDAÇÃO

O petroleiro Sirius Star, maior navio já seqüestrado por piratas, alcançou a costa somali e foi ancorado ontem em Harardhere, bastião dos criminosos. Com carga avaliada em US$ 100 milhões, o navio saudita de bandeira liberiana foi capturado a 830 km da costa, na mais ousada ação dos grupos que desafiam a crescente presença de Marinhas estrangeiras na região. Acredita-se que os 25 tripulantes estejam bem.
"Não existem mais águas seguras enquanto os piratas estiveram em atuação", disse à Folha o vice-diretor do Birô Marítimo Internacional, Michael Howlett. Dezessete navios com 339 reféns estão em poder dos criminosos na área, conta Howleet, que registrou 95 ataques neste ano no Chifre da África.
Os dados incluem o Delight, cargueiro de Hong Kong que transportava trigo para o Irã e foi seqüestrado ontem, e o ucraniano MV Faina, dominado quando levava tanques e armamentos russos para o Quênia, em setembro
A ação dos criminosos torna a costa somali, passagem estratégica entre o oceano Índico e o canal de Suez, a zona mais perigosa do mundo para a navegação. O aumento dos ataques apenas no golfo de Áden entre 2007 e setembro deste ano foi de 140%. Algumas transportadoras, como a norueguesa Odfjell, abandonaram a rota.
O Sirius Star fazia, porém, caminho mais longo e relativamente seguro, pelo cabo da Boa Esperança, na África do Sul. Foi seqüestrado a centenas de quilômetros do chamado "Beco dos Piratas", provocando perplexidade internacional.
A utilização de navios-mãe, com orientação por GPS, explica como os piratas conseguiram expandir dramaticamente o alcance das ações. Antes restritos à costa, os criminosos passaram a atuar em distâncias cada vez maiores.
A indústria do seqüestro prosperou e o preço dos seguros de embarcações aumentou dez vezes, segundo relatório do instituto de pesquisas internacionais Chatham House. A conta é rateada por consumidores de todo o mundo, obrigados a pagar mais pelos importados.
Howlett conta que os piratas somalis normalmente usam um navio como base, partindo em direção ao alvo em pequenas lanchas. Às vezes usam foguetes para forçar embarcações a diminuir a velocidade e permitir que escalem os cascos dos navios. Armados com fuzis automáticos, como os AK-47, dominam a tripulação e conduzem o navio à costa somali, onde negociam resgate por telefone via satélite.
O Birô Maritimo Internacional cataloga dados sobre embarcações usadas pelos criminosos e critica a inação as Marinhas internacionais, autorizadas a combater a pirataria em águas somalis por resolução do Conselho de Segurança da ONU, aprovada em junho.
"O consenso internacional demora em produzir efeito prático porque depende da disponibilidade dos países desenvolvidos e da articulação com governos da região", diz o analista político Paul Burton, do Conselho Internacional em Segurança e Desenvolvimento.
Com base naval em Djibuti, os EUA são a principal força ocidental na área. No mês passado, os ministros da Defesa da União Européia aprovaram uma missão naval no golfo de Áden, com objetivo de "dissuadir, prevenir e reprimir" a pirataria. Os quatro a seis navios prometidos pelo bloco, porém, são pouco, dizem analistas.
"Uma das soluções de curto prazo é o uso de escoltas privadas", diz Burton. O tempo médio entre o momento em que o piratas são avistados e a tomada do navio não supera 10 minutos, o que torna inviável que peçam socorro.
"Os piratas são uma conseqüência da falência do Estado", resumiu em entrevista à Folha o autor do relatório da Chatham House, Roger Middleton, pessimista sobre as perspectivas de estabilidade no país, conflagrado há 17 anos. Os principais prejudicados são os somalis. A ajuda internacional chegou a ser paralisada, em meio à seca e grave crise humanitária, por falta de segurança.


Com agências internacionais


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