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HAITI EM RUÍNAS
Tragédia já é a mais letal das Américas
Até ontem, governo haitiano havia sepultado 72 mil mortos, e crescia a preocupação mundial quanto aos órfãos haitianos
Precariedade das condições faz com que as agências temam uma crise sanitária
e surtos de febre tifoide, hepatite A e hepatite E
Caio Guatelli/Folha Imagem
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A haitiana Anante Fleriscas, resgatada dos escombros com fratura na bacia, é atendida no hospital de campanha da Força Aérea Brasileira em Porto Príncipe
DA REDAÇÃO
O governo do Haiti havia sepultado até ontem 72 mil vítimas desde terça passada, segundo seu premiê, Jean-Max
Bellerive. Isso faz do terremoto
de 7 graus na escala Richter a
mais letal tragédia das Américas em todos os tempos e um
dos piores terremotos do mundo nos últimos cem anos.
Segundo o haitiano, "muitíssimos" outros cadáveres foram
enterrados pelas próprias famílias e estão fora das estatísticas
oficiais. A estimativa total de
mortos no país permanecia entre 100 mil e 200 mil mortos e
250 mil feridos.
Até a divulgação do número
de vítimas por Bellerive, a catástrofe com mais mortos no
continente era o terremoto de
intensidade 7,9, que vitimara
66 mil pessoas na localidade
peruana de Chimbote em 1970.
Levando-se em conta o número de mortos em decorrência de terremotos em todo o
planeta, o sismo do Haiti já é o
sétimo na lista dos que mais
mataram nos últimos cem
anos, de acordo com dados
compilados pelo Instituto de
Pesquisa Geológica dos EUA.
"Esperança persiste"
A ONU disse ter resgatado
das ruínas mais de 90 pessoas
vivas desde terça passada -recorde em situações do tipo.
"A esperança de encontrar
sobreviventes persiste", declarou, em Genebra, Elisabeth
Byrs, porta-voz da ONU para
assuntos humanitários, assinalando que ontem foram encontradas mais duas mulheres vivas sob os escombros de uma
universidade de Porto Príncipe. Também na capital, socorristas disseram ter detectado
indícios de vida humana sob
um banco que desabou.
No entanto, calculava-se que
milhares de mortos ainda seguissem soterrados.
As atenções mundiais também se voltaram às crianças
haitianas, à medida em que
mais delas apareciam desamparadas, sem que equipes de
resgate tivessem notícia do paradeiro de seus pais e parentes.
Num hospital de campanha
israelense, uma criança de cinco meses era identificada só por
um número. Ninguém sabia
quem havia deixado o bebê ali,
semiconsciente e recém-saído
dos escombros. "O que faremos
com ele após tratá-lo?", questionava-se um médico.
A cifra de órfãos criados pelo
terremoto pode chegar a dezenas de milhares -em um país
que já tinha 380 mil menores
abrigados em orfanatos antes
da tragédia de terça.
Grupos internacionais tentam agilizar o processo de adoções das crianças -mas a adoção deve ser a "última opção",
disse ontem a Unicef, só após se
tentar, a todo custo, encontrar
as famílias dos menores.
Ontem, voo com 53 órfãos
haitianos chegou aos EUA para
que eles sejam adotados lá. Hoje deve chegar a Porto Príncipe
um avião do governo holandês,
em missão para localizar 109
crianças cuja adoção por famílias holandesas estava em andamento antes da tragédia.
Crise sanitária
As agências humanitárias
também se preocupam com o
risco de uma crise sanitária no
Haiti. Sem banheiros para os
flagelados e com acampamentos precários lotados com até
40 mil pessoas, o alcance de
doenças simples, mas potencialmente fatais, se multiplica.
A Organização Mundial da
Saúde vê risco de surtos pontuais ou mesmo epidemias
(mais disseminadas) de febre
tifoide, hepatite A e hepatite E.
Alerta também para a ameaça
do cólera, doença que se espalha pelo consumo de água suja.
O Haiti já não tinha coleta regular de esgoto. Com o terremoto, segundo os assistentes
humanitários, nem privadas e
fossas suficientes há na capital.
Na descrição do Comitê Internacional da Cruz Vermelha,
"por toda Porto Príncipe o
cheiro de urina é dominante".
Fezes se acumulam. "Faltam
latrinas, e há tanta gente aglomerada... Eles acampam onde
podem", disse à Folha Marçal
Izard, porta-voz do CICV.
Diante da falta de água limpa, alerta o CICV, as pessoas
têm usado água suja para tomar banho e, às vezes, cozinhar
ou beber. "Nosso foco é fornecer água potável", afirma Izard.
Ainda assim, as agências não
registraram por ora um aumento nos casos de cólera,
diarreia e outras doenças ligadas à falta de saneamento.
A OMS também chama a
atenção para o risco de surtos
de doenças causadas por aglomeração, como tuberculose,
sarampo, difteria e meningite.
Colaborou LUCIANA COELHO, de Genebra
Com agências internacionais
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