São Paulo, sábado, 20 de março de 2010

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Reforma da saúde manterá latinos alijados

Mesmo que projeto defendido por Obama seja aprovado amanhã, imigrantes ilegais seguirão sem poder bancar atendimento médico

Clínicas comunitárias ou gratuitas, dependentes de trabalho voluntário e com dificuldades para se manter, seguirão como única opção


ANDREA MURTA
DE WASHINGTON

Como faxineira na capital americana, a imigrante salvadorenha Blanca Cruz, 55, não tem dinheiro para pagar um seguro de saúde privado. Como diabética, precisa de atendimento constante. Na semana passada, ela conseguiu o que queria: uma consulta médica em Washington.
Cruz foi atendida por uma clínica comunitária especializada em latinos no norte da cidade, a Clínica del Pueblo, que recebe um dos grupos de pacientes mais vulneráveis dos EUA: o dos imigrantes pobres. "Acho que sem esse lugar eu já estaria morta", afirmou ela à Folha.
Com atuação discreta, mas vital, clínicas comunitárias e gratuitas se espalharam pelos EUA. As primeiras recebem alguns fundos públicos, enquanto as segundas são inteiramente baseadas em trabalho voluntário e doações. Todas oferecem serviços básicos gratuitos ou com cobrança simbólica, baseada em faixa de renda e tamanho da família.
Mas são apenas cerca de 1.200 clínicas do tipo (ou até 2.000, a crer nas contagens informais mais otimistas), e elas só conseguiram fornecer atendimento primário, não emergencial, a 7 milhões de pacientes em 2008, segundo o jornal "USA Today".
O restante dos não segurados -que totalizam mais de 46 milhões de pessoas- ainda recorre às salas de emergência de hospitais, que cobram valores exorbitantes após os serviços. É a forma mais ineficiente e mais cara -mas ainda assim a mais usada- de atendimento primário nos EUA.

Sem saída
Mesmo se a reforma do sistema de saúde proposta pelo presidente Barack Obama for aprovada em votação amanhã, como espera o governo, os imigrantes pobres -especialmente os ilegais- deverão continuar de fora da cobertura, mantendo a demanda sobre as clínicas comunitárias. A exclusão de imigrantes sem documentos foi exigida por congressistas ao governo, e mesmo os legais, se não forem naturalizados, terão dificuldades.
"Para nossos pacientes, a reforma faria pouquíssima diferença", afirma Alicia Wilson, diretora da Clínica del Pueblo.
A reforma poderá ajudar, porém, com o aumento dos fundos públicos revertidos às clínicas, o que terá importância especial em cenário de crise econômica. Em época de alta no desemprego (a taxa passou de 4,5% em fevereiro de 2007 a 9,7% no mês passado), a pressão sobre essas organizações se tornou uma ameaça. O grupo Families USA calcula que para cada ponto percentual de aumento no desemprego, o número de não segurados aumenta em 1,1 milhão de pessoas.
As clínicas sofrem ainda com a queda nas doações -muitos estabelecimentos foram fechados. "Não cortamos serviços, mas fomos forçados a negar atendimento a cada vez mais pessoas no ano passado", diz Wilson.
A situação é um pouco melhor em Washington do que no resto do país, graças à chamada Health Care Alliance (aliança de atendimento de saúde), um tipo de seguro público de baixa renda oferecido aos residentes na região.
Mas a clínica também acaba atendendo pacientes de Estados vizinhos, como Maryland e Virgínia, que não podem entrar para a aliança e não têm outras opções. "A única coisa que resolveria o problema dessas pessoas é a reforma migratória, mas não estou otimista quanto à rapidez com que isso será alcançado", diz Wilson.


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