São Paulo, sexta-feira, 20 de abril de 2007

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Silêncio de atirador assustava parentes

Familiares do sul-coreano Cho Seung-hui, autor do massacre na Virgínia, falam em público pela primeira vez sobre o estudante

Avô de assassino pensava que neto tinha problema de fala; pais estão sob proteção do FBI, e polícia encerra "investigações principais"

SÉRGIO DÁVILA
ENVIADO ESPECIAL A BLACKSBURG

Silêncio. Essa a característica de Cho Seung-hui que desde a sua infância mais preocupava parentes do estudante sul-coreano. Três dias depois do massacre que matou 32 pessoas no campus de uma universidade no Estado da Virgínia, familiares do autor do maior ataque do tipo na história dos EUA começam a aparecer. Entretanto, os pais de Cho, que se matou após o crime, continuam eles próprios em silêncio.
Seu avô materno, Kim Hyong-shik, 81, chegou a pensar que, aos oito anos, o neto tinha problemas de audição. "O menino era muito diferente da irmã mais velha, que é superinteligente. Sua timidez extrema preocupava os pais. Achei que ele poderia ser surdo e mudo", disse ao jornal sul-coreano "Hankyoreh".
Diria ainda que o pai de Cho "vivia para seus filhos". "Agora acontece isso. É como se todo o esforço não tivesse servido para nada. É como se eles nem tivessem vivido", lamentou.
Opinião semelhante tem a tia-avó materna. "Ele era muito frio", disse Kim Yang-soon, 84, em entrevista a uma emissora sul-coreana retransmitida pela CNN. "Era bonitinho, mas não falava. Eu o provocava e tentava falar com ele, mas ele não respondia." "Eu suponho que ele deveria ter problemas mentais desde o nascimento", completou a tia-avó. Cho, os pais e sua irmã mais velha deixaram a Coréia do Sul em 1992.

Pais sob proteção
Cho Sung, 61, e Cho Hyang, 56, continuam sem aparecer em público ou na casa em que moram em Centreville, cidade da Virgínia a 40 minutos de Washington. Estão sob proteção do FBI, segundo a polícia estadual da Virgínia, e não se sabe se darão entrevistas -ambos falam pouco inglês.
A polícia da Virgínia negou também que eles tivessem tentado se matar, um dos rumores mais persistentes no campus do Virginia Tech. "Eles estão bem", disse a porta-voz Corrine Geller. "Tem havido muitos rumores sobre eles, mas eles estão atualmente sob proteção das autoridades." Jornais coreanos chegaram a publicar que eles teriam sido internados "em estado de choque".
Já a irmã do estudante teria ligado para um líder religioso em Princeton e dito a ele que pedisse desculpas a todos, especialmente os sul-coreanos daquela universidade de Nova Jersey onde ela se formou em 2004. A informação foi publicada no "The Daily Princetonian" e atribuída ao reverendo David Kim. "Quando ela me ligou, uma das primeiras coisas que fez foi se desculpar."
Cho Sun-kyung presta serviços ao escritório de informação de gerenciamento de recursos do Departamento de Estado norte-americano, embora não seja contratada do governo. Em e-mail enviado na quarta-feira, ela teria pedido desculpas também aos colegas de trabalho e dito que sairia de licença.

Reação ao vídeo
Depois de dizer que as "investigações principais" sobre o massacre estavam encerradas e que o pacote enviado por Cho à NBC só confirmava o que os policiais já sabiam e pouco acrescentava como prova, o chefe da Polícia Estadual da Virgínia se disse "desapontado" com a decisão da emissora de exibir o vídeo, depois retransmitido por todas as TVs dos EUA.
Nos trechos exibidos, Cho faz uma espécie de confissão antecipada do massacre, lendo um texto errático de 1.800 palavras em que cita Jesus Cristo, Moisés e os autores do massacre de Columbine, ocorrido numa escola do Colorado em 1999, a quem chama de "mártires". Em algumas fotos, aparece armado. "Sinto que vocês tenham sido expostos a essas imagens", disse Steve Flaherty.
O ressentimento ecoava pelo campus. Em meio a memoriais improvisados espalhados pela praça principal, um deles com 32 pedras em semicírculo, uma em homenagem a cada vítima, estudantes reclamavam das imagens. "Olhar para aquelas cenas só as tornaram mais reais", disse Laura Sink, 22, com lágrimas nos olhos.
Parentes e amigos das vítimas chegaram a cancelar entrevistas à NBC. Steve Capus, diretor de jornalismo da emissora, se defendeu: "Era apropriado divulgar as informações, pois são o mais próximo que chegaremos ao interior da mente de um assassino".
Segundo Larry Hincker, porta-voz da universidade, os estudantes mortos receberão diplomas póstumos e as aulas voltam ao normal na segunda. "Não podemos deixar o horror definir a universidade", disse.


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