São Paulo, domingo, 20 de junho de 2010

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Fosso entre sul e norte põe Bélgica em perigo

Vitória de sigla separatista flamenga acirra racha cultural de país europeu

População de região de dialeto holandês, motor econômico do país, se ressente da parcela francófona dos belgas

MARCELO NINIO
ENVIADO ESPECIAL A BRUXELAS

Na principal livraria de Vilvoorde, subúrbio pacato na periferia de Bruxelas, há uma variada sessão dedicada a lançamentos em inglês.
Mas em toda a ampla loja, dominada por títulos em flamengo (dialeto do holandês), é impossível encontrar qualquer livro em francês.
"É a política da loja", diz uma vendedora, expressando com um sorriso constrangido a crescente rejeição que a maioria flamenga do país sente em relação à parcela francófona da população.
Situada a menos de 10 km da capital, Vilvoorde está fisicamente na fronteira linguística entre as duas principais regiões da Bélgica, Flandres (norte) e Valônia (sul).
A rivalidade entre as comunidades reacendeu com a vitória de um partido separatista flamengo nas eleições parlamentares do último domingo, que mergulhou o país numa nova era de incerteza.
O triunfo da Nova Aliança Flamenga (N-VA), liderada pelo carismático Bart de Wever, despertou o antigo fantasma de separação entre Flandres e Valônia.
Ventos separatistas não são novos na Bélgica. Mas a vitória de De Wever, que defende a "evolução" do país rumo ao desaparecimento, indica que eles se tornaram mais intensos.
"Estamos discutindo o fim da Bélgica há ao menos 30 anos, e sempre houve partidos separatistas", diz o cientista político Régis Dandoy. "A novidade é que desta vez eles se tornaram a maior força política do país."

RESSENTIMENTO
O principal combustível da vitória do N-VA é o ressentimento crescente dos habitantes de Flandres. A região tem 60% da população belga e move a economia do país.
Enquanto a maioria dos flamengos fala francês, pouquíssimos francófonos se interessam em aprender o idioma do norte. Para complicar ainda mais o quadro, a capital Bruxelas é uma ilha francófona em Flandres.
A capital é apontada como principal obstáculo ao plano de separação entre as duas regiões. A resposta para o impasse seria dar mais poderes às regiões, sem enfraquecer o governo central.
Mesmo que a política se acomode, a guerra cultural deve continuar.
Em Vilvoorde, a ausência de obras em francês nas livrarias é apenas um dos sinais do contra-ataque flamengo. Letreiros das lojas e cardápios dos restaurantes estão só no dialeto holandês.
Em algumas cidades de Flandres, crianças são proibidas de falar francês nas escolas, e o idioma foi banido de prédios públicos.


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