São Paulo, domingo, 20 de setembro de 2009

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Ritmo frenético dá lugar a calmaria em centro de triagem

Centro de Acolhida de Lampedusa, que já abrigou mais de 2.000 pessoas, hoje é ocupado apenas por funcionários

Maior responsabilidade do local hoje é separar menores de maiores, com base em controverso exame ósseo, e prestar primeiros socorros



DA ENVIADA A LAMPEDUSA Nos três pequenos prédios, que comportam exatas 804 pessoas -mas que já chegaram a abrigar a um só tempo mais de 2.000- há apenas os funcionários. Uns reclamam do tédio. Outros temem perder o emprego. Com 60 contratados e 20 temporários, o quadro acabou grande demais para tão pouco trabalho. Os salários já estão sendo reduzidos.
O Centro de Acolhida de Lampedusa, que chegou por alguns meses a chamar-se Centro de Identificação e Expulsão, é administrado por uma cooperativa e gerido como empresa privada. Além das instalações administrativas, tem refeitório, local para oração, enfermaria e um pátio de triagem com bancos de cimento.
Os quartos distribuídos pelos barracões, um para mulheres e crianças e dois para homens, comportam, cada um, seis beliches com colchões de espuma em um espaço de mais ou menos 6,5 m2.
O banheiro é dividido em cubículos apertados com chuveiros e tem uma longa pia de alumínio, ambos em mau estado de conservação apesar da falta de uso atual. A água vaza pelo chão. Fotos internas das instalações foram vetadas.
Em janeiro, um desentendimento entre os internos culminou em um incêndio. Havia então 1.200 pessoas ali, mas ninguém se feriu gravemente. Tudo depois foi repintado.
A primeira coisa que a repórter ouve do diretor ao atravessar os portões frágeis é que a cooperativa havia ganho a licitação do governo italiano por propor cuidar de cada imigrante por "33 por dia".
Federico Miragliotta, 31, está à frente do centro desde sua abertura, há dois anos. Antes havia outro, no norte escarpado da ilha. "E antes eles chegavam em grupos pequenos, de 20 pessoas, e as próprias pessoas da ilha cuidavam", diz.
Muitos desembarcavam achando que era a Sicília, onde poderiam pegar um trem, seguir para o resto da Itália e dali para França, Alemanha, Suíça.
"Antes de ter o centro, eles davam a volta na ilha em um dia e descobriam que estavam presos do mesmo jeito, sem ter aonde ir. Sem documento não se pega avião", conta Steffania, nascida em Lampedusa.
A maioria dos que são levados ao centro passa menos de uma semana ali antes de ser deportada ou transferida a outros centros na Sicília até que tramite o pedido de asilo.
Mas no ano passado, muitos chegaram a ficar por dois meses. A situação ficou caótica. Só em outubro, desembarcaram mais de 4.000. Uma parte dormiu ao léu. "Trabalhamos em um mês o que trabalhávamos o ano todo", lembra Miragliotta.
A maior responsabilidade do centro hoje é separar os menores de idade -que podem ficar até que tramite o asilo- dos maiores, que são deportados. A decisão tem base em um exame ósseo cujo resultado tem margem de erro considerável.
Também é feito ali o primeiro tratamento para os que chegam do mar, normalmente desidratados, com câimbras, infecções intestinais e escaras surgidas da higiene precária.
O centro oferece ainda apoio psicológico, mas a médica Luisa Grillo afirma ser difícil distinguir entre quem tem problema de fato e quem finge ter para ficar. Um gráfico na parede mostra que os males recorrentes nos recém-chegados são histeria e depressão.
Miragliotta insiste que os doentes são no máximo 25%. "A maioria é jovem e está em condição de saúde muito melhor do que os italianos." (LC)


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