São Paulo, sábado, 21 de fevereiro de 2004

Próximo Texto | Índice

CRISE

Comparecimento às urnas parece ter sido maior do que era esperado, apesar de boa parte dos liberais pregar o boicote ao pleito

Linha dura deve vencer a eleição no Irã

Atta Kenare/France Presse
Iranianas fazem fila para votar em Teerã, capital do Irã; conservadores devem reconquistar a maioria no Parlamento iraniano


DA REDAÇÃO

Candidatos conservadores iranianos, que se opõem ao projeto de reformas sociopolíticas do presidente Mohammad Khatami, pareciam ontem que conseguiriam reconquistar a maioria no Parlamento, que está nas mãos dos reformistas desde 2000.
A eleição legislativa iraniana foi marcada por uma grave disputa entre conservadores e reformistas. Em janeiro, o Conselho de Guardiães, órgão que zela pelo respeito à Constituição no Irã -cujos 12 membros foram apontados pelo líder supremo do país, o aiatolá conservador Ali Khamenei-, vetou a candidatura de cerca de 2.500 reformistas ao Parlamento.
Essa medida gerou protestos dos liberais, que, em grande parte, passaram a defender um boicote ao pleito, e críticas da comunidade internacional, que se preocupa com a restrição às liberdades civis e às ações dos reformistas.
As autoridades eleitorais iranianas decidiram ontem estender a votação por quatro horas para permitir que o comparecimento às urnas fosse mais elevado. Com isso, de acordo com um funcionário do Ministério do Interior (que não quis ser identificado), as primeiras estimativas do órgão indicavam um comparecimento às urnas entre 47% e 52%.
Trata-se de um nível mais baixo que o verificado em 2000, quando cerca de 67% dos eleitores iranianos votaram. Contudo, segundo analistas, ele é bem mais elevado do que vinha sendo previsto anteriormente. Até anteontem, levantamentos informais indicavam que no máximo 20% dos eleitores pretendiam votar.
Ontem o governo dos EUA criticou duramente a realização da eleição sem a presença de inúmeros candidatos reformistas.
"Candidatos foram impedidos de participar da eleição, no que constituiu uma tentativa de limitar as possibilidades de escolha dos iranianos no que se refere a seu governo. Trata-se de ações que não contribuem para uma eleição livre e justa, não correspondendo às normas internacionais", declarou Adam Ereli, porta-voz do Departamento de Estado dos EUA.
A União Européia, que vem tentando melhorar as relações do Irã com a comunidade internacional desde o ano passado, também expressou preocupação com a atual crise política do país.

Campanha de propaganda
A mídia oficial, que é favorável aos conservadores, fez ontem uma intensa campanha pelo comparecimento às urnas. Inúmeras vezes, as redes de TV e de rádio mostraram um pronunciamento de Khamenei em que ele exortava a população a votar -para dar um "tapa no rosto da América e dos inimigos do Irã".
Além disso, a linha dura também decidiu restringir ainda mais o espaço dos reformistas nos últimos dias. Anteontem, véspera da eleição, um escritório de campanha da Frente de Participação do Irã Islâmico, o maior partido liberal do país -que é liderado por Mohammad Reza Khatami, irmão do presidente-, foi fechado pelas forças de segurança.
Na última quarta-feira, dois jornais independentes também foram fechados. Eles haviam publicado uma carta dos liberais a Khamenei com duras críticas ao regime e ao líder supremo, algo raro.
Desde 2000, os reformistas tinham cerca de 70% dos postos no Parlamento. Os conservadores contavam com 20%, e o restante das cadeiras estava nas mãos de "políticos independentes".
De acordo com analistas, a parte menos dogmática da linha dura iraniana considera importante recuperar a maioria no Parlamento para introduzir lentamente reformas sociopolíticas.
Alguns reformistas dizem temer ser alvo de uma ofensiva dos conservadores após a eleição. Segundo eles, a situação "tende a agravar-se no futuro próximo".

Com agências internacionais


Próximo Texto: Abusos e falta de liberdade ofuscam ganhos sociais
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.