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EUA e Alemanha divergem sobre abrir arquivo nazista
ROGER COHEN
DO "NEW YORK TIMES"
A insistência dos EUA em abrir
a estudiosos e pesquisadores um
arquivo alemão sobre o Holocausto vem causando desentendimentos entre os dois países.
Baseados em documentos recolhidos pelas forças aliadas quando
libertaram os campos de concentração nazistas, os arquivos do
Serviço Internacional de Rastreamento, em Bad Arolsen, se estendem por 25 quilômetros e contêm
informações sobre 17,5 milhões
de pessoas - um dos maiores arquivos fechados do mundo.
A coleção também é única no
detalhamento pessoal de uma catástrofe -o que torna delicado o
acesso a ela. Os documentos podem revelar, por exemplo, que experimento médico sinistro foi
conduzido com qual prisioneiro,
que judeus colaboraram com os
nazistas e como foram induzidos
a fazê-lo, e quem foi acusado pelos nazistas de homossexualismo,
homicídio, incesto ou pedofilia.
Desde o final da guerra, o Serviço de Rastreamento, operando
como braço do Comitê Internacional da Cruz Vermelha, usa os
arquivos para ajudar pessoas a
pesquisar o que aconteceu com
seus familiares sob o terror nazista. Passados mais de 60 anos do
fim da guerra, os EUA dizem que
chegou a hora de abrir o arquivo.
Mas a proposta enfrenta uma
muralha de objeções legais e burocráticas apresentadas por Charles Biedermann, o funcionário da
Cruz Vermelha que há duas décadas dirige o serviço, e pelos governos alemão e italiano. O ambiente
interno da comissão internacional de 11 países que supervisiona a
operação vem se tornando extremamente rancoroso.
Representantes alemães questionam se é do interesse de qualquer pessoa trazer a público acusações de homossexualismo ou
homicídio contra judeus específicos. Como as leis alemãs sobre
privacidade são mais rígidas do
que as americanas, as autoridades
do país temem ações na Justiça.
O acesso também pode gerar
novos pedidos de compensação.
Sara Bloomfield, diretora do
Museu Memorial do Holocausto
em Washington, disse se tratar de
"um escândalo". O diretor de estudos do Holocausto do museu,
Paul Shapiro, acusou a Alemanha
de "sufocar o processo". "Ocultar
este arquivo é uma forma de negar o Holocausto", disse.
Essas acusações não condizem
com o caráter geralmente positivo
das relações entre Alemanha e
EUA no que toca o Holocausto.
A Alemanha reage com ultraje à
sugestão de que atrasa deliberadamente o processo. "Faço objeção à alegação de que temos algo a
esconder", disse o embaixador da
Alemanha nos EUA, Wolfgang Ischinger. "A insinuação é falsa."
A disputa tem parte de suas raízes na complexa história e na estrutura jurídica labiríntica do Serviço de Rastreamento. Criado no
fim da guerra, vem sendo administrado há anos sob os termos
dos Acordos de Bonn de 1955, que
restituíram a soberania alemã.
Pelo tratado, o serviço "deve tomar todas as medidas razoáveis
para evitar a divulgação de informações sobre uma pessoa que
possam prejudicar os interesses
da pessoa em questão ou de seus
parentes", o que limita o acesso às
próprias pessoas perseguidas.
Mas o acordo também diz que todos os governos da comissão de 11
países - EUA, Reino Unido,
França, Alemanha, Itália, Bélgica,
Holanda, Grécia, Israel, Polônia e
Luxemburgo- têm direito de
inspecionar documentos.
A Alemanha e Charles Biedermann afirmam que, para os arquivos serem abertos, o tratado
deve ser mudado. Isso exigiria
uma votação com resultado unânime e a subseqüente aprovação
das emendas pelos Legislativos
nacionais, o que levaria anos.
Mas o governo alemão, que já
gastou mais de US$ 80 bilhões em
reparações, quer que as questões
de responsabilidade legal sejam
plenamente esclarecidas antes.
"Precisamos resolver a questão
de quem será autorizado a fazer o
que com estes dados e de quem
será legalmente responsável no
caso de alguém fazer mau uso das
informações", disse Ischinger.
Tradução de Clara Allain
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