São Paulo, segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

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Protestos tiram Israel de zona de conforto

Crise no Egito gera no vizinho questionamentos sobre manutenção de tratado de paz e da pressão sobre o Irã

CLÓVIS ROSSI
COLUNISTA DA FOLHA

A revolução em curso no Egito chegou depressa a Israel. Editorial de quinta-feira do jornal "Haaretz" avisava:
"As ondas de choque no Oriente Médio nos obrigam a rever rapidamente nosso pensamento estratégico. Porque esses mesmos públicos árabes que foram bem-sucedidos em expulsar dois ditadores demandarão eventualmente que seus novos governos sigam uma política externa vigorosa -ou, em outras palavras, reexaminem suas relações com Israel."
É uma adequada maneira de dizer que os acontecimentos no Egito tiraram Israel da zona de conforto em que havia conseguido instalar-se a partir do momento em que controlou o terrorismo.
Não que as mudanças no vizinho façam prever apoio ao terrorismo ou, menos ainda, a tentação da guerra.
Mesmo assim, como diz Mark Heller, doutor em relações internacionais pela Universidade de Tel Aviv, Israel sai de sua zona de conforto porque "tudo isso é imprevisível -e as pessoas em Israel se preocupam sempre com os piores cenários".
Essa preocupação aumentou quando, na sexta-feira, o Egito autorizou a passagem de navios de guerra iranianos pelo canal de Suez, o que jamais ocorrera desde 1979.
Pode ser o princípio do que Heller aponta como "pior cenário" do ponto de vista de Israel, aquele em que "o novo regime passe a ver os interesses do Egito como contrários aos de Israel".
É sintomático que um judeu coincida, no essencial, com um árabe, o jornalista e escritor Khaled Diab, radicado em Bruxelas:
"O medo de Israel não decorre de o Egito se tornar ou não um teocracia -e suspeito que uma teocracia amiga seria aceitável-, mas se a nova ordem será mais hostil com um Israel inseguro."
Passe-se aos EUA, e a sensação não é diferente, como o demonstra a análise de Stephen Walt, professor da Escola Kennedy de Governo de Harvard, à "Foreign Policy":
"Um governo egípcio mais representativo certamente será menos subserviente do que o velho regime."
Nadim Shehadi, pesquisador do Programa de Oriente Médio e Norte da África da britânica Chatam House, especula com mudanças de que o caso dos navios iranianos pode ser o primeiro sinal:
"É de se esperar que, se algo similar à guerra da Gaza ocorrer de novo, haverá mais vozes no Egito questionando o fechamento de Rafah [o passo Gaza/Egito] e pressionando por mudanças no tratado de paz Israel/Egito".
O bloqueio israelense a Gaza só é bem-sucedido porque o Egito fez a sua parte.

PALESTINOS
É inevitável que haja, a médio prazo, reflexos nas negociações de paz entre Israel e os palestinos. Também nesse capítulo, as avaliações têm certa semelhança, mesmo quando feitas por um árabe e por um judeu.
Khaleb Diab, por exemplo, diz que "os israelenses precisam dar-se conta de que o caminho para a segurança não passa só pelo Cairo mas também por Jerusalém, Margem Ocidental e Gaza".
Já Mark Heller, embora ressalve que Israel "deve acautelar-se para não dar munição extra a pessoas já suficientemente zangadas".


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