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Cidade em Portugal convida brasileiros para repovoá-la
Quatro primeiras famílias desembarcaram neste mês de Maringá; plano prevê chegada de 250 paranaenses até 2008
Sob protestos de grupos nacionalistas, presidente
da Câmara Municipal atrai possíveis migrantes com oferta de casa e emprego
VITORINO CORAGEM
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
EM VILA DE REI (PORTUGAL)
Amigos, família e emprego ficaram do outro lado do Atlântico. Na bagagem, veio o sonho
de maior segurança, mais dinheiro e uma porta para a Europa. Oito adultos e seis crianças chegaram, há duas semanas, a Vila de Rei, região central
de Portugal, vindos da cidade
paranaense de Maringá. Até
2008, devem ser 250 os brasileiros com a missão de repovoar essa região envelhecida,
queimada por incêndios recentes e sob risco de desertificação
Os novos "bandeirantes"
mostram-se satisfeitos com a
escolha. Pedro Ramos, 50, professor de Língua Portuguesa e
Literatura Brasileira chegou
com a mulher e os dois filhos.
Trocou os livros por um emprego em um hotel. Nem tanto pelo salário equivalente a R$
1.230 (salário mínimo português) que vai receber -a segurança e a cultura européia foram os motivos da decisão.
Os filhos também dão os primeiros passos na nova rotina.
Laudina, 7, passa o dia todo na
escola com as novas colegas.
"Eu e minha mulher estamos
muito contentes com o fato de
as crianças estarem ocupadas
durante todo o dia. Está sendo
muito mais fácil do que eu esperava. Já fizemos muitos amigos, e a escola tem dado todo o
apoio possível", diz.
Estão todos alojados em uma
casa emprestada pelos próximos seis meses. Ao todo têm
seis quartos, três banheiros,
duas salas, uma cozinha e uma
lavanderia. Com árvores frutíferas, o jardim é mais um espaço de convívio. Os vizinhos batem à porta todo dia, trazendo
batatas, cenouras e laranjas.
A curiosidade é mútua, e a
cultura brasileira trazida pelas
novelas ajuda a quebrar as
fronteiras entre desconhecidos. Em breve terão um Fiat
Uno, o que irá ajudar no rápido
trajeto até o trabalho.
Recomeço
"Trata-se de começar tudo
do zero", explica a jornalista
Cecília Fraga, 42. Enquanto
prepara um dos dois filhos para
dormir, lembra que foi uma decisão muito difícil. "Além de vir
para um continente diferente,
viver em grupo implica uma
grande capacidade de adaptação. Temos de fazer as refeições
todos juntos", pondera.
A segurança foi a razão principal que trouxe Marcelo, 30,
técnico de contabilidade. "O
ambiente aqui é muito calmo.
Quero ficar durante muito
tempo. Fico descansado quando os meus filhos estão fora de
casa. O Mateus tem seis anos e
já freqüenta uma escolinha de
futebol. Talvez um dia possa vir
a ser um grande jogador."
Vila de Rei, que tem menos
de 5.000 habitantes, está encolhendo. Desde 1974, o número
de mortes é superior ao de nascimentos, e um terço da população tem mais de 65 anos.
No ano passado, a freguesia
de São João de Peso, onde vivem os primeiros paranaenses,
registrou apenas um nascimento. Ante tal cenário, a presidente da Câmara Municipal,
Irene Barata, decidiu convidar
as famílias brasileiras.
Para atrai-los, prometeu trazer as famílias completas, legalmente, e com contrato de trabalho. Ela realça que "o desemprego na autarquia é praticamente inexistente, de modo
que o projeto não prejudica a
população". Os imigrantes vão
receber ações de formação do
Instituto de Emprego e Formação Profissional (IEFP) na área
da hotelaria, para depois trabalharem nos investimentos privados em curso na cidade.
A iniciativa surgiu de uma
parceria feita entre as duas cidades, incentivada pela forte
presença de imigrantes portugueses no Paraná. A seleção foi
realizada pelo Programa do Voluntariado Paranaense (Provopar), que recebeu mais de 700
candidatos e teve de encerrar
mais cedo as inscrições.
Polêmica
"É fácil perceber que foi feito
tudo o que era possível para
trazer portugueses de outras
regiões para cá. Nós só estamos
aqui porque eles não quiseram
vir para o interior do país", afirma Pedro Ramos.
No último dia 13, 60 pessoas
concentraram-se em frente ao
prédio da Câmara de Vila de Rei
em um protesto promovido pelo Partido Nacional Renovador
(PNR), de extrema-direita,
contra o projeto.
A ação, intitulada "Colonatos
estrangeiros não. Alto à invasão" foi anunciada pelo PNR
como um protesto "contra a colonização promovida por Irene
Barata com o dinheiro de impostos" dos portugueses.
Segundo Mamadu Ba, representante da associação portuguesa SOS Racismo, esta iniciativa não pode ser levada a sério
e foi condenada pela opinião
pública. Mas ele não esconde a
preocupação. "Apesar de achar
que a vinda de estrangeiros para o nosso país é sempre positiva, não deixa de ser uma contratação de mão-de-obra barata. Espero, sinceramente, que
todos os direitos de cidadania
sejam assegurados e que os brasileiros possam melhorar as
suas condições de vida."
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