São Paulo, segunda-feira, 21 de agosto de 2006

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Ameaçados, brasileiros fogem nos EUA

Willian Thomas Cain/ France Presse
Angel Cordero balança a bandeira norte-americana em protesto contra a lei de contratação de imigrantes ilegais, em Riverside


Um terço da população -sendo 2.000 brasileiros- deixou a pequena Riverside, onde americanos perseguem ilegais

Lei municipal prevê multas e penas contra quem ajuda imigrantes clandestinos; locais se armam de tacos de beisebol e espingardas

VINICIUS QUEIROZ GALVÃO
ENVIADO ESPECIAL A RIVERSIDE

Uma nova lei municipal antiimigração e retaliações de milícias levaram à fuga de cerca de 2.000 brasileiros da cidade de Riverside, no Estado americano de Nova Jersey, a 170 km de Nova York.
Desde 26 de julho, é crime em Riverside alugar imóveis, dar emprego e contratar serviços de imigrantes, com pena de multa e detenção. Associações de defesa de imigrantes contestam na Justiça a eficácia da lei, alegando que municípios e Estados não têm competência para legislar sobre temas federais.
Um projeto de lei do presidente George W. Bush com novas regras para imigração tramita atualmente no Senado americano. A proposta prevê a legalização de clandestinos que estejam no país há mais de cinco anos, desde que paguem multas e impostos retroativos.
A Folha ouviu relatos de brasileiros, confirmados pela polícia local, de que casas e carros haviam sido incendiados como intimidação. A milícia xenófoba, armada de tacos de beisebol e espingardas (o porte de armas é legalizado nos EUA), daria prazo de 72 horas para que imigrantes em situação irregular deixassem a cidade. O modelo ufanista de Riverside foi baseado e instruído, segundo moradores contrários à presença de estrangeiros, pelo grupo Minuteman, voluntários armados que patrulham a fronteira com o México.
Com 8.500 habitantes, Riverside é uma das oito localidades nos EUA que aprovaram leis locais para combater o trabalho ilegal de imigrantes.
Dos 4.000 sem-documento, 2.000 são brasileiros. Quase todos deixaram a cidade, de acordo com a prefeitura e com a paróquia local, que celebra missas em português.
Os poucos que permaneceram mantêm pequenos comércios, como loja do Boticário, restaurante típico e supermercado de produtos brasileiros.
"Os brasileiros e os latinos são os melhores amigos dos EUA. Amamos a América. Sou parte deste país", disse Susanete Silva, 40, faxineira de Nova Xavantina (MT), há cinco anos nos EUA.
"Invadiram minha casa, jogaram uma bomba de querosene e quebraram meu carro", afirma Rosilei Pereira, 39, também faxineira, há oito anos em Riverside. "Ganho US$ 3.000 (R$ 6.400) por mês", conta.
A nova lei de Riverside proíbe o espanhol e o português em anúncios, prevê multa de US$ 1.000 para proprietários que aluguem imóveis a estrangeiros e suspensão da licença de funcionamento para comerciantes que contratem imigrantes. Prisão é prevista em caso de reincidência.

Clima
Riverside é o típico povoado de interior dos EUA. Com duas ruas principais que se cruzam, a cidade-dormitório vive do comércio local e de serviços. Não há indústria, e a metrópole mais próxima é Filadélfia, a 25 km. As casas ostentam bandeiras americanas. Só há duas agências bancárias.
Natural de Ipatinga (MG), Wander Alves, 33, entrou nos EUA pela fronteira mexicana. Disse ter pago US$ 10,5 mil para entrar há três anos por intermédio de "coiotes". Ontem foi seu último dia de trabalho como açougueiro no "Victor's Market", supermercado especializado em marcas brasileiras. Sem falar inglês, Alves diz trabalhar 12 horas diárias, sete dias por semana para ganhar US$ 3.000 mensais. "Vou para Delran (cidade vizinha). Não vejo a hora de voltar ao Brasil."
Outro mineiro, o carpinteiro José Carlos Sousa, 32, vai para a Flórida. "A única coisa que posso fazer é sair daqui. Não falo inglês, não fico sabendo de nada", diz. Antes de ganhar US$ 2.500 por mês nos EUA, recebia um salário mínimo como pastor de gado em Itaiomim.



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