São Paulo, domingo, 21 de agosto de 2011

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CLÓVIS ROSSI

Agitando um coquetel explosivo


O "novo" Egito complica ainda mais um quadro em que a Palestina quer seu reconhecimento pela ONU

NA TARDE de sexta-feira, hackers invadiram sítio do Exército israelense e deixaram a seguinte mensagem: "Este não é mais o Egito de Mubarak", referindo-se a Hosni Mubarak, o ditador que caiu em fevereiro.
É uma maneira bem sintética mas perfeitamente adequada de descrever a nova agitação no já explosivo coquetel do Oriente Médio. O "novo" Egito introduz pelo menos duas novidades na equação, uma administrável, a outra selvagem.
Ponto 1: no Egito de Mubarak eram impensáveis manifestações como a de sexta pedindo a retirada do embaixador israelense, em protesto contra a morte de três soldados egípcios nos incidentes de quinta. Israel admitiu as mortes e disse que se deram por erro.
Pode ser ou não, mas a ditadura Mubarak engoliria qualquer explicação de Israel.
No novo Egito, ao contrário, a política externa tende a responder mais ao sentimento da rua, na qual há ressentimento contra Israel.
Ponto 2: o velho Egito reprimia duramente não só a população em geral, mas também os movimentos fundamentalistas, com o que as células terroristas limitavam seu esporádico funcionamento ao próprio Egito, particularmente à península do Sinai.
O "novo" Egito tem que administrar tantas variáveis, políticas, sociais, institucionais e de segurança, que abriu espaço para um braço da Al Qaeda, a Al Qaeda no Sinai, que lançou manifesto cobrando a instalação de um regime islâmico na região em que atua.
Acontece então o que comenta Akiva Eldar, colunista do jornal israelense "Haaretz": "Os ataques no sul deveriam nos lembrar que na arena militar israelo-palestina não há vitória por nocaute. Quem não quer a Organização para a Libertação da Palestina [a facção moderada] recebe o Hamas [radical]. Quem não quer o Hamas, está recebendo a Al Qaeda [hiper-radical]".
Eldar ousa propor como reação "a imediata retomada das negociações de paz com a facção palestina que defende a solução dos dois Estados" [Israel e Palestina].
Os incidentes de quinta acontecem na antevéspera de um movimento que trará a questão dos dois Estados ao primeiro plano, mas só otimistas empedernidos podem imaginar que será de fato uma "solução": no dia 20 de setembro, salvo mudança de última hora, a Autoridade Palestina pedirá às Nações Unidas seu reconhecimento como membro pleno.
O reconhecimento tem que passar pelo Conselho de Segurança, no qual os Estados Unidos exercerão seu poder de veto, pré-anunciado, o que deixará todo o processo em estado de suspensão.
Valerá mais ainda a avaliação que faz Joel Beinin, professor de História do Oriente Médio na Stanford University: "Se os EUA não tivessem perdido toda a credibilidade como negociador e, simultaneamente, desacreditado a própria noção de processo de paz, a Autoridade Palestina não teria sentido necessidade de requerer filiação à ONU".
Vale uma observação final: a presidente Dilma Rousseff estará presente, em princípio, à Assembleia Geral em que os palestinos pedirão sua filiação. Ela e o Itamaraty têm alguma política para participar desse intrincado processo?
Não vejo. E você?

crossi@uol.com.br

AMANHÃ EM MUNDO
Rubens Ricupero


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