São Paulo, quinta-feira, 21 de setembro de 2006

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Protestos põem Hungria em encruzilhada política

Pressão por renúncia de premiê aumenta, mas a UE não confia na oposição

Principal opção ao socialista Ferenc Gyurcsany, que mentiu sobre contas públicas, é o líder da direita ultranacionalista

PAULO REBÊLO
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA, DE BUDAPESTE

No terceiro dia de protestos em Budapeste, com 15 mil manifestantes pedindo sua renúncia em frente ao Parlamento, o primeiro-ministro húngaro Ferenc Gyurcsany reafirmou ontem, em entrevista coletiva, que não deixa o cargo e que fará o possível para conter a violência dos manifestantes nas ruas. Em uma fita vazada à imprensa na noite de domingo, o premiê admitiu ter mentido e maquiado números da economia para se reeleger, em abril passado.
A pressão popular contra Gyurcsany põe a Hungria e a União Européia (UE) numa encruzilhada política: a principal alternativa à coalizão liderada pelo Partido Socialista (ex-comunista) do premiê é a direita nacionalista, em quem a UE não confia para implementar o programa de austeridade exigido para adaptar o país às regras econômicas do bloco. A Hungria aderiu à UE em 2004.

Futuro
A atual crise está sendo apontada como o mais dramático evento no país desde a queda do comunismo, em 1989. Paradoxalmente, a troca de regime para o capitalismo ocorreu pacificamente.
Fontes internas do governo dão como certo que, na eventualidade da queda de Gyurcsany, o Parlamento repassará o cargo de primeiro-ministro ao representante da extrema-direita, Viktor Orban, ex-primeiro-ministro e líder do Fidesz, partido conservador sob suspeita de encorajar parte dos manifestantes à violência.
A segunda opção seria um primeiro-ministro da ala reformista de Guyrscany, que dificilmente teria respaldo parlamentar devido às divisões internas da coalizão. E, em última hipótese, a convocação de eleições gerais, o que colocaria em dúvida a capacidade de o país atingir as metas exigidas pela UE.
Para o conselheiro do Centro de Jornalismo Independente na Hungria, Sándor Orban, o que está acontecendo hoje é um paradoxo sem precedentes. "Se Gyurscansy deixar o cargo, podemos entrar em colapso porque as reformas não serão feitas. Se permanecer, também podemos entrar em colapso porque ele pode não conseguir governar e o país pode ficar ilhado. E, se a extrema-direita assumir, a economia pode simplesmente ficar estagnada ou regredir para fins populistas."
Nas ruas, o sentimento não é muito diferente. "Gyurcsany não é o primeiro a mentir descaradamente, não será o último, e todos nós sabemos que todos os políticos daqui fazem promessas que não podem cumprir. Se ele ficar no cargo depois de tudo o que falou, é ruim. Se ele sair, também é ruim. O que nos sobra?", indaga a professora de idiomas Veronika Nagy.

Reformas
Para a UE, enquanto Guyrcsany permanecer no cargo, a esperança é que as reformas econômicas, que incluem aumento de impostos e cortes de gastos sociais, sejam mantidas. O governo deve apresentar na próxima semana, em Bruxelas (sede da Comissão Européia), a versão final do plano de reestruturação econômica para os próximos anos.
O objetivo do plano é reduzir o déficit público, estimado hoje em 10% do PIB (Produto Interno Bruto), para os 3% do PIB exigidos pela UE. Foi ao mentir sobre os números das contas públicas que o premiê enganou os húngaros, surpreendidos pelo aumento de impostos e cortes no funcionalismo anunciados por ele depois de reeleito.
Em um dos trechos da gravação, Gyurcsany afirmou: "Mentimos durante todo este tempo, um ano e meio, talvez dois. E não fizemos nada nos últimos quatro anos".


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